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Democracia e autocracia no mundo em 2023 (V-Dem, EIU e FH)

Sairam os relatórios de 2023 (alguns nomeados como 2022) dos três principais institutos que monitoram os regimes políticos no mundo: o do V-Dem (da Universidade de Gotemburgo), o da The Economist Intelligence Unit (EIU) e o da Freedom House. Eles podem ser baixados nos links deste parágrafo.

V-DEM

A classificação dos regimes políticos, adotada pelo V-Dem, em quatro tipos (democracia liberal, democracia eleitoral, autocracia eleitoral e autocracia fechada) é a mais sugestiva (porquanto faz uma distinção clara entre regime eleitoral e democracia ao mostrar que existem – e em grande número – autocracias eleitorais). Essa classificação é baseada num estudo de Anna Lührmann, Marcus Tannenberg e Staffan Lindberg (2018) – Regimes of the World (RoW): Opening New Avenues for the Comparative Study of Political Regimes. Eis um quadro resumo:

Ou seja, segundo o V-Dem 2023 temos 32 democracias liberais, 58 democracias eleitorais, 56 autocracias eleitorais e 33 autocracias fechadas, conforme mostra o seguinte mapa – com variações que vão desde as democracias liberais mais bem colocadas (em roxo) às autocracias mais fechadas (em vermelho escuro):

O Índice de Democracia Liberal (LDI) do V-Dem captura os aspectos eleitorais e liberais da democracia e vai do nível mais baixo (0) ao mais alto (1) da democracia.

EIU

A The Economist Intelligence Unit (EIU) também classifica os regimes em quatro tipos (democracias plenas, democracias defeituosas, regimes híbridos e regimes autoritários). O mapa do Democracy Index 2022 é o seguinte:

Para a EIU temos, portanto, 24 democracias plenas, 48 democracias defeituosas, 36 regimes híbridos e 59 regimes autoritários.

FH

A Freedom House (FH), por sua vez, classifica os regimes em três tipos (livres, parcialmente livres e não-livres). No mapa abaixo os países com regimes livres estão em verde, os parcialmente livres em amarelo e os não-livres em roxo. Excetuados os territórios, temos então 83 países com regimes livre, 56 parcialmente livre e 56 não-livre.

CRUZANDO RANKINGS

Tomando como referência básica a lista de 21 primeiros colocados (1) na lista dos regimes considerados democracias plenas (full democracies) pelo Democracy Index da EIU e fazendo um cruzamento com os Top 21 do ranking Liberal Democracy Index do V-Dem e com os Top 21 do ranking Freedom Score da FH, pode-se montar a seguinte tabela:

Presentes nos três rankings (V-Dem, EIU e FH) temos a seguinte lista de 12 países provavelmente mais democráticos:

Alemanha

Austrália

Chile

Dinamarca

Finlândia

Holanda

Irlanda

Luxemburgo

Noruega

Nova Zelândia

Suécia

Suíça

Se fizemos, por mero amor à simetria, a mesma coisa, considerando porém os 21 Bottom dos três rankings, pode-se montar a seguinte tabela:

Presentes nos três rankings (V-Dem, EIU e FH) temos a seguinte lista de 12 países provavelmente mais autocráticos:

Afeganistão

Arábia Saudita

Belarus

China

Coréia do Norte

Eritreia

Guiné Equatorial

Iemen

Miammar

Siria

Tajiquistão

Turcomenistão

Colocando as duas listas acima (mais democráticos e mais autocráticos) numa mesma tabela:

DEMOCRACIA E POPULAÇÃO

Considerando apenas os rankings do V-Dem e da EIU, vemos que os regimes vigentes nos países gigantes e muito grandes (com mais de 100 milhões de habitantes) são majoritariamente autocráticos (ou seja, ou são autocracias fechadas ou eleitorais – na classificação do V-Dem; ou são regimes autoritários, híbridos ou de democracia defeituosa – na classificação da EIU):

Em contrapartida, se considerarmos os regimes vigentes nos países independentes muito pequenos (com menos de 100 mil habitantes), o resultado é inverso. Nossa base de dados aqui, porém, é muito limitada: dos 33 países com menos de 100 mil habitantes, apenas 11 são avaliados pela Freedom House e apenas 1 pelo V-Dem.

Ou seja, segundo a The Economist Intelligence Unit (EIU) não há democracias plenas em países grandes (com mais de 100 milhões de habitantes), com a (única) exceção do Japão. Todos os demais regimes desses quatorze países gigantes são autoritários (4), híbridos (4) ou flaweds democracies (5). A EIU não avalia regimes de países pequenos (com menos de 100 mil habitantes), mas a Freedom House (FH) sim. Todos os onze regimes avaliados pela FH nos 33 países com menos de 100 mil habitantes são considerados livres (free countries). São, na verdade, cidades. Quando o país é independente e pequeno (menos de 100 mil habitantes), não há nenhuma ditadura: nem autocracia fechada ou eleitoral (V-Dem), nem mesmo regime híbrido (EIU) ou parcialmente livre (FH).

Talvez (mas, por enquanto, só talvez) isso ocorra porque – em localidades menores – há mais chances de prevalência de uma dinâmica comunitária. Isso poderia ser uma indicação (ou uma corroboração) de que a democracia – além de ter nascido em uma cidade – é propriamente mesmo um tipo de regime mais adequado à cidades.

Nota

(1) O número 21 surge do cruzamento dos regimes que aparecem em duas listas (democracia liberal do V-Dem e democracia plena da EIU):

  1. Alemanha
  2. Austrália
  3. Chile
  4. Coreia do Sul
  5. Costa Rica
  6. Dinamarca
  7. Espanha
  8. Finlândia
  9. França
  10. Holanda
  11. Irlanda
  12. Islândia
  13. Japão
  14. Luxemburgo
  15. Noruega
  16. Nova Zelândia
  17. Reino Unido
  18. Suécia
  19. Suíça
  20. Taiwan
  21. Uruguai

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