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A rede suja

De onde saem as falsas versões — que são repetidas ad nauseam pelos militantes nas mídias sociais —  como as de que o impeachment é golpe, de que o maior corrupto do Brasil é Cunha, de que Temer é traidor, de que Aécio é cheirador de pó e traficante de drogas, de que Dilma não cometeu crime algum, de que todas as acusações contra Lula são falsas (inclusive as do triplex do Guarujá e do sítio em Atibaia), de que Moro é do PSDB e que a força-tarefa da Lava Jato tortura (ou chantageia) seus presos para que eles delatem dirigentes do PT?

Os argumentos são tão parecidos — na maior parte dos casos, são idênticos mesmo (inclusive as imagens que são replicadas ) — que não poderiam ser inventados por seus autores. É óbvio que há uma central — uma rede centralizada ou descentralizada — de veículos de comunicação ditos “alternativos” cuja função é espalhar tais versões e fabricar narrativas convenientes ao governo.

Vamos recordar.

Em dezembro de 2014, o jornalista Fernando Rodrigues, publicou no seu blog uma matéria exaustiva mostrando que, de 2010 a 2013, apenas três estatais — Petrobrás, Banco de Brasil e Caixa — gastaram 17 milhões com publicações de audiência limitada, como Opera Mundi, Conversa Afiada, Carta Maior e outras. Vamos transcrever uma parte da matéria:

“Em abril de 2013, o governo publicou um artigo no site “Observatório da Imprensa” no qual a Secom argumentava que praticava o que chama de “mídia técnica”: cada veículo receberia verbas de publicidade de acordo com a proporção de sua audiência.

Agora, com as informações fornecidas por força da Justiça, fica claro que os critérios não são lineares e a chamada “mídia técnica” não é uma praxe em todos os setores da administração pública federal.

Empresas como Petrobras, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal usam critérios obscuros para comprar espaços publicitários.

Eis, a seguir, alguns anúncios captados em 8.dez.2014 em sites alternativos e de pouca audiência relativa. Todos têm em comum o forte apoio de empresas estatais federais, que competem no mercado para ter clientes e serem rentáveis. Neste mês de dezembro de 2014, muitos publicaram propaganda dos personagens “poupançudos da Caixa”:

Rede Suja reprotagem 1

Vale a pena observar os valores que as empresas estatais federais gastam com veículos de comunicação da mídia tradicional.

A seguir, uma compilação preparada pelo repórter do UOL Bruno Lupion para o Blog. Os dados estão separados por: veículos alternativos de baixa audiência, TV aberta, revistas, jornais impressos e portais de internet de audiência de massa:

Rede Suja reportagem 2Rede Suja Reportagem 3

Rede suja reportagem 6Rede suja reportagem 7É importante explicar – finaliza Rodrigues – qual é a fonte usada pelo governo para compilar seus gastos publicitários. Todas as informações são obtidas por meio do Instituto para Acompanhamento da Publicidade, o IAP”.

Mas a coisa não para por aí. No início de agosto de 2015, o Ministério Público Federal pediu a prisão temporária do jornalista Leonardo Attuch, responsável pelo blog Brasil 247, e o bloqueio de R$ 120 mil de contas ligadas a ele pelo recebimento de propinas dirigidas ao ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. Em sua decisão relativa à 17ª fase da Operação Lava Jato, o juiz federal Sérgio Moro concordou que houve pagamentos de propinas à Editora 247 mas entendeu ser “necessário um aprofundamento maior das investigações” e negou os pedidos.

Segundo o MPF, a editora recebeu R$ 120 mil entre setembro de dezembro de 2014 por intermédio da Jamp Engenheiros Associados, empresa de fachada do lobista Milton Pascowitch (operador de José Dirceu), “ocorrido como formas de conferir aparência de legalidade aos pagamentos de João Vaccari Neto”. Em sua delação premiada, Pascowitch afirmou que Vaccari pediu que fosse feita uma reunião com Leonardo Atuch para a simulação de um contrato de prestação de serviço.

Em outubro de 2014 a Polícia Federal já havia encontrado uma anotação do doleiro Youssef: ‘Leonardo Attuch 6×40.000,00′. A anotação foi fotografada e incluída no relatório da delegada Paula Ortega Cibulski.

Attuch anotações

Existem centenas de registros como este, evidências em posse da Polícia Federal, do Ministério Público e do juiz Sergio Moro. Foi apenas a ponta visível do iceberg.

O PT montou um esquema — ao que tudo indica elaborado e inicialmente operado por Dirceu — para financiar uma rede suja de sites e blogs, jornais e revistas cujo objetivo era muito mais solerte do que apenas fazer propaganda.

Sim, há um esquema. Esse esquema se desvelou claramente no início de 2014, quando a rede suja — como um todo — replicou a falsa versão de que as imagens que chegavam das grandes manifestações de protesto na Venezuela contra Maduro e o regime chavista, eram manipuladas, descontextualizadas e que tinham sido fabricadas pela CIA.

No esquema pode-se identificar três níveis:

1 — PLANTADORES, sites que plantam versões ou que sulcam interpretações (como o Brasil247, a Carta Capital, A Nova Ordem Mundial, a Revista Fórum, o Pragmatismo Político, o Outras Palavras, o Opera Mundi, o VIOMUNDO etc).

2 — ESPALHADORES, em geral blogs ou hubs nas mídias sociais. Aqui temos duas categorias: a) blogs financiados pelo governo ou por estatais; e b) outros sites, blogs, páginas e perfis de pessoas que estão convencidas de que este é o seu papel militante (aqui entram também algumas agências de jornalismo alternativo, como a Mídia Ninja e outras). Há uma singularidade nesse grupo: espalhadores podem também ser plantadores e interpretadores.

3 — REPLICADORES nas mídias sociais (no Facebook, no Twitter, no Google+ etc.), sendo que aqui também temos duas categorias: a) funcionários que fazem isso por ordem de um chefe pagador (como aquela turma da antiga Casa Fora do Eixo de São Paulo); b) pessoas que são influenciadas pelo que leem nos blogs espalhadores ou sites plantadores e que podem adquirir a dinâmica de manada.

Os níveis 1 e 2 são mais fáceis de mapear (sendo que o 1 é muito mais fácil que o 2). O nível 3 é muito difícil (mas não é impossível, pelo menos o 3a).

Os principais plantadores e espalhadores estão na imagem abaixo:

Rede Suja 3

As pessoas que são de esquerda e desconfiam da “mídia golpista” leem esses veículos regularmente na busca de “alimento para a alma”. Explica-se. As pessoas querem ler algo que as conforte, que confirme suas convicções. Diante de tantas evidências de crimes cometidos pelos seus admirados líderes e pelo partido que apoiaram, elas se recusam a acreditar no que veem diariamente na imprensa e na TV (é duro para uma pessoa confessar para si mesma que estava errada, que perdeu seu tempo ou que foi enganada). Então elas buscam avidamente alguma coisa que prove que não é bem assim, que está havendo uma fabulosa orquestração para deslegitimar o lado do bem, que há uma conspiração do mal (das elites, dos coxinhas, dos conservadores, dos exploradores, do capitalismo internacional, do imperialismo norte-americano e de seus instrumentos, como a CIA).

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