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Sobre candidaturas de ‘terceira via’ e de ‘centro’

Siga o fio, por favor.

1 – O NOME ‘TERCEIRA VIA’ É PÉSSIMO

1.1 – Passa uma impressão de que é um terceiro lugar, um azarão correndo por fora dos principais contendores.

1.2 – Já pressupõe que existem uma primeira e uma segunda vias ocupando lugares inamovíveis com base em pesquisas extemporâneas de intenção de voto – mas vias para quê mesmo?

1.3 – Numa eleição com muitos concorrentes, os demais seriam o quê? Quarta via, quinta via, sexta via? É meio ridículo.

2 – O NOME ‘CENTRO’ TAMBÉM NÃO É BOM

2.1 – Exige uma explicação adicional de que não se trata de uma posição equidistante da direita e da esquerda e sim de um centro de gravidade da política que, numa democracia, deve ser democrático liberal.

2.2 – Cai naquele velho besteirol classificatório relacional: extrema-direita, direita, centro-direita, centro, centro-esquerda, esquerda, extrema-esquerda, que muda como o vento dependendo das circunstâncias – até no Vaticano pode-se achar uma esquerda ou no PSTU uma direita.

3 – QUAL NOME SERIA BOM?

3.1 – Do ponto de vista da democracia, um regime plural e aberto, é normal que se apresentem muitas candidaturas representando caminhos distintos.

3.2 – Nas eleições de 1989 tivemos 22 candidatos à presidência. Imagine se um deles se apresentasse como a décima via, outro como a décima-sétima via e outro, ainda, como a vigésima-primeira via.

3.2.1 – No final do primeiro turno de 1989 o primeiro lugar foi ocupado por Collor. Em segundo lugar, Lula e Brizola ficaram empatados na margem de erro (respectivamente com 16,69% e 16,04%).

3.2.2 – E quem seria o ‘centro’? Covas (em quarto lugar), Ulysses (em sétimo), Freire (em oitavo) ou Gabeira (em décimo-oitavo)?

3.2.3 – Agora tente aplicar a classificação insana (extrema-direita, direita, centro-direita, centro, centro-esquerda, esquerda, extrema-esquerda) aos 22 contendores de 1989.

3.2.4 – Quem seria esquerda e quem seria centro-esquerda nessa salada composta, entre outros, por Lula, Brizola, Covas, Freire, Gabeira ou Horta do PCdoB?

3.3 – Do ponto de vista da democracia, numa eleição em dois turnos, precisamos de candidaturas democráticas não-populistas, quer dizer, não-iliberais e não-majoritaristas – pouco importa se ditas de direita ou de esquerda, de centro, de centro-direita ou de centro-esquerda.

3.4 – Em princípio todos os que se submetem ao processo eleitoral são (ou estão) democratas eleitorais.

3.4.1 – Claro que há os autocratas que usam as eleições para chegar ao poder e depois acabar com a própria democracia eleitoral (como Erdogan e Orbán que são populistas-autoritários e Maduro e Ortega que são neopopulistas ditos de esquerda).

3.4.2 – Mas também há os democratas eleitorais que usam a democracia eleitoral para dela ir extinguindo toda a sua substância liberal (são os neopopulistas como Chávez, Evo, Correa, Funes, Lugo, Cristina, Fernandez, Obrador, Castillo e… Lula).

3.5 – Não é razoável querer reduzir todas as candidaturas democráticas não-populistas a uma única candidatura antes do jogo começar. Cabe aos eleitores fazer isso. Repetir bovinamente que tem de haver uma união de todos que não apoiam Lula nem Bolsonaro é uma armadilha. Como isso não vai acontecer, passa a impressão de que uma candidatura de ‘terceira via’ ou de ‘centro’ fracassou ou não é viável.

3.6 – Além do quê, os democratas não concorrem apenas para ganhar. Democratas não vencem sempre. Quem costuma vencer sempre é gente como Putin, Orbán, Erdogan, Maduro, Ortega – que são autocratas.

3.6.1 – Democratas liberais, aliás, costumam ser minoria: concorrem para apresentar suas propostas e defender a democracia, para denunciar o autoritarismo e os populismos. Pronto!

Fim do fio.

A guerra civil fria que virá

Com golpe ou sem golpe