Decreto publicado em março de 2023, aqui copiado na íntegra, com as novas diretrizes do Kremlin em seu site do Ministério Relações Exteriores da Rússia.
Oportunamente vamos comentar essa doutrina neo-imperial (eurasianista) da ditadura russa.
Note-se – no artigo 58 – o lugar de destaque reservado ao Brasil, junto com as ditaduras cubana, venezuelana e nicaraguense. “Reforçar a amizade e compreensão mútua e aprofundar a parceria multifacetada e mutuamente vantajosa com a República Federativa do Brasil, República de Cuba, República da Nicarágua, República Bolivariana da Venezuela, desenvolver as relações com outros países latino-americanos, em função do quão independente e construtiva é a sua política para a Federação da Rússia” (1).
Note-se ainda – no artigo 13 – que a Ucrânia não é citada como nação independente. “Considerando o fortalecimento da Rússia como um dos principais centros de desenvolvimento do mundo contemporâneo, considerando a sua política externa independente uma ameaça à hegemonia ocidental, os Estados Unidos da América (EUA) e os seus satélites utilizaram as medidas tomadas pela Federação da Rússia para proteger os seus interesses vitais na vertente ucraniana como pretexto para endurecer a política antirrussa de longa data e desencadear uma guerra híbrida de um novo tipo. O seu objetivo é enfraquecer a Rússia por todos os meios e torpedear o seu papel civilizacional criador, o seu poder, as suas capacidades económicas e tecnológicas, limitar a sua soberania na política externa e interna e destruir a sua integridade territorial”.
Note-se, por último, – no artigo 19 – que aos BRICS é atribuído um papel eminentemente político: na “adaptação da ordem mundial às realidades de um mundo multipolar”.
A versão original do documento pode ser encontrada no link abaixo:
https://mid.ru/en/foreign_policy/fundamental_documents/1860586/?lang=pt
Conceito de Política Externa da Federação da Rússia (aprovado pelo Presidente da Federação da Rússia, Vladimir Putin, a 31 de março de 2023)
Aprovado
Pelo Decreto do Presidente da Federação da Rússia nº 229, de 31 de março de 2023
Conceito de política externa da Federação da Rússia
I. Disposições gerais
1. O presente Conceito é um documento de planeamento estratégico e representa um sistema de pontos de vista sobre os interesses nacionais da Federação da Rússia na área da política externa, assim como os princípios básicos, objetivos estratégicos, principais tarefas e áreas prioritárias da política externa da Federação da Rússia.
2. Este Conceito baseia-se na Constituição da Federação da Rússia, princípios e normas do direito internacional universalmente aceites, tratados internacionais da Federação da Rússia, leis federais e outros atos normativos legais da Federação da Rússia que regulamentam as atividades dos órgãos federais do poder estatal na área da política externa.
3. Este Conceito especifica algumas disposições da Estratégia de Segurança Nacional da Federação da Rússia e tem em conta as principais disposições de outros documentos de planeamento estratégico referentes às relações internacionais.
4. Mais de um milhar de anos de condição de Estado independente, o património cultural das épocas anteriores, as profundas ligações históricas com a cultura tradicional europeia e outras culturas da Eurásia, e a capacidade, adquirida ao longo de muitos séculos, de garantir uma coexistência harmoniosa num território comum de vários povos, grupos étnicos, religiosos e linguísticos definem a situação especial da Rússia como Estado-Civilização singular, como vasta potência euro-asiática e euro-pacífica que uniu o povo russo e outros povos que constituem conjuntamente uma comunhão cultural e civilizacional do Mundo Russo.
5. O lugar da Rússia no mundo é determinado pelos seus recursos significativos em todas as esferas da vida, o seu estatuto de membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU), de participante nas principais organizações e associações internacionais, de uma das duas maiores potências nucleares e de Estado sucessor dos direitos (sucessor legal) da URSS. Dada a sua contribuição decisiva para a vitória na Segunda Guerra Mundial, bem como o seu papel ativo no estabelecimento do atual sistema de relações internacionais e na eliminação do sistema mundial de colonialismo, a Rússia atua como um dos centros soberanos do desenvolvimento mundial, cumprindo a sua missão historicamente única de manter o equilíbrio global de forças, construir um sistema internacional multipolar, criar condições para um desenvolvimento pacífico e progressivo da humanidade com base numa agenda unificadora e construtiva.
