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A transição democrática

O principal desafio político para o Brasil em meados de 2016 é dar seguimento a uma  transição democrática. Sim, do ponto de vista da democracia a tarefa mais importante não é recuperar a economia: conquanto isso seja fundamental, seria medida necessária em qualquer regime. Se o nosso regime político fosse uma ditadura (como Venezuela ou Rússia) ou uma protoditadura (como Nicarágua, Bolívia ou Equador), ainda assim teríamos que recuperar a economia, controlar a inflação, retomar o crescimento et coetera.

Ocorre que o regime político vigente no Brasil não é uma autocracia e sim uma democracia representativa formal, um tanto flawed, convenhamos, que foi parasitada durante mais de uma década por um governo neopopulista manipulador dirigido por um partido autoritário (que jamais se converteu realmente à democracia). Ainda que o tempo que permaneceu no governo central não tenha possibilitado ao PT autocratizar o regime de sorte a podermos caracterizá-lo como uma ditadura ou protoditadura, o período que o partido ficou no comando foi suficiente para aparelhar o Estado, degenerando, pelo menos em parte, a institucionalidade, para ameaçar a liberdade, talvez (não se sabe ainda ao certo) fraudar a eletividade, tentar abolir na prática a rotatividade ou alternância e, certamente, violar a legalidade (com a ereção do mais formidável esquema centralizado de corrupção sistêmica, estruturado para financiar um esquema criminoso de poder, já visto em alguma democracia, em toda a história universal).

Mas, por incrível que pareça, o pior – para a democracia – foi o que o PT fez na sociedade, inclusive durante o tempo em que ficou fora do governo, nas décadas de 80 e 90 do século passado. O PT perverteu a política democrática, instalando uma guerra civil fria na base da sociedade, a partir dos aparelhos partidários (compreendendo, além do PT, os demais partidos estatistas, seus aliados subordinados) e de seus braços sindicais e associativos, das universidades e escolas, da rede suja de sites e blogs à serviço da causa “revolucionária”, dos movimentos sociais que atuam como correias de transmissão do partido (desde os sem terra, passando pelos sem teto, até o movimento estudantil, os povos da floresta e as populações atingidas por grandes empreendimentos estatais e empresariais, aparelhando inclusive os movimentos setoriais ambientalistas, de mulheres, de negros, de indígenas, da população LGBT), das organizações não-governamentais, dos setores artísticos e culturais ditos “progressistas” e de alguns escritórios de advocacia. Ou seja, a partir desses centros irradiadores, configurados como ambientes favoráveis à formação de militantes (agentes da guerra civil fria, interpretada como luta de classes dos explorados contra os exploradores, dos socialistas contra os capitalistas, dos progressistas contra os conservadores ou liberais-conservadores, dos revolucionários contra o coxinhas, do povo contra as elites), o PT operacionalizou, antes e depois de conquistar eleitoralmente o governo, a sua estratégia de conquistar hegemonia sobre a sociedade a partir do Estado aparelhado pelo partido. O objetivo era conquistar o governo e tomar o poder para nunca mais sair do governo.

Ora, tudo isso provocou uma alteração profunda nos fluxos interativos da convivência social. O clima adversarial instalado pela militância, dilapidou nosso capital social (destruindo parte do espírito cívico, diminuindo os graus de cooperação e de confiança e coibindo a criatividade e a inovação) e esgarçou e centralizou a rede social.

Apeado do governo constitucionalmente, o PT se refugiou novamente nos mesmos clusters (mencionados acima) que apoiaram e viabilizaram sua estratégia e continuou perturbando e deformando o campo social e espalhando inimizade no mundo. Além disso, está no momento se organizando para voltar ao governo e continuar implementando o seu projeto autoritário de enfreamento da democracia.

Por isso torna-se necessária – imperativa mesmo – uma transição democrática, a ser levada a efeito tanto no âmbito do Estado quanto na sociedade.

A questão é: quem serão os agentes dessa transição democrática? O atual governo do vice-presidente – de transição para a transição – é composto pela base parlamentar do antigo governo afastado, em grande parte fisiológica, como o PT não convertida à democracia e sem capacidade de compreender os desafios democráticos que estão colocados diante de nós. Assim, o atual governo não entende a natureza do PT, não conhece a sua estratégia e nem é capaz de decifrar o comportamento de seus agentes (os militantes políticos e sociais que ainda atuam no Estado e, sobretudo na sociedade, para implementar o projeto neopopulista).

Seria preciso que os atuais integrantes do governo de transição para a transição, bem como a nova oposição popular que emergiu da sociedade e cuja movimentação permitiu o afastamento do PT do governo, entrassem em um processo intensivo de aprendizagem (de alfabetização mesmo) democrática. Isso não é muito factível, seja porque os políticos tradicionais que estão no governo e no parlamento não se interessam pelo assunto, seja pela estrutura distribuída da nova oposição popular que se expressou nas ruas, composta por pessoas não-arrebanhadas ou não-arregimentadas em organizações centralizadas.

De qualquer modo, um curso prático de política democrática para aprender a lidar com o PT deveria ser capaz de examinar e estimular a construção de respostas para as seguintes questões:

1 – Qual é a estratégia (ou o projeto) do PT?

2 – Qual a ideologia do PT?

3 – Qual a concepção de democracia do PT?

4 – O PT é um player válido da democracia?

5 – Os principais dirigentes do PT lutaram pela democracia?

6 – O que é o lulopetismo?

7 – O PT é populista?

8 – O PT é um partido bolivariano?

9 – Por que o PT apoia ditaduras e protoditaduras?

10 – Quais as semelhanças entre o PT e um grupo jihadista (como a Irmandade Muçulmana)?

11 – Por que o PT precisa construir continuamente inimigos?

12 – Quais as principais táticas aplicadas pelo PT para neutralizar e destruir seus inimigos?

13 – Como o PT concebe as alianças e trata seus aliados?

14 – Quais os principais riscos de fazer acordos e negócios com petistas?

15 – Por que o PT acusa de golpistas todos os que não se subordinam a ele?

16 – Quais as ameaças do PT à democracia (mesmo estando fora do governo)?

17 – Por que a corrupção do PT é diferente da corrupção dos políticos de outros partidos?

18 – Quem, afinal, comanda o PT?

19 – Por que o PT enveredou para o crime?

20 – Como os militantes do PT são recrutados e formados?

21 – Por que é inútil discutir com um militante petista?

22 – Onde estão concentrados os que apoiam o PT?

23 – Por que o PT aparelhou o Estado?

24 – Como o PT se enraizou na sociedade?

25 – Como o PT atua nas universidades e escolas?

26 – O que restou do projeto do PT para o Brasil?

27 – Por que o PT sonhava transformar o Brasil numa “Grande Bahia”?

28 – Por que não houve oposição ao PT na última década?

29 – Como surgiu uma oposição popular ao PT?

30 – Como desinfestar ou desaparelhar o Estado do PT?

31 – Como desenraizar o PT da sociedade?

32 – Como evitar que se instale no Brasil uma guerra civil fria de longa duração?

33 – Como organizar a resistência democrática?

É possível organizar um curso assim, composto por vídeos e textos. Um percurso em que o aprendente pudesse escolher a ordem das questões que quer abordar, elaborando o seu próprio itinerário de aprendizagem.

Que tal? Vamos fazer?

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