As pessoas não estão dispostas a parar tudo para recuperar um pedaço de céu velho que caiu lá atrás
Estive em Brasília (de 31 de maio a 1 de junho). Voltei há pouco. Conversei com vários atores políticos, com gestores de carreira do Estado e com gente comum. Minha impressão é a seguinte: a maioria das pessoas quer andar para frente. Há, sim, uma porcentagem (pequena) que quer ficar remoendo, alimentando rancores e ressentimentos. Há gente até organizando brigadas de luta, meio na vibe dos anos 70 e 80 do século passado. Mas estes ficam falando sozinhos ou entre eles mesmos (tipo retroalimentação negativa). As pessoas querem continuar caminhando e não têm nenhum desejo de parar tudo para recuperar um pedaço de céu velho que caiu lá atrás. Notei isso até entre os que eram simpáticos ao PT.
Os que pensam politicamente sabem avaliar muito bem a natureza do governo Temer. Sabem que não é um governo da oposição formal, partidária (ainda que conte com três ou quatro gatos pingados do PSDB, do DEM e do PPS). Sabem também que não é um governo da nova oposição popular que emergiu da sociedade. Veem claramente que é um governo da base do antigo governo (do PMDB, do PP e outros sócios menores), em grande parte fisiológica e com comportamentos pouco republicanos (tudo como d’antes, durante os governos Lula e Dilma). Não é o governo dos sonhos de ninguém. Mas qual a alternativa? A volta de Dilma. Ah!… Não dá! Isso (quase) ninguém quer.
O governo Dilma perdeu a sua base congressual no momento em que a galera descobriu que o plano do PT era matar os aliados no final. Agora esta base está perdida de vez. Com alguns milhões de reais pode-se até comprar algumas cabeças. Mas a base, como tal, já era. Não volta mais. Pode até apoiar um aventureiro, pode até, depois de amanhã, se aliar a um Marcola ou a um Fernandinho Beira Mar. Mas voltar a servir como força auxiliar do PT, nunca mais. Até entre bandidos existe uma ética que não deve ser violada.
Os atores (estatais: parlamentares, juízes, procuradores, governantes) em geral não têm consciência de que o Estado atua por meio deles para se proteger. Mesmo sem saber, eles funcionam como anticorpos do Estado. O Estado-nação, assim como as demais formas de Estado que surgiram nos últimos seis milênios, é um tipo de organismo social extremamente resiliente, capaz de se auto-regenerar para continuar existindo. O Estado-nação brasileiro reagiu à tentativa do PT de criar um Estado paralelo. É por isso que as chamadas instituições, inclusive aquelas que foram compostas majoritariamente por indicações do PT (como o STF), não obedecem ao PT. É por isso que o parlamento como um todo – por mais fisiológico que seja e tenha sido alugado pelo PT – desobedeceu ao PT. É por isso que o ministério público não serve mais ao partido (inclusive o Procurador Geral da República, mesmo reconduzido pelo PT, não se mostra suficientemente grato, segundo reclamou Lula em gravação autorizada pela justiça). É por isso que as forças armadas ficaram quietas (felizmente) durante toda esta crise, mas seu silêncio foi gritante: deixaram claro que não entrariam em nenhuma aventura para alterar a natureza do Estado constitucional (o Estado democrático de direito) e que não apoiavam as tendências lesa-pátria da política externa lulopetista de se aliar a ditaduras e protoditaduras bolivarianas (o calcanhar de Aquiles do PT, o rabo do gato que não pode ser escondido, por meio do qual ficava claro o seu projeto, por mais que reiterasse negativas e protestos de que suas intenções eram democráticas).
A máquina está rodando. Rodaria com qualquer um. Roda até sem presidente. O mercado político e o mercado propriamente dito já precificaram o governo Temer. E vão com ele na falta de alternativa melhor (a volta de Dilma é alternativa pior). A não ser que haja um caos no país, a tendência inercial é esta. Rei morto, rei posto. Vamos em frente que atrás vem gente.
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