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Por que o vale-tudo não ajuda a democracia

A disputa atual é irritante porque não é propriamente uma campanha eleitoral onde se confrontam propostas. É uma guerra suja onde o vale-tudo é lavado pela necessidade de remover o demônio 1 ou evitar a volta do demônio 2.

Até agora a diferença entre os dois candidatos é de 3,55 (média dos agregadores Estadão e PollsterGraph). Será preciso uma hecatombe para alterar esse quadro e ela deverá acontecer hoje, amanhã, quinta, sexta ou sábado. Não basta dizer que foi Bolsonaro que mandou Roberto Jefferson matar policiais federais ou que há uma ditadura do judiciário, comandado por Alexandre de Moraes, a serviço de Lula.

Situação difícil. O Ipec até que está tentando ajudar, apurando uma diferença fora de curva de 7 pontos a favor de Lula, mas não tem jeito (nem o comando da campanha petista deve colocar muita fé nesse tipo de resultado).

São outras, porém, as diferenças que temos em mente. As diferenças entre os democratas que votam em Lula para remover Bolsonaro e os capturados pelo vale-tudo (para os quais os fins justificam os meios). Essas diferenças deveriam ser de simples entendimento, se nosso analfabetismo democrático não fosse tão profundo e generalizado:

1 – Nós, os democratas que votamos em Lula para remover Bolsonaro, não achamos que “guerra é guerra” e que, portanto, vale-tudo pela causa. Achamos que a democracia é sem-guerra e que os meios qualificam os fins. Em outras palavras: não somos carluxos, nem janones.

2 – Nós, os democratas que votamos em Lula para remover Bolsonaro, não fingimos que não vemos que um tribunal está se equivocando ao querer virar polícia do pensamento.

3 – Nós, os democratas que votamos em Lula para remover Bolsonaro, não deixamos de fazer críticas aos métodos (e amostragens) discutíveis de pesquisas eleitorais só porque beneficiam nosso candidato.

4 – Nós, os democratas que votamos em Lula para remover Bolsonaro, não achamos correto grandes meios de comunicação profissionais entrarem de corpo e alma na campanha e virarem, para todos os efeitos práticos, comitês eleitorais de um candidato.

Tudo isso causa revolta em muitos setores da sociedade que não são bolsonaristas e são capazes de entender o que está acontecendo. Por isso, o vale-tudo não ajuda a democracia. Nem no curto prazo (porque o desespero para remover Bolsonaro de qualquer jeito pode ter efeito contrário no dia 30), nem nos médio e longo prazos (porque insuflará uma guerra civil fria de longa duração no país).

Meu papel neste segundo turno de 2022 tem sido dizer. Não vote em Bolsonaro. Não vote nulo. Não vote em branco. VOTE EM LULA porque é a única via para remover Bolsonaro. Mas não diga amém ao PT, não beatifique Lula, nem ajude o partido a lavar sua reputação e reconquistar sua hegemonia.

Por que? Porque haverá forte resistência antidemocrática a essas pretensões hegemonistas do PT e isso alimentará a guerra em vez de pacificar o ambiente político e social.

De qualquer modo, é preciso virar logo essa página e encarar o grande desafio que está posto diante de nós. Como fazer, simultaneamente, oposição democrática ao populismo-autoritário bolsonarista fora do governo e ao neopopulismo lulopetista no governo. Ou vice-versa.


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