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O movimento sofista 5 (1) Protágoras

Começamos a publicar os capítulos do livro de G. B. Kerferd (1980), O movimento sofista (tradução de Margarida Oliva de The Sophistic Movement, Cambridge: Cambridge University Press, 1981, publicada pelas Edições Loyola, São Paulo, 2003).

Os três primeiros capítulos estão disponíveis aqui. O quarto capítulo está disponível aqui. Segue abaixo a introdução e o primeiro tópico do quinto capítulo.

5 – Os sofistas individualmente

Conhecemos os nomes de mais de vinte e seis sofistas do período entre mais ou menos 460 a 380 a. C., quando sua importância e sua atividade estavam no auge. No século IV eles foram efetivamente substituídos por escolas mais organizadas, mais sistemáticas, freqüentemente com prédios próprios mais ou menos permanentes, como no caso da Academia de Platão, do Liceu de Aristóteles e de um bom número de outras. Dos sofistas cujos nomes conhecemos, talvez oito ou nove eram muito famosos, e a esses deveríamos acrescentar os autores de duas obras anônimas, a Dissoi Logoi e o chamado Anônimo Jâmblico. Seria conveniente dizer alguma coisa sobre cada um deles separadamente. O testemunho se encontra em geral convenientemente apresentado na coleção de Testemunhos e Fragmentos, por Diels-­Kranz, citada como DK [1].

(1) Protágoras

De longe o mais famoso era Protágoras, e Platão sugere ter sido ele o primeiro a adotar o nome de sofista e cobrar honorários pela instrução que oferecia (Prot. 349a2-4). Nascido em Abdera, não mais tarde do que 490 a.C., morreu provavelmente logo depois de 421 a. C. Em menino, pode ter sido educado por mestres religiosos persas, na Trácia. No diálogo de Platão, o Protágoras, ele é representado como tendo che­gado recentemente a Atenas, vindo de fora (309d3), e é feita referência à ultima vez em que estivera em Atenas, alguns anos antes (310e5). Isso induziu Ateneu a supor que ele tives­se feito apenas duas visitas a Atenas na época em que se situa o diálogo de Platão (DK 80A11), e levou especialistas moder­nos a especulações inúteis. Seria muito difícil crer que Protá­goras tivesse realmente estado em Atenas somente uma vez antes de sua conhecida visita, por volta do final dos anos trinta — sua íntima associação com Péricles e sua escolha, por este, para elaborar a constituição para a nova colônia em Turói deve indicar que ele já era bem conhecido em Atenas por volta de 444 a. C. É provável que sua primeira ida lá fosse mais ou menos em 460 a. C., visto que, segundo o que diz Platão, ele tinha sido sofista por quarenta anos, quando morreu. Na verdade, não há razão nenhuma para crer que ele só estivesse estado uma vez, antes, em Atenas, visto que o que a passagem no Protágoras diz é “quando ele visitou Atenas previamente, isto é, antes”, e não “quando ele visitou Atenas pela primeira vez” [2].

Segundo a tradição corrente, parece que Protágoras mor­reu afogado numa viagem por mar, depois de deixar Atenas por ter sido julgado e condenado por impiedade. Seus livros, recolhidos mediante proclamação do arauto, foram queima­dos na ágora. Os elementos essenciais da história encontram-se já em Timon de Flius e em Filócoros, no século III a. C. Creio que não há motivo para não os aceitar. É verdade que, no Mênon (91e3-92a2), Sócrates diz que até o dia em que ele está falando (data dramática do diálogo, talvez 402 a. C.) Protágo­ras nunca deixara, de forma alguma, de ter uma boa reputa­ção. Tem-se argumentado que essas palavras provam que Protágoras nunca sofreu qualquer séria desgraça pública e que, consequentemente, a história de seu julgamento não pode ser verdadeira. Mas é difícil achar que essa objeção seja conclusiva. Já foi assinalado [3] que Platão teria dito a mesma coisa a respeito de Sócrates, que, de fato, foi julgado por impiedade e condenado à morte.

Na lista dos “livros existentes” de Protágoras, preservada por Diógenes de Laércio, consta o seguinte: Arte da Erística, Sobre a luta corpo a corpo, Sobre Ciências (ou possivelmente Sobre Matemática), Sobre Governo, Sobre a ambição, Sobre as virtudes, Sobre o estado original das coisas, Sobre os que estão no Hades, Sobre ações humanas incorretas, Imperativo, Julgamento a propósito de um pagamento e Analogias em dois volumes. Sobre os deuses e Verdade, também obras suas, não foram incluídas na lista. Na maioria dos casos, não temos nenhuma indicação positiva do real alcance ou conteúdo dessas obras.

Nos anos 1851-54, em escavações conduzidas por Mariette, foram descobertas, em Mênfis, no Egito, umas onze estátuas dispostas em semicírculo de frente para o fim da chamada aléia da Esfinge que leva a Serapeum. Elas foram deixadas in situ e acabaram cobertas, de novo, por areia levada pelo vento. E foram redescobertas em 1938, mas os trabalhos foram interrompidos durante a Segunda Guerra Mundial. Foram finalmente descobertas, de novo, em 1950 e então apresentadas integralmente [4]. Na metade oriental do semicírculo temos Platão, Heráclito, Tales e Protágoras, identificados pela inscrição de seus nomes nas estátuas. Apesar do uso de ômicron em lugar de ômega no nome de Protágoras, a identificação parece segura e não foi questionada. A data é incerta, mas as estátuas certamente pertencem ao período ptolomaico. O que é notável é que Protágoras esteja incluído numa série de filósofos, de frente para um conjunto de poe­tas, no lado oposto; um testemunho claro, ao que parece, da importância de que estava investido no período helenístico.

Notas e referências

[1] H. DIELS, W KRANZ, Die Fragmente der, Vorsokratiker, 6a ed. e pos­teriores, 3 vols., Berlim, 1951-52. Há uma edição por M. Untersteiner com tradução italiana e comentário em 4 fascículos, intitulada Sofisti, Testimonianze e Frammenti, Florença, 1949-62, que é bem distinta do seu volume interpretativo I Sofisti, Turim, 1949.2a ed., 2 vols., Milão, 1967.

[2] to proteron, e não to prõton. Corretamente traduzido por W. K. C. GUTHRIE, Plato Protagoras and Meno, Londres, Penguin, 1956: “A últi­ma vez que ele veio a Atenas eu era ainda criança”.

[3] GUTHRIE, History of Greek Philosophy, III, 263.

[4] J. Ph. LAUER e Ch. PICARD, Les statues ptolémaiques du Sarapieion de Memphis, Paris, 1955. Ver, também, K. SCHEFOLD, Die dichtr und Weisen in Serapieion, Mus.Helv. 14 (1957) 33-8.

[4] J Ph. LAUER e Ch. PICARD, Les statues ptolémaiques du Sarapieion de Memphis, Paris, 1955. Ver, também, K. SCHEFOLD, Die dichtr und Weisen in Serapieion, Mus. Helv. 14 (1957) 33-8.

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