Democracia é sinônimo de liberalismo-político. Por isso alguns estranham a caracterização ‘democracia i-liberal’ (como formulada, por exemplo, por Viktor Orbán). No entanto, existem graus de liberalismo-político em democracias como regimes eleitorais, ainda que possa também haver regimes eleitorais que não sejam democráticos.
A classificação do V-Dem (Universidade de Gotemburgo) parece ser a melhor: democracias liberais (como a Noruega), democracias eleitorais (não suficientemente liberais, como o Brasil), autocracias eleitorais (como a Rússia) e autocracias fechadas (como a Coréia do Norte).
Há graus de liberalismo-político nos regimes considerados democráticos. A Nova Zelândia (democracia liberal) tem mais liberalismo-político do que a Argentina (democracia eleitoral), mas isso não significa que não sejam, ambas, democracias.
A rigor, um regime i-liberal não é democrático: pode ser uma autocracia eleitoral (como Singapura) ou uma autocracia fechada (como a China). Mesmo assim, existem graus de i-liberalismo: a Nicarágua (autocracia eleitoral) não é tão i-liberal quanto a Somália (autocracia fechada).
As classificações que estabelecem fronteiras são equívocas porquanto arbitrárias. Sobretudo porque existem países que estão nas fronteiras. E porque há graus de liberalismo-político em todos os regimes (até na Coréia do Norte deve haver algum grau, ainda que próximo de zero) e não apenas nas cerca de 40 democracias liberais consideradas pelo V-Dem.
Se não adotarmos uma classificação de graus de liberalismo (ou de i-liberalismo) dos regimes políticos, não poderemos acompanhar o desenvolvimento da democracia, nem ranquear os países com base em critérios objetivos de democratização (ou autocratização). Nem poderemos entender as transições: por exemplo, a Polônia deixou de ser uma democracia liberal e passou a ser uma democracia (apenas) eleitoral, enquanto que a Tunísia está fazendo o caminho inverso. Por isso é melhor distribuir os regimes por graus de liberalismo-político, como se fosse um gradiente, indo do i-liberalismo (ou liberalismo-político mínimo) para o liberalismo-político (máximo). A vantagem é poder perceber as transições dos regimes: autocratizantes (para a esquerda, no gráfico) ou democratizantes (para a direita, idem).
Tudo isso tem utilidade prática para monitorar as ameaças à democracia como regime liberal. Do contrário teremos que considerar tudo que não é regime liberal como ditadura, o que retira potência da análise.
Devemos considerar, portanto, graus de liberalismo-político. Por exemplo, a democracia no Brasil está ameaçada neste momento, mas não de virar uma ditadura (uma autocracia eleitoral ou fechada) no curto prazo e sim de continuar sendo uma democracia eleitoral, porém menos liberal.
Este artigo continua.