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Observações sobre a entrevista de Pondé

Luiz Felipe Pondé concedeu ontem uma entrevista a André Jankavski da revista Exame. No geral, a entrevista é boa, do ponto de vista político, sobretudo neste exato momento da conjuntura nacional. Há, porém, sérios problemas de concepção, do ponto de vista da democracia. Vou interpolar minhas observações (em azul) no corpo do texto abaixo.

Bolsonaro é burro e governa como se estivesse em um churrasco, diz Pondé

Filósofo de direita critica o governo de Jair Bolsonaro e acredita que o presidente precisa mudar o tom — se não, um novo impeachment pode acontecer

Por André Jankavski, Exame, 23 maio 2019

Ao contrário dos filósofos e intelectuais que o presidente Jair Bolsonaro tanto critica, Luiz Felipe Pondé sempre se colocou à direita no espectro ideológico. Defensor de bandeiras liberais, tanto na economia quanto nos costumes, o filósofo e escritor brasileiro era comumente criticado por seus pares por defender um Estado menor e a economia de mercado.

Para ele, o liberalismo “dentro de todas as políticas econômicas, é a que parece menos ruim”. O filósofo, no entanto, não está nem um pouco satisfeito com o governo de direita de Bolsonaro, que vem se afastando cada vez mais do perfil liberal que prometera durante as eleições. E parte da culpa dessa instabilidade, para o filósofo, é do seu companheiro de profissão, Olavo de Carvalho.

Não por acaso, Pondé acredita que Bolsonaro tem potencial de ser uma liderança nacional populista, aos mesmos moldes do primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, e do vice-primeiro ministro italiano Mateo Salvini. Quer dizer, existe um obstáculo: para o filósofo, Bolsonaro é burro.

“Ele é burro. Pode escrever isso. Ele é burro, segue um intelectual paranoico e se deixa influenciar pelos filhos que não entendem nada de sociedade e de convívio democrático”, diz Pondé.

O melhor caminho para se tomar, segundo ele, é uma conversa mais madura entre todo o espectro político, deixando a radicalização de lado. “A política é a capacidade de conviver com o que você não concorda. Não é conviver com o que você concorda”, afirma ele, que recebeu a reportagem de EXAME em seu escritório, em São Paulo.

Se Bolsonaro não entender isso, de acordo com Pondé, um impeachment pode se tornar um caminho possível. Confira, a seguir a sua entrevista:

Como o senhor avalia o atual momento da direita? Ela está se dividindo?

Durante as eleições, houve uma convergência de pessoas de várias direitas que não gostariam que o PT voltasse ao poder. E isso aconteceu por todas as razões do mundo. O partido tinha se transformado em uma gangue que estava roubando o Estado de forma sistemática. Além disso, a nova matriz econômica da ex-presidente Dilma Rousseff destruiu a economia. Depois das eleições, o gradiente da direita ficou evidente. Há aqueles reacionários, que tem um conservadorismo moral ligado ao Olavo de Carvalho, os evangélicos, os militares e os liberais.

Sim, são vários reacionários e poucos conservadores ou liberais-conservadores (como Pondé) – ainda que a distinção entre conservadores e reacionários seja impossível do ponto de vista teórico (ver minha observação final). Não são só estes que ele citou. A seita bolsonarista é uma sopa bacteriana com muitos ingredientes: olavistas (antiglobalistas, anticomunistas macarthistas, nacionalistas-populistas tipo Steve Bannon), monarquistas-tradicionalistas, católicos ultraconservadores (tipo TFP), hierarcas ocultistas et coetera.

Qual é a sua opinião sobre o papel de Olavo de Carvalho no governo?

Ele é uma péssima influência para o governo e ao país. É um intelectual, sem dúvida nenhuma, com repertório mesmo que constituído informalmente. Mas ele se transformou em um elemento desestabilizador. O Olavo é completamente paranoico e conspiratório. Sempre criou ciclos assim. Essa direita mais próxima do Bolsonaro, chamada de ideológica, é um grupo desorientado mentalmente e intelectualmente.

Correto. Mas os demais grupos – além do olavista – que compõem o governo Bolsonaro (os militares, os liberais-econômicos que não são suficientemente liberais-políticos, os lavajatistas e os evangélicos) também não são liberais no sentido político do termo, quer dizer, democratas.

