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Escapar do cenário peruano é hoje o principal imperativo democrático no Brasil

No momento em que este artigo está sendo escrito, com 99% dos votos apurados, a eleição presidencial no Peru segue indefinida. Pedro Castillo, do partido Peru Libre, continua à frente, com 50,241% dos votos válidos, enquanto Keiko Fujimori, do Fuerza Popular, soma 49,759%. Esse é o desfecho normal de uma polarização populista.

A pior coisa que pode acontecer no Brasil é uma polarização populista. Qualquer polarização acirrada tende ao empate. Aumenta os votos de Bolsonaro reavivando o antipetismo. Faz as pessoas que não concordam com Lula o escolherem como o menos pior. O resultado é contestado, retirando – de partida – legitimidade do novo governo eleito. Haverá acusação de fraude. Seja qual for o vencedor, a política vira, a partir daí, uma guerra civil fria de longa duração. E o processo de erosão da democracia é acelerado.

Nenhuma polarização populista pode trazer mais luz. Como a disputa, no Peru, entre Castillo e Fujimori, a polarização acirrada entre Lula e Bolsonaro nos mergulhará em trevas mais profundas. Sim, não custa repetir. Sobrevirá uma guerra civil fria de longa duração erodindo ainda mais nossa já frágil democracia.

A guerra – seja na sua forma quente, seja na sua forma fria, seja na sua forma de política como continuação da guerra por outros meios – é o contrário da democracia.

Temos um bom exemplo. Biden não venceu Trump guerreando e sim pazeando. Se ele fosse um populista, que fizesse política como guerra do “nós” contra “eles”, teria perdido. Ou teria mergulhado os EUA numa crise institucional sem precedentes. Foi a paz, não a guerra, que salvou a democracia americana (pelo menos por enquanto).

Todavia, como escapar, no Brasil, da polarização populista? Como ter um Biden em vez de um Lula para enfrentar Bolsonaro?

Ora, só há um caminho. Criar as condições para inovar, alterando a trajetória que, inercialmente, vai nos levar para o confronto entre dois projetos populistas (o populismo-autoritário bolsonarista versus o neopopulismo lulopetista).

A maneira de fazer isso é criando um movimento político pela interrupção do mandato antidemocrático e assassino de Bolsonaro. Um movimento pelo impeachment ou para exigir a renúncia do facínora.

A turma que joga contra uma campanha pelo impeachment quer dar a Bolsonaro mais 570 dias para a vacinação avançar, a pandemia regredir, a economia melhorar e um auxílio emergencial mais robusto chegar aos pobres para então removê-lo? É só uma pergunta.

Outra pergunta. Quantos neurônios são necessários para entender que o impeachment é a campanha pelo impeachment (ou pela renúncia) de Bolsonaro? Claro que Lira não vai acatar nenhum pedido. Claro que se ele botar um pedido de impeachment em votação hoje na Câmara, vai perder (a menos que milhões ocupem as ruas, o que é difícil numa pandemia). Por que então?

Porque esse movimento político é a única alternativa para quebrar a polarização populista, ensejando que novas lideranças surjam e se afirmem. Uma nova liderança capaz de disputar as eleições de 2022 surgirá do movimento e não de uma candidatura urdida nos salões fechados dos condomínios partidários.

Deveria ser óbvio. Não se pode constituir um campo político democrático sem um movimento político democrático.

Democracia e populismo

A única aliança democrática possível com Lula