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Wajngarten: uma excelente pauta para o jornalismo investigativo

Como se sabe, a Folha de São Paulo (entre outros veículos, como a TV Globo e o Valor Econômico) vem sendo perseguida pelo presidente Jair Bolsonaro. Bolsonaro, violando os princípios constitucionais, excluiu a Folha da licitação para aquisição de jornais pelo governo e declarou um boicote às empresas privadas que fazem propaganda no veículo.

Leiam o editorial da Folha sobre o tema. Volto depois.

Fantasia de imperador

Editorial, Folha de S. Paulo (29/11/2019)

Bolsonaro é incapaz de compreender a impessoalidade da administração republicana

Jair Bolsonaro não entende nem nunca entenderá os limites que a República impõe ao exercício da Presidência. Trata-se de uma personalidade que combina leviandade e autoritarismo.

Será preciso então que as regras do Estado democrático de Direito lhe sejam impingidas de fora para dentro, como os limites que se dão a uma criança. Porque ele não se contém, terá de ser contido —pelas instituições da República, pelo sistema de freios e contrapesos que, até agora, tem funcionado na jovem democracia brasileira.

O Palácio do Planalto não é uma extensão da casa na Barra da Tijuca que o presidente mantém no Rio de Janeiro. Nem os seus vizinhos na praça dos Três Poderes são os daquele condomínio.

A sua caneta não pode tudo. Ela não impede que seus filhos sejam investigados por deslavada confusão entre o que é público e o que é privado. Não transforma o filho, arauto da ditadura, em embaixador nos Estados Unidos.

Sua caneta não tem o dom de transmitir aos cidadãos os caprichos da sua vontade e de seus desejos primitivos. O império dos sentidos não preside a vida republicana.

Quando a Constituição afirma que a legalidade, a impessoalidade e a moralidade governam a administração pública, não se trata de palavras lançadas ao vento numa “live” de rede social.

A Carta equivale a uma ordem do general à sua tropa. Quem não cumpre deve ser punido. Descumpri-la é, por exemplo, afastar o fiscal que lhe aplicou uma multa. Retaliar a imprensa crítica por meio de medidas provisórias.

Ou consignar em ato de ofício da Presidência a discriminação a um meio de comunicação, como na licitação que tirou a Folha das compras de serviços do governo federal publicada na última quinta (28).

Igualmente, incitar um boicote contra anunciantes deste jornal, como sugeriu Bolsonaro nesta sexta-feira (29), escancara abuso de poder político.

A questão não é pecuniária, mas de princípios. O governo planeja cancelar dezenas de assinaturas de uma publicação com 327.959 delas, segundo os últimos dados auditados. Anunciam na Folha cerca de 5.000 empresas, e o jornal terá terminado o ano de 2019 com quase todos os setores da economia representados em suas plataformas.

Prestes a completar cem anos, este jornal tem de lidar, mais uma vez, com um presidente fantasiado de imperador. Encara a tarefa com um misto de lamento e otimismo.

Lamento pelo amesquinhamento dos valores da República que esse ocupante circunstancial da Presidência patrocina. Otimismo pela convicção de que o futuro do Brasil é maior do que a figura que neste momento o governa.

Pois bem. Um dia depois o chefe da Secom, Fábio Wajngarten, contestou o editorial da Folha de S. Paulo, jornal que está sendo vítima de perseguição do presidente. Eis o que ele escreveu (na própria Folha):

“Quero escrever neste espaço para repudiar, com toda a ênfase, o infame, injusto e leviano editorial da Folha de S.Paulo publicado em 29 de novembro… Com o editorial, a Folha de S. Paulo se junta àqueles derrotados nas urnas em outubro passado, aos que tentaram matar o então candidato Jair Bolsonaro, para pregar o desrespeito, a mentira e a tentativa frustrada de desmoralizá-lo no cargo mais graduado da República. Não conseguirão! O presidente Jair Bolsonaro tem uma legitimidade que a Folha de S. Paulo e outros veículos da mesma estirpe, torpes e levianos, não têm e jamais terão: o respaldo da maioria dos brasileiros que o elegeu com um pouco mais de 57 milhões de votos, 55% dos votos válidos. Em São Paulo, sede do jornal e de quem lhe empresta o nome, e maior colégio eleitoral do país, o percentual de votos alcançou a marca dos 67%! Isso é democracia, isso é respeitar o resultado das urnas e a livre e expressa vontade do povo brasileiro. O que a Folha de S. Paulo não faz, quando opta por um editorial que na verdade é um libelo contra a democracia ao desrespeitar a figura presidencial.”

É uma confissão de analfabetismo democrático desse aprendiz de Goebbels bolsonarista. Ele confunde democracia com majoritarismo. Segundo Fábio, porque Bolsonaro venceu por maioria, então não pode ser criticado pela imprensa. Criticar “a figura presidencial” é desrespeito? Só nas mais fechadas monarquias absolutistas, como a Arábia Saudita ou nas ditaduras mais violentas, como a Coréia do Norte, ainda aparece, em pleno século 21, um pensamento tão autocrático.

Pior. Ele insinua que a justa crítica da Folha, perseguida autoritariamente pelo chefe de governo, é equivalente à facada de que foi vítima o candidato. É inacreditável!

Anotem. Agora sabemos com quem estamos lidando. O jornalismo investigativo deve fazer um levantamento dos passos desse sujeito ainda durante a campanha, de como – alguns dizem, mas é preciso verificar – ele comprou a tecnologia Bannon de manipulação das mídias sociais e de como fez a ponte com as empresas de comunicação (como a Record, da Igreja Universal) que hoje viraram veículos chapa-branca.

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