6. A Rússia segue uma política externa independente e multivetorial, regendo-se pelos seus interesses nacionais e pela compreensão da sua responsabilidade especial pela manutenção da paz e da segurança a nível global e regional. A política externa da Rússia é pacífica, aberta, previsível, coerente e pragmática e baseia-se no respeito pelos princípios e normas do direito internacional universalmente aceites, visando uma cooperação internacional em pé de igualdade com vista à solução de desafios comuns e à promoção de interesses comuns. A atitude da Rússia para com outros países e associações interestatais depende da natureza construtiva, neutra ou hostil das políticas dos mesmos para a Federação da Rússia.
II. O mundo contemporâneo: principais tendências e perspectivas de desenvolvimento
7. A humanidade está a passar por uma época de mudança revolucionária. A formação de um mundo mais justo e multipolar continua. O modelo desequilibrado de desenvolvimento mundial que, durante séculos, permitiu às potências coloniais desenvolver-se economicamente de forma mais acelerada à custa da apropriação dos recursos dos territórios e países dependentes na Ásia, África e no Hemisfério Ocidental, está a tornar-se coisa do passado e não voltará mais. A soberania e a competitividade das potências mundiais extra-ocidentais e dos líderes regionais está a reforçar-se. A reestruturação da economia mundial, a sua colocação numa nova base tecnológica (incluindo aplicação prática da inteligência artificial, das tecnologias de informação e comunicação mais avançadas, das tecnologias energéticas, biológicas e nanotecnologia), o crescimento da consciência nacional, a diversidade cultural e civilizacional e outros fatores objetivos aceleram o processo de redistribuição do potencial de desenvolvimento a favor de novos centros de crescimento económico e influência geopolítica, contribuindo para a democratização das relações internacionais.
8. No entanto, as mudanças em curso, que são, de modo gera, favoráveis, não são aceites por alguns países que estão habituados a pensar em termos de domínio global e neo-colonialismo. Eles não querem aceitar as realidades de um mundo multipolar e a buscar acordo sobre os parâmetros e princípios da ordem mundial neste contexto. Estão a tentar conter o curso natural da história, eliminar concorrentes nas áreas político-militar e económica e suprimir a dissidência. Estão a utilizar uma vasta gama de instrumentos e métodos ilegais, entre os quais medidas coercivas (sanções) sem consultar o Conselho de Segurança da ONU, a provocação de golpes de Estado e de conflitos armados, ameaças, chantagem, manipulação da consciência de alguns grupos sociais e povos inteiros, operações ofensivas e subversivas no espaço de informação. A imposição de atitudes ideológicas neoliberais destrutivas e contrárias aos valores espirituais e morais tradicionais é um método correntemente utilizado para interferir nos assuntos internos dos países soberanos. Como consequência, a influência destrutiva estende-se a todas as esferas das relações internacionais.
9. A ONU e outras instituições multilaterais estão a ser muito pressionadas, sendo o seu papel de fóruns de alinhamento de interesses das principais potências artificialmente desvalorizado. O sistema jurídico internacional está a ser submetido ao teste de força: um pequeno grupo de países está a tentar substituí-lo por um conceito de ordem mundial baseada em regras (regras, padrões e normas que foram elaborados sem a participação igual de todos os países interessados). Estão a ser dificultados os trabalhos para a elaboração de respostas coletivas aos desafios e ameaças transnacionais como o tráfico ilícito de armas, a proliferação de armas de extermínio em massa e dos seus vetores, agentes patogénicos perigosos e doenças infecciosas, a utilização de tecnologias de informação e comunicação para fins ilícitos, o terrorismo internacional, o tráfico ilícito de estupefacientes, substâncias psicotrópicas e dos seus precursores, o crime organizado transnacional e a corrupção, as calamidades de origem natural ou tecnológica, a migração ilegal, a degradação do meio ambiente. A cultura do diálogo nas relações internacionais está a deteriorar-se, diminuindo a eficácia da diplomacia como meio de resolução pacífica de conflitos. Verifica-se uma falta de confiança e de previsibilidade nos assuntos internacionais.
