Vamos usar a (inevitável nestas circunstâncias) linguagem metafórica. Há, sim, um vírus solto no mundo. Ele está para os memes (no sentido original do termo, inventado por Richard Dawkins em 1976) assim como o coronavírus (e outros vírus propriamente ditos) está para os genes.
Ele infecta as mentes, essas nuvens de computação, lato sensu, que não se confundem propriamente com os cérebros. Esse vírus – que deriva da cepa dos populismos, sobretudo do populismo-autoritário – tem como efeito impedir a continuidade dos processos de democratização.
O problema é que não há anticorpos suficientes nas populações para neutralizá-lo.
A conclusão é simples. Não adianta descrever a situação e travar uma luta contra os agentes contaminadores que portam esse vírus. Temos que produzir rapidamente os anticorpos democráticos necessários. Constituir ambientes de aprendizagem da democracia tornou-se crucial, o principal imperativo na obscura época em que vivemos.
Não existe uma fórmula, mas se existisse ele seria simples. Não é necessário converter (no sentido de evangelizar) a maioria da população à democracia. Bastam alguns agentes que, ao aprenderem a reconhecer padrões autocráticos em todos os lugares em que eles se manifestam (não apenas na política ou no Estado), viram agentes de “descontaminação”.
Os democratas sempre foram e sempre serão minoria. Uma massa crítica de pessoas que conseguem fazer isso – desaprender autocracia – já se constitui como uma verdadeira fábrica desses anticorpos.
A democracia não é a luz de um holofote e sim a de miríades de pequenas velas. Na verdade, as pessoas (quer dizer, não os indivíduos, mas os clusters de aprendizagem democrática que se formam), vão vacinando as demais em um processo de rede (sim, os “antivírus” também se espalham segundo uma dinâmica “epidemiológica”).
Os democratas atuam como agentes fermentadores do processo de formação de uma opinião pública democrática, que é o que importa.
Este artigo será expandido mais tarde.