in

A eleição presidencial de 2022 não será um passeio no parque numa tarde primaveril

Os militantes petistas falam de culpa. Até hoje repetem que a culpa por Bolsonaro estar no poder é de quem não votou em Haddad, inclusive de quem anulou o voto. E repetem aquela cantilena da viagem de Ciro a Paris no segundo turno de 2018.

Falemos então de culpa. A culpa por Lula não ter crescido nem um ponto percentual em 6 meses (paralisado em 45%), e de Bolsonaro ter subido de 24 para 31%, não é de Ciro Gomes ou de Simone Tebet. A culpa, em grande parte, é do hegemonismo do PT e de sua militância arrogante, que continuam alimentando o antipetismo.

Desses 45% em que Lula está empacado desde fevereiro, 15% não são votos orgânicos do PT. Não são lulopetistas raiz e sim lulistas ocasionais. Podem migrar para outro candidato não-bolsonarista que chegar a dois dígitos com viés de alta.

E dos 30% de Bolsonaro, 10% são de antipetistas, que também podem migrar para a nova candidatura emergente.

Bolsonaro está crescendo com votos da base eleitoral principal de Lula (quem ganha até 2 salários mínimos), não de Ciro ou de Simone. E nada que Lula fizer captura votos de Bolsonaro.

Ainda que Lula, até agora, venha compensando as perdas para Bolsonaro com a aquisição de novos votos dos que não encontram alternativa a Bolsonaro a não ser Lula.

Isso significa que se uma alternativa democrática que pareça viável a Bolsonaro surgir, Lula deixa de amealhar esses votos e pode até perder alguns dos que já capturou.

Além disso, uma candidatura democrática que pareça viável para impedir a volta do PT pode capturar votos antipetistas de Bolsonaro.

Os eleitores de Ciro e de Simone não devem se deixar atemorizar pelo terrorismo petista de dizer que, se não votarem em Lula no primeiro turno, Bolsonaro se reelegerá ou dará um golpe.

Quem não vota em Bolsonaro no primeiro turno não está reelegendo Bolsonaro, muito menos fornecendo munição para que ele dê um golpe. Qualquer voto que não for em Bolsonaro no primeiro turno tira chances de Bolsonaro passar ao segundo turno.

Ou seja, a única maneira de não reeleger Bolsonaro é não votar em Bolsonaro, no primeiro turno e, se for o caso (se lá ele estiver), no segundo turno. Esse papo de que a única maneira de não reeleger Bolsonaro é votar em Lula no primeiro turno não faz sentido. É uma enganação que tem origem num medo do lulopetismo de um segundo turno se o adversário de Lula não for Bolsonaro.

Tudo isso vem ao caso agora porque, ao contrário do que imaginavam Lula e o PT, a eleição de 2022 pode não ser aquele passeio no parque numa tarde primaveril. As últimas pesquisas sérias, dando empate na margem de erro entre Lula e Bolsonaro em São Paulo e queda acentuada da diferença entre os dois em Minas Gerais, soam como um alerta vermelho. São Paulo porque é o maior colégio eleitoral, que em 2018 neutralizou os votos do PT no Nordeste. Minas porque, além de ser um colégio imenso, retrata de certo modo a diversidade do país. E em Minas a famosa “boca do jacaré” está se fechando, não se abrindo (a vantagem de Lula sobre Bolsonaro caiu de 18 para 9 pontos). Ademais, entre quem recebe Auxílio Brasil, Lula perdeu 7 pontos e Bolsonaro ganhou 9.

Não há dúvida de que Bolsonaro era o melhor antagonista para Lula. Mas já começam a aparecer dúvidas de se Lula é o melhor candidato para vencê-lo. Se uma alternativa aos dois populistas não crescer, Bolsonaro pode empatar com Lula (ou até ultrapassá-lo) na reta final. Ainda é cedo para dizer. Mas as tendências não são tranquilizadoras para o PT.

Pelo menos até agora a eleição presidencial continua sequestrada pela disputa entre dois populismos. Quando uma coisa assim acontece o trânsito dos democratas fica obstruído. Mas isso não significa que o caminho dos democratas não-populistas continuará necessariamente congestionado até outubro, conquanto ainda seja o mais provável.

A democracia falsificada pela China

O tema do meu novo livro: Como as democracias nascem