Há discussões da falta de coesão de pensamentos entre os liberais e os conservadores e isso está ficando evidente na prática. O senhor enxerga a possibilidade de existir uma sintonia maior entre os dois grupos?

Acredito que não. É mais fácil existir um alinhamento dos militares com a direita do Paulo Guedes. E isso apesar dos militares brasileiros não terem uma tradição liberal, como é o caso dos chilenos. O grupo formado por seguidores do Olavo e do Bolsonaro não tem entendimento da realidade. O presidente governa o país como se estivesse na varanda fazendo churrasco e gritando com os filhos. Por isso, é muito difícil manter a convergência a médio e longo prazo.

O lado conservador do presidente não permite essa convivência no longo prazo?

Não é por isso. Durante dois mandatos, o ex-presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan, conseguiu sustentar uma parceria entre o movimento evangélico americano e a escola liberal, que ele representava.

Bolsonaro não tem, propriamente, um lado conservador (como se poderia dizer de Winston Churchill, Ronald Regan e Margaret Thatcher) e sim um lado reacionário (que não é bem um lado: ele é, em tudo, reacionário).

Mas o Bolsonaro não faz isso por que não quer ou por que não consegue?

Porque ele é burro. Pode escrever isso. Ele é burro, segue um intelectual paranoico e se deixa influenciar pelos filhos que não entendem nada de sociedade e de convívio democrático. Não é, a priori, o conservador de costume que inviabiliza uma economia liberal. A prova é, como eu disse, os Estados Unidos dos anos 80. Porém, pode ser que eu esteja errado e que daqui a seis meses eu perceba que havia uma estratégia ou que ele se perdeu, mas depois se encontrou.

Neste momento, no entanto, a impressão que temos é que ele está destruindo o governo. Parece que ele não percebe que há uma relação entre estabilidade política e econômica. Ninguém vai comprar uma televisão em 15 vezes se o país estiver em uma guerra civil. Qualquer criança de 12 anos sabe disso.

A questão não parece ser bem se um conservador nos costumes inviabiliza ou não uma economia liberal e sim se um reacionário (em tudo) pode permitir uma política liberal. Economias liberais podem ser implantadas na Singapura atual ou no Chile de Pinochet (que são regimes i-liberais).

Mas como fica a direita nessa história? Depois de tanto tempo adormecida, Bolsonaro está fazendo a direita mais forte por estar no poder ou essas instabilidades trazem uma visão negativa do movimento?

É necessário analisar todo o processo. Em um primeiro momento, a possibilidade de Bolsonaro realizar um governo mais liberal economicamente é baixa. Não tem que ficar perseguindo transexual, isso é coisa de idiota. É necessário desenraizar uma máquina que parte do PT montou, e acredito que não tenha sido todo o partido, para espoliar o Estado.

Durante as eleições, a resposta para essa pergunta seria que era um bom momento para a direita e que seria possível colocar em prática uma economia de mercado mais livre, com reforma tributária e menos lei trabalhista que destrói na economia. A reforma da Previdência é um símbolo disso. E o descaso com que o Bolsonaro trata esse tema mostra que ele não entende nada de país e nem de sociedade. Neste momento, o Bolsonaro está fazendo mal à direita.

Sim, Bolsonaro é a extrema-direita, não a direita intelectual (mas as ameaças que existem hoje à democracia vêm dos populismos-autoritários, todos de extrema-direita). Ou seja, o que existe hoje não é Reagan, não é Thatcher e sim Orban, Erdogan, Salvinni, Duda, Le Pen. Mas, novamente, a questão não é “uma economia de mercado mais livre”: isso é desejável, por certo, mas não garante uma política liberal, quer dizer, democratizante.

Qual é a sua visão sobre o nacional populismo, encarnado por figuras como o primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán e o vice-primeiro-ministro italiano Matteo Salvini?

Por acaso, voltei da Hungria recentemente. Lá, eu vi que os húngaros são felizes. A economia está crescendo e, quando isso ocorre, todo mundo fica feliz. Por isso, Orbán conseguiu desmantelar o Supremo Tribunal, a oposição e a própria mídia independente.