10. A crise da globalização económica vem-se agravando. Os problemas existentes, inclusive aqueles que existem no mercado da energia e no sector financeiro, devem-se à degradação de muitos modelos e instrumentos de desenvolvimento anteriores, às decisões macroeconómicas irresponsáveis (entre as quais as emissões não controladas e acumulação de dívidas não lastreada), medidas restritivas unilaterais ilegítimas e à concorrência desleal. O facto de alguns países abusarem da sua posição dominante nalgumas áreas fomenta os processos de fragmentação da economia global e as desigualdades no desenvolvimento dos países. Novos sistemas de pagamento nacionais e transfronteiras estão a ganhar forma, há um interesse crescente em novas moedas de reserva internacionais e estão a surgir motivos para a diversificação dos mecanismos de cooperação económica internacional.
11. O papel do fator-força nas relações internacionais está a aumentar, o espaço de conflito está a expandir-se nalgumas regiões estrategicamente importantes. A acumulação desestabilizadora, a modernização das capacidades militares ofensivas e a destruição do sistema de tratados de controlo de armamento estão a minar a estabilidade estratégica. A utilização da força militar em violação do direito internacional, a exploração do espaço exterior e do espaço de informação como novas áreas de ações militares, o esbatimento da distinção entre meios militares e não militares de confrontação interestatal, o agravamento de conflitos armados de longa data em várias regiões aumentam a ameaça à segurança global, aumentam os riscos de confrontos entre grandes países e entre potências nucleares, e aumentam a possibilidade de escalada destes conflitos e da sua transformação numa guerra local, regionalou global.
12. Uma resposta lógica à crise na ordem mundial é reforçar a cooperação entre países que estão sujeitos a pressões externas. O processo de criação de mecanismos de integração e interação económica regionais e transregiões em vários domínios e de parcerias em diferentes formatos para a resolução de problemas comuns está a ganhar aceleração. Outras medidas (incluindo unilaterais) estão também a ser tomadas para proteger os interesses nacionais vitais. O elevado nível de interdependência, o alcance global e a natureza transnacional dos desafios e ameaças limitam as possibilidades de garantir a segurança, estabilidade e prosperidade de alguns países e alianças político-militares e comerciais e económicas. Só uma conjugação do potencial e dos esforços sinceros de toda a comunidade internacional, com base num equilíbrio de forças e interesses, permitirá encontrar uma solução eficaz para os numerosos desafios atuais e garantir o desenvolvimento progressivo e pacífico de grandes e pequenos países e da humanidade em geral.
13. Considerando o fortalecimento da Rússia como um dos principais centros de desenvolvimento do mundo contemporâneo, considerando a sua política externa independente uma ameaça à hegemonia ocidental, os Estados Unidos da América (EUA) e os seus satélites utilizaram as medidas tomadas pela Federação da Rússia para proteger os seus interesses vitais na vertente ucraniana como pretexto para endurecer a política antirrussa de longa data e desencadear uma guerra híbrida de um novo tipo. O seu objetivo é enfraquecer a Rússia por todos os meios e torpedear o seu papel civilizacional criador, o seu poder, as suas capacidades económicas e tecnológicas, limitar a sua soberania na política externa e interna e destruir a sua integridade territorial. Esta política do Ocidente ganhou uma dimensão abrangente e foi consagrada nas suas doutrinas. Esta não foi a escolha da Federação da Rússia. A Rússia não se considera a si própria inimiga do Ocidente, não se isola dele, nem tem intenções hostis para com ele e espera que, no futuro, os países da comunidade ocidental venham a aperceber-se da futilidade da sua política de confronto e das suas ambições hegemónicas, venha a ter em conta as complexas realidades de um mundo multipolar e venham a retomar a interação pragmática com a Rússia, guiados pelos princípios da igualdade soberana e do respeito pelos interesses uns dos outros. Nesta base, a Federação da Rússia está pronta para um diálogo e cooperação.
14. Em resposta às ações hostis do Ocidente, a Rússia pretende defender, por todos os meios ao seu alcance, o seu direito de existir e de se desenvolver livremente. A Federação da Rússia irá concentrar a sua energia criadora nas vertentes geográficas da sua política externa obviamente promissoras em termos de expansão da cooperação internacional mutuamente vantajosa. Uma maior parte da humanidade está interessada em ter relações construtivas com a Rússia e em que