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Lições de uma farsa

Os petistas ficaram numa sinuca. Não podem aplaudir a Lava Jato porque Lula está encrencado. Não podem aplaudir a Globo, porque sempre a combateram. Delegaram então essas tarefas para os jornalistas e analistas amigos. E também para os que julgavam inimigos (sobretudo os que trabalham nas Organizações Globo), que – por alguma razão, que algum dia ainda vamos descobrir, do analfabetismo democrático, passando pelo corporativismo, até à vergonhosa manutenção dos seus empregos – participaram sem qualquer espírito crítico da orquestração geral.

Enquanto isso, porém, orientaram a militância para apoiar incondicionalmente a farsa Janot-Fachin-Globo contra Temer. Em todo lugar aparece um militante cobrando dos outros a coerência que nunca tiveram:

“Vocês não combatiam a corrupção? Ou só se indignavam quando os acusados eram do PT?”

Os jornalistas e analistas amigos do PT, e os tidos por seus inimigos – inclusive alguns tucanos, com espinha mais flexível do que o junco, como é de sua natureza moral (ou amoral) – finalmente acharam uma zona de conforto:

“Ufa! Agora sim, não seremos acusados de anti-petismo. Podemos descascar Temer sem dó nem piedade”.

Pouco a pouco, entretanto, alguns jornalistas e analistas – considerados inimigos pelo PT – foram acordando. Como observou o Jose Luis Matos, no Facebook, “talvez daqui pra frente a imprensa mude a narrativa, o que me lembra o comportamento desta na fuga de Napoleão Bonaparte: a medida que se aproximava de Paris o tom ia mudando da repulsa à saudação”.

Nem todos denunciaram de pronto a farsa, desde que o golpe de 17 de maio foi aplicado pela dupla Janot-Fachin. Mas, de lá para cá, só aumenta o número dos que não se sujeitam a repetir as porcarias da orquestração:

No próprio dia 17 de maio publiquei em Dagobah: Revela-se, afinal, o objetivo da armação Janot-Fachin.

Claro que, também desde o início, Reinaldo Azevedo vinha mostrando – a seu modo e nos seus termos (com os quais não precisamos concordar para reconhecer seu papel pioneiro neste caso) – que estávamos diante de um verdadeiro golpe, com o protagonismo destacado das Organizações Globo.

Em 20 de junho, registramos vários sinais de esperança no post Alguns jornalistas e analistas políticos começam a acordar (reproduzindo artigos críticos de Augusto Nunes, Eliane Cantanhêde, Rodrigo Constantino e Carlos Andreazza).

Em 24 de junho, no artigo Pouco a pouco, os analistas políticos vão acordando, reproduzimos um texto fundamental de Demétrio Magnoli sobre o jacobinismo dos procuradores, iludidos de que seriam uma espécie de Comitê de Salvação Pública.

Hoje (02/07/2017), reproduzimos dois artigos de ontem de Guilherme Fiuza – O gigante enfim acordou e A farra do boi – e um de Ruy Fabiano: Lula é o chefe.

Claro que existem alguns outros, mas não tantos assim que não dormiram. A imensa maioria da turma comeu mosca mesmo. E também é pequeno ainda o número dos que acordaram. Mas é crescente.

Certo é que, como Temer não renunciou e o Fora Temer continuou a ser produzido artificialmente sem povo (como demonstrou a greve geral que não houve do último dia 30 de junho), a orquestração não deu certo. O máximo que a patuscada conseguiu, até agora, foi derruir ainda mais a frágil governabilidade de um governo que não foi escolhido pelas urnas (nem ungido pelas ruas), aumentar a instabilidade (provocando perdas econômicas significativas para o país: os números, mais cedo ou mais tarde, serão apresentados às Organizações Globo), escalar a crise política, paralisar reformas importantes (das quais o Brasil continua precisando, seja quem for o presidente: Temer, Lula ou Marcola) e investir na confusão geral (sem qualquer resultado construtivo). E tudo ainda contribuiu para confundir Berlusconi com Mussolini, se é que vocês me entendem…

Mesmo que Temer venha a cair em razão dessa conjunção adversa de fatores (e é incrível que não tenha caído), isso não apagará da história o erro político brutal e a irresponsabilidade empresarial máxima dos que apoiaram e produziram a farsa dos Freeboys.

As faculdades de jornalismo, por sua vez, devem tomar o exemplo para uma reforma nos seus conteúdos curriculares: mesmo que o maior complexo de comunicação do país aposte todas as suas fichas numa narrativa manipuladora da opinião pública, mesmo assim isso não significa que as instituições e as pessoas (o que chamam de “o povo”) vão ser influenciadas a ponto de aderir a um movimento artificial de deposição de um presidente. Não funciona mais assim em uma sociedade-em-rede, na qual o broadcasting não tem mais essa influência toda.

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