A democracia no Brasil está sob ataque. Não vamos esconder isso alegando que se deve separar a retórica autoritária inflamada de Bolsonaro de suas ações concretas.
Repito. Não caiam na conversa de que o bolsonarismo é pura retórica. Examinem todas as medidas administrativas e todas as iniciativas legais autoritárias tomadas até hoje por Bolsonaro. Tudo isso está longe de ser apenas retórica. Mas se fosse apenas retórica, ainda assim seria um ataque político.
A democracia no Brasil está sob ataque. Mesmo deixando de lado as medidas antidemocráticas que estão sendo tomadas pelo governo, a retórica autoritária de Bolsonaro é – em si – ação concreta de ataque político. Política é retórica.
Essa distinção, de que devemos separar a retórica de Bolsonaro de suas ações concretas, não deve ser endossada acriticamente. As falas de um presidente de facção, que orientam sua militância, são atos políticos. Ademais ele não apenas fala: toma medidas legais e ilegais antidemocráticas.
Essa tese apaziguadora, às vezes meio pollyanna, do ministro Barroso e de alguns analistas políticos, não deve ser repetida sem algum cuidado. Todos os processos de autocratização da democracia começam assim, pela retórica autoritária inflamada. Se colar, o poder vem depois.
Qual foi a aula de democracia que vocês perderam para não entenderem que política é retórica? Sugestão de leitura: o capítulo 8 de O Movimento Sofista, do grande George Briscoe Kerferd (1981).
A democracia no Brasil está sob ataque.
Ah! Mas eles não têm força para tanto.
Não importa se os que estão atacando a democracia têm ou não têm força para aboli-la. Provavelmente não têm. Mas o que eles querem é drenar o conteúdo liberal da nossa democracia para que dela reste apenas a casca eleitoral. E estão conseguindo.
Ah! Mas Bolsonaro é ridículo.
Todo autocrata em início de carreira é ridículo. Mas do fato de ele ser ridículo, apoiando-se em uma retórica autoritária inflamada e ainda sem forças para tomar ações concretas compatíveis com seu discurso, não podemos derivar que seja menos perigoso.
Ah! Mas Bolsonaro é minoria. E nós somos 70%, quer dizer, a ampla maioria.
Mas do fato do bolsonarismo ser minoria – em termos eleitorais e como força orgânica, em termos de militância – não se pode inferir que seu propósito não seja golpista. É o contrário. Se fosse maioria não precisaria tentar nenhum golpe, nem retórico, nem de fato.
Vejamos um exemplo atual.
Em um tweet conjunto de ontem a noite, Jair Bolsonaro, Hamilton Mourão e Fernando Azevedo, atacaram frontalmente a democracia.
O tweet, por si só, é uma afronta à democracia. Não cabe a eles (o capitão e seus dois generais) julgar o que seria uma ação ao arrepio das leis ou o que seria um julgamento político. Para isso existe poder judiciário no Brasil. Ademais, o impeachment é um julgamento político previsto na Constituição Federal.
As forças armadas aceitaram os julgamentos políticos de Collor e de Dilma, mas não aceitam o de Bolsonaro? Então é isso que significa ter lado?
As forças armadas, coitadas, acreditaram mesmo que voltaram ao poder político com Bolsonaro. Meio século não foi suficiente para que elas aprendessem que em democracias os militares não têm qualquer papel político.
Ah! Mas eles estão só ameaçando o judiciário e o parlamento para obterem decisões favoráveis ao governo, pois não pretendem (ou não conseguem) dar um golpe de fato. É pura retórica.
Sim, é retórica. E retórica é política. C. Q. D.



