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Apenas um vigarista

Lula não seria aceito pela Cosa Nostra

Vamos começar do princípio. Por que o PT montou um mega esquema de corrupção? Porque concluiu que era preciso usar de todas as armas na guerra sem quartel que trava com as elites dominantes. Os petistas avaliaram que uma dessas armas é a corrupção, que essas elites praticam desde Cabral (o navegador): seja para conquistar o poder, seja para permanecer no poder, seja para usufruir dos seus benefícios.

A justificativa revolucionária para tal comportamento – considerado o projeto estratégico do PT, de substituir o regime que serve aos patrões por um regime popular, que serviria aos trabalhadores – era simples: um processo de conquista de hegemonia sobre a sociedade a partir do Estado aparelhado pelo partido passava (na via neopopulista adotada) pela conquista eleitoral de governos e tinha como objetivo ficar nesses governos até que o processo estivesse concluído (quer dizer, na prática, para sempre). Ora, tal projeto tem que ser financiado, o que não pode ser feito somente com recursos legais (do Fundo Partidário e outros), nem apenas pela contribuição molecular dos filiados ao partido. Grandes somas de recursos de toda ordem – sobretudo financeiros – são necessárias. Como obter tais recursos? Fazendo o que as elites sempre fizeram, assaltando o Estado em benefício próprio. No caso do PT isso era justificado internamente com a explicação de que esses seriam recursos não para serem usados em causa própria e sim para financiar um projeto coletivo e generoso de redenção dos explorados, oprimidos e dominados. Os meios (tortos) eram justificados pelos seus fins (retos). Celso Daniel, aliás, foi assassinado por causa disso: porque não concordou que esses recursos captados ilegalmente para compor o caixa do partido fossem usados privadamente.

Para os socialistas revolucionários do PT a corrupção, a propina, o achaque aos empresários, eram uma espécie de expropriação da burguesia. Antes a esquerda assaltava bancos, o que era um expediente muito rude e perigoso. Agora – sobretudo estando no governo – cobrava comissão regular das grandes empresas como condição para celebrarem contratos com o poder público. Coisa que, reafirme-se, as elites sempre fizeram, porém com objetivos egoísticos. O objetivo com o PT, ao contrário, era altruístico: eliminar a dominação de classe.

Os chefes do Partido Interno – o núcleo duro da antiga tendência Articulação, que de fato comanda até hoje o PT – desenharam e executaram então a estratégia que redundou no maior sistema de corrupção de que se tem notícia na história. O propósito era financiar um esquema paralelo de poder, comprar parlamentares (como foi feito no mensalão), sustentar uma rede suja de veículos de comunicação, neutralizar ou eliminar inimigos e financiar regimes aliados mundo afora.

Como isso não poderia ser declarado abertamente e nem poderia ser feito somente pelo PT, a estratégia resolveu pegar uma carona na corrupção endêmica, já tradicional na política brasileira e que tinha como objetivos eleger ou reeleger um político, um parente, amigo ou correligionário, usar o expediente do caixa 2, financiar uma caciquia ou grupo político, auferir vantagens pessoais, enriquecer e se dar bem na vida (à la Sergio Cabral).

Foi assim que o PT escondeu sua corrupção estratégica, com objetivos de poder, para alterar a natureza do regime político, dentro da corrupção tradicional que as elites praticavam há séculos no país. Esse artifício só tinha vantagens. Se fossem pegos, os petistas diriam que estavam fazendo apenas o que todos fazem. E se fossem processados não chegariam a ser condenados pois contariam com a cumplicidade de uma legião imensa de corruptos comuns, que foram envolvidos no esquema justamente para criar uma cortina de ferro de impunidade. Desbaratar o esquema significaria demolir o sistema político, destruir o establishment (do qual faz parte, inclusive, o judiciário).

É claro que a avaliação do PT de que as elites sempre fizeram isso, estava errada. Não porque as elites não praticassem a corrupção e sim porque a praticavam de modo descentralizado, seguindo as regras de uma espécie de mercado negro da política. Cada cacique político organizava seu próprio esquema meio feudal de sustentação e de reprodução do seu poder local ou regional. As elites nunca precisaram montar um esquema nacionalmente organizado para fazer isso, como quis fazer (e fez) José Dirceu sob as ordens de Lula e o comando operacional de Palocci, Delúbio, Vaccari e tantos outros. Assim, nunca ficaram tão vulneráveis como ficou o PT – a não ser quando foram parasitadas pelo PT (como estamos vendo agora, com as delações dos que foram envolvidos). Se não fosse o PT, as elites políticas tradicionais continuariam tranquilamente praticando a sua corrupção endêmica, feijão-com-arroz. Mas o PT escalou o processo a tal nível que, até mesmo para elas, experientes na prática de um tipo de corrupção que já fazia parte do metabolismo do sistema, o esquema ficou insustentável.

O segundo problema da estratégia petista de fazer aquilo que o saudoso poeta Ferreira Gullar chamou de “a revolução pela corrupção” foi que os agentes da corrupção petista começaram a querer se aproveitar privadamente dos recursos do crime praticado com objetivos coletivos. O dinheiro para a causa começou então a ser usado para beneficiar seus agentes (ou seus chefes). Dirceu meteu a mão na grana para adquirir e reformar propriedades. Palocci, ao que se suspeita, constituiu um fundo próprio para viver como um nababo. E Lula, pelo menos nos casos do Triplex do Guarujá e do Sítio de Atibaia, retirou dinheiro do fundo comum para se locupletar e beneficiar sua família.

As confissões de Emílio e Marcelo Odebrecht e de Léo Pinheiro – todos amigos, não inimigos, de Lula – deixaram claro que esse dinheiro foi desviado por Lula das contas do partido. Os gastos de Lula foram abatidos do fundo ilegal do PT alimentado pelas empreiteiras e tudo foi acertado nos “encontros de contas”. Ou seja, foi dinheiro roubado da revolução.

Até os criminosos obedecem a códigos de ética. Há uma moral – às vezes bastante rígida – no crime organizado. No caso da Máfia, por exemplo, um código de honra impede que um soldado ou capo se aproprie do dinheiro da famiglia (e mesmo de outras famiglias). No caso de algumas organizações revolucionárias, isso era levado a sério, mais ainda. Não se imagina que Vladimir Lenin tenha roubado dinheiro do Partido Bolchevique para comprar ou reformar uma dacha nos Urais. Era impensável, para uma pessoa como Luiz Carlos Prestes, meter a mão no caixa do Partido Comunista para instalar um elevador de luxo em um triplex de sua propriedade (de direito ou de fato).

Mafia

Os dirigentes do PT, entretanto, não seguiram critérios minimamente éticos, nem para as organizações revolucionárias da esquerda, nem mesmo para os padrões mafiosos. São pessoas que não poderiam ser aceitas – por falta de honra – pela Cosa Nostra. Atuaram como bandidos políticos, sim, mas sucumbindo aos vícios dos bandidos comuns, como os bolivarianos Chávez, Maduro, Cabello (que, além de tudo, ainda comanda o narcotráfico na região) – todos vigaristas.

Lula, em particular, versado na arte de engrolar as massas com a narrativa de que é um filho do Nordeste que tem como sonho libertar os pobres da dominação secular das elites, meteu a mão na grana da revolução e enriqueceu, enriqueceu seus filhos e sua família e desviou dinheiro do partido para satisfazer suas necessidades e desejos. Ao fazer isso, ele revelou a sua verdadeira natureza: é apenas um vigarista!

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