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O que acontecerá se Lula for candidato

Quem faz análise política não pode ser torcedor. Tem a obrigação de perguntar: a Lava Jato – instrumentalizada por Janot – desembocará objetivamente na candidatura de Lula?

A pergunta é se ela desembocará (ou não) objetivamente, quer dizer, independentemente da intenção dos sujeitos. Não estamos perguntando se a força-tarefa da Lava Jato ou mesmo se Janot querem que isso aconteça. Estamos perguntando o que acontecerá em termos de desdobramento político: Lula poderá ser (e será) candidato? Sim ou não?

Entenda. A questão, no curto prazo, não é se Lula vencerá as eleições diretas (de 2018 ou antecipadas). Muitos dirão que ele será derrotado nas urnas, que sua rejeição é a maior da história e blá-blá-blá. Mas não é disso que se trata aqui. A questão é a sua candidatura. Por que? Porque a candidatura de Lula é a maior ameaça, hoje, à democracia brasileira.

Você não entendeu? É explicável que você – se não tem muita intimidade com a análise política – não tenha entendido.

Vamos tentar desenhar então.

Se Lula for candidato (atenção: se ele for candidato, não se vencer a eleição):

1 – Será quase impossível que ele – Lula – seja preso tendo já começado a campanha. Seria um escândalo internacional e nenhum argumento jurídico desconstituiria a falsa narrativa de um segundo golpe das elites, agora para impedir a legítima eleição democrática do filho do povo. Ora, Lula é o chefe da organização política criminosa que dirige de fato o PT: se ele continuar solto, a organização continuará atuando (pois até agora ela não foi desbaratada) e ameaçando a nossa democracia.

2 – Permitirá uma reaglutinação de forças sociais em torno do PT (que haviam sido perdidas desde 2013 e notadamente em 2015 e 2016, no processo do impeachment, quando o partido foi derrotado nas mídias sociais, nas ruas, no parlamento e nas urnas). Mesmo que Lula perca as eleições, a sua campanha eleitoral tende a recolocar o PT como o principal partido do país. E os militantes e simpatizantes que estão presentes na universidade (sobretudo nas áreas de humanas das federais, mas não só), nos grandes meios de comunicação e na chamada mídia alternativa (como os sites e blogs da rede suja), nos ambientes artísticos e culturais, nos organismos internacionais do sistema das Nações Unidas e similares, nos movimentos sociais, nas entidades sindicais e associativas, na burocracia das empresas estatais e, sobretudo, nos seus fundos de pensão, nas organizações não-governamentais, nos escritórios de advocacia e em vários órgãos do Estado (inclusive no ministério público e nos tribunais de justiça, nas agências reguladoras, nos órgãos da administração direta e indireta) – todos esses ganharão força para passar à ofensiva e para reconquistar milhões de pessoas que não têm participação política mas que votaram em Lula e Dilma na última década.

3 – Vincará a sociedade de cima a baixo, destruindo aceleradamente nosso capital social (será semelhante à campanha adversarial de Dilma em 2014, porem elevada à enésima potência). Uma campanha com Lula candidato (agora ou em 2018) será, para todos os efeitos, uma guerra civil fria capaz de atrasar, talvez em décadas, o processo de democratização no Brasil (que depende dos níveis de confiança ampliada socialmente).

4 – Elegerá um número expressivo de deputados federais e estaduais da legenda e da coligação Lula de volta nos braços do povo, reequilibrando a correlação de forças nos parlamentos e, dificultando sobremaneira a vida de qualquer governo eleito que não for do PT e de seus aliados. A não ser que Lula sofra uma derrota acachapante (o que é improvável), o mandato de um futuro presidente qualquer não-petista será devastado por um prolongamento da guerra civil fria iniciada na campanha e será marcado por obstrução, oposição sistemática, sabotagem e investimento no caos político e social. Não haverá trégua.

5 – Caso o financiamento de campanha seja exclusivamente estatal ou permaneça proibida a participação empresarial, o PT será, de longe, o partido com mais recursos (pois até agora não foram recuperados os frutos de uma década de crimes, que estão guardados em contas secretas, no Brasil e no exterior, em nome de laranjas e de offshores).

6 – Na ausência de uma candidatura democrática viável, poderá nos levar ao pior dos mundos: uma disputa entre dois autocratas, Lula (de esquerda) x Bolsonaro (de direita). Essa disputa, em si, independentemente do seu resultado, provocará um retrocesso democrático de grandes proporções na sociedade.

Tudo isso se Lula for apenas candidato. Mas pode acontecer o pior…

7 – Na eventualidade de uma polarização Lula x Bolsonaro, Lula será eleito (com folga). Mas, seja por essa via ou por outra qualquer, um terceiro mandato de Lula não poderá mais se exercer nos marcos da democracia (não, pelo menos, como a conhecemos no Brasil nos últimos 30 anos). Os democratas seremos implacavelmente perseguidos e o PT – tendo aprendido com seus erros – acelerará o processo de bolivarianização do nosso regime político.

Portanto, o leitor não deve responder com base em wishful thinking. Não adianta dizer que Lula será preso ou ficará inelegível e não poderá ser candidato. Não adianta dizer que Lula tem a maior rejeição da história e nunca será eleito.

Quase todo este artigo é para dizer o que acontecerá, objetivamente, se Lula for candidato (não se ele for eleito).

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