Muitos querem chamar o nacional populismo de fascismo, mas é diferente. O primeiro chega ao poder por meio de eleições e não destrói necessariamente o arcabouço da democracia, mas coloniza a democracia destruindo o sistema de pesos e contrapesos.

Sim, o populismo-autoritário de Orbán não é fascismo, porém é i-liberal e pretende destruir a democracia por dentro, pouco a pouco, não através de um putsch de cervejaria. Isso, entretanto, ameaça muito mais o processo de democratização do que se fosse uma reedição do fascismo (que não tem mais lugar no mundo contemporâneo).

Alguns intelectuais colocam o presidente Bolsonaro como parte desse movimento. Qual é a sua opinião?

Acredito que ainda é precoce dizer isso. A capacidade de gestão dele faz com que ele tenha mais dificuldade. Se ele entendesse que estabilizar a economia fosse algo importante, talvez ele tivesse uma trajetória parecida com a do Orbán. Mas a minha suspeita de que ele seja burro e inepto é porque ele parece não entender que, mesmo que ele queira por em prática um sistema nacional populista, ele teria que fazer a economia crescer.

Aí sim, ele poderia colocar em prática o que eu considero uma tragédia no sistema político. Ainda que a Hungria esteja crescendo agora, em algum momento vai dar problema. O problema do regime autoritário é que, para continuar sendo autoritário, precisa ser cada vez mais autoritário.

Não é precoce: o risco é iminente. E os liberais-econômicos não são nenhuma garantia de que isso não vai acontecer. Como disse o Reinaldo Azevedo num tweet de 18/05/2019, “alguns dos nossos liberais estão prontos para entrar no século 19: apostam no bonapartismo para emplacar suas teses… liberais”. 

Mas o senhor acredita que o Bolsonaro pode enveredar para esse lado?

É cedo pela minha suspeita de ele não ser inteligente o suficiente para isso. Além disso, ele também está há pouco tempo no poder. Ele tem um discurso próximo. Mas o Brasil tem características diferentes. Por exemplo, não temos problemas com imigração. E, por aqui, não temos um racismo tão agressivo como na Hungria – apesar de existir racismo, sim.

A Hungria não é o único exemplo. Os bolsonaristas são, em sua maioria, agentes do populismo-autoritário, ora em ascensão no mundo e, em menor parte, outros representantes exóticos da extrema-direita fascistoide. A colagem abaixo mostra seus principais líderes populistas-autoritários, na Europa (incluindo a Turquia) e nas Américas (em ordem alfabética): Anders Vistisen, Andrej Babis, Donald Trump, Geert Wilders, Gyöngyösi Márton, Heinz-Christian Strache, Jaroslaw Kaczynski, Jair Bolsonaro, Jörg Meuthen, Marine Le Pen, Matteo Salvini, Nigel Farage, Olli Kotro, Recep Erdogan, Santiago Abascal, Steve Bannon, Tomio Okamura, Viktor Orbán, Vlaams Belang. (Não estão incluídos aqui os euro-asiáticos como Vladimir Putin e os asiáticos, como Rodrigo Duterte).

Como o senhor enxerga o futuro das reformas e do próprio governo? O presidente vem recebendo críticas de especialistas e de congressistas de que não se engaja na aprovação de reformas importantes.

Ele não se engaja porque não entende que é importante. Bolsonaro prefere falar que Olavo de Carvalho é ícone. Ícone para quem? Só se for para paranoicos agressivos. Se Fernando Haddad tivesse ganhado a eleição, a minha expectativa agora seria a mesma da atual: estabilização da economia. Então, eu não estou torcendo contra o Bolsonaro. Torcer contra ele agora, ainda é torcer contra o Brasil.

Mas em um momento pode deixar de ser. Espero que Bolsonaro, até o fim do semestre, entenda que ele é uma instituição e não o papai do Carlos ou o fã do Olavo. Ele é o presidente da República e, portanto, deve conduzir as reformas, negociar com o Congresso e fazer o trabalho que um presidente faz. O ex-presidente Michel Temer estava fazendo isso antes dele. Bolsonaro está criando uma saudade do Temer nesse aspecto.

Pode-se nutrir tal esperança, mas tudo indica que é vã. Bolsonaro já deu mostras suficientes de que não será desasnado pelo establishment (aliás, o projeto olavo-bolsonarista é antiestablishment). Uma preocupação: nenhum projeto antidemocrático avançou, em qualquer lugar do mundo ou época da história, sem a vacilação, a leniência e a conivência de uma porção de intelectuais que diziam: “não é bem assim”, “o aprendiz de tirano será controlado pelo sistema”, “nossas instituições estão funcionando e vão colocá-lo no lugar”.

O senhor enxerga outros cenários?

Tendo em vista o atual momento, há outras três possibilidades. Uma delas é os militares, que funcionam como fiadores do governo, saírem. Os militares nunca viram o Bolsonaro como um deles. Ele é muito mais baixo clero do Congresso do que militar. Essa história de ele ser militar é um marketing que ele construiu e que está ficando mais claro que é falso. Então, os militares aderiram ao Bolsonaro para parar o PT. Também vejo a possibilidade do Paulo Guedes ficar de saco cheio e sair do governo.

Dessa maneira, o Brasil entraria em uma espiral de instabilidade econômica gigantesca. Se isso acontecer, podemos assistir a um novo impeachment. Isso seria terrível para o país. A última seria o presidente virar uma espécie de rainha da Inglaterra, que será colocado de canto e que ninguém mais levará a sério. Aí de vez em quando ele vai xingar alguém nas redes sociais, comentar de “golden shower” com o filho dele e assim vai indo.

Sim, porém mais terrível para o país seria Bolsonaro conseguir implantar seu projeto populista-autoritário e i-liberal.

Estamos vivendo em um país cada vez mais radicalizado, à esquerda e à direita. O senhor acredita que essa divisão continuará por bastante tempo?

No momento, na minha opinião, a esquerda não existe. E ela não existe porque Ciro Gomes, que seria o nome mais interessante, é boicotado pelo PT, que ainda luta para tirar Lula da cadeia. É um surto psicótico. O PSOL, que reúne alguns nomes mais próximos da intelectualidade, como o Guilherme Boulos, que é um sujeito preparado e capaz, marca traço de audiência. O PSOL precisaria de um milagre.

Tendo em vista o início em que ele era muito desacreditado, a eleição de Bolsonaro à presidência pode ser considerada um milagre?

Não. Bolsonaro representa um grupo que se sentiu excluído por muito tempo. O conservadorismo de costumes tem uma importância grande no país. Além disso, a população foi ficando de saco cheio dos excessos da esquerda e das discussões inúteis, como ideologia de gênero.

Quando eu digo inútil é no sentido estatístico, não para quem sofre com o problema. As mídias sociais fizeram Jair Bolsonaro acontecer. E contou com uma incompetência da oposição. O PSDB, por exemplo, é um partido péssimo de 15 caciques e dois índios. É um partido de salto alto.

As mídias sociais são um espelho do atual momento de radicalismo. O senhor acredita que, em algum momento, esse conflito tende a ser amenizado?

As pessoas, na maior parte do seu dia a dia, tendem ao centro. Elas só radicalizam quando estão sofrendo demais. Se tivermos um equilíbrio econômico no país, os radicais perdem espaço. As mídias sociais sempre serão uma ferramenta de instabilidade, de marketing político e sempre terão notícias falsas. As pessoas usam essas notícias falsas quando gostam e quando é conveniente. Elas não ligam para fonte.

Está faltando conversa entre as partes? Ao mesmo tempo, os mais extremistas estão relutando qualquer tipo de contato com o espectro político contrário.

A estabilidade mental política precisa de um diálogo ao centro. A política é a capacidade de conviver com o que você não concorda. Não é conviver com o que você concorda. Isso é prova de que o Bolsonaro não entende nada. E eu acho que a polarização tende a continuar por mais de quatro anos. Acho bem difícil que as eleições de 2020 e 2022 não sigam o mesmo caminho. Muito por culpa do governo Bolsonaro, isso se ele não acertar o passo.

Ora, se a polarização vai continuar por mais quatro anos, a estabilidade política estará inexoravelmente comprometida, mesmo que se obtenha resultados econômicos. A economia não determina o que vai acontecer na política, como ainda creem os marxistas e os anti-marxistas, como os seguidores de doutrinas do liberalismo-econômico.

O senhor sempre se colocou como um liberal. Ao mesmo tempo, o movimento é visto como pouco preocupado com questões como a justiça social. Qual é a sua percepção desse movimento atualmente?

O movimento tem que amadurecer, como todos os outros. O socialismo, por exemplo, está aprendendo a amadurecer na porrada porque não deu certo em nenhum lugar. Toda a percepção de mundo tem que amadurecer. Mas quando eu me identifico com o universo liberal é porque, dentro de todas as políticas econômicas, é a que me parece menos ruim. Não sou anarcocapitalista, por exemplo. Porém, para se ter justiça social, é necessário equilíbrio fiscal. E para isso, são necessários princípios liberais de administração do Estado. Não se faz justiça social quebrando o Estado.

Não se sabe se existe um “movimento” liberal no Brasil. O que existe, certamente, é um deficit de liberais (não apenas no sentido econômico do termo, mas sobretudo no sentido político). Políticas econômicas liberais não definem nenhum movimento liberal.

Às vezes, a esquerda é cega porque ela quer ser ou porque simplesmente não quer enxergar uma realidade. Assim como a direita liberal pode ser cega ao não levar em conta toda uma gama de elementos de mal estar que o capitalismo causa nas pessoas. Ser competente e eficaz o tempo inteiro causa problemas psicológicos nas pessoas, desvinculação familiar, entre outros.

Uma observação final. Captar o genos da democracia não é trivial. Dificilmente o sentido desse modo de regulação de conflitos poderá ser perfeitamente percebido sem que se examine as diferenças entre platonismo e protagorismo.

Karl Popper (1945) sacou perfeitamente o que há de fundamental nessa diferença. Na nota 7 ao capítulo 5 do primeiro volume de A Sociedade Aberta e seus Inimigos ele escreveu:

“A diferença entre platonismo e protagorismo talvez possa ser assim expressa em resumo:

Platonismo | Há uma ordem de justiça “natural” inerente ao mundo, isto é, a ordem original ou primeira em que a natureza foi criada. Assim, o passado é bom e qualquer desenvolvimento que leva a novas normas é mau.

Protagorismo | O homem é o ser moral neste mundo. A natureza não é moral nem imoral. Assim, é possível ao homem melhorar as coisas”.

Os que se dizem conservadores deveriam mergulhar no assunto. Russell Kirk (1993), por exemplo, nos seus “Dez princípios conservadores”, escreveu o seguinte:

“Primeiramente, o conservador acredita que existe uma ordem moral duradoura. Que a ordem está feita para o homem, e o homem é feito para ela: a natureza humana é uma constante, e as verdades morais são permanentes.

A palavra ordem significa harmonia. Há dois aspectos ou tipos de ordem: a ordem interna da alma, e a ordem exterior da comunidade. Há vinte e cinco séculos, Platão ensinou esta doutrina, mas mesmo os letrados de hoje em dia encontram dificuldades em compreender. O problema da ordem tem sido uma preocupação central dos conservadores desde que o termo conservador passou a fazer parte da política”.

Ora, Platão não era nem conservador e sim retrogradador (reacionário). Sua utopia era uma retropia, uma tentativa de voltar ao Estado perfeito ideal, que era uma autocracia rigorosa (e como não se tinha acesso a esse Estado, teceu uma narrativa para enaltecer o regime ditatorial de Esparta – que, segundo ele, estava mais próximo do modelo não corrompido pelo fluxo temporal que degenera todas as coisas à medida que elas se afastam da sua origem). Aqui já reconhecemos alguns traços das filosofias da corrupção.

Sustento que é impossível estabelecer uma separação clara entre conservadorismo e reacionarismo. E que o ódio dos que querem se dizer conservadores aos sofistas (como Protágoras) nunca passou, na verdade, de um ódio à democracia.

Com pouca gente ou muita gente, a manifestação chapa-branca de 26 de maio será péssima para o país

Comentários a ‘O Fascínio de Platão’ de Karl Popper – Capítulos 1 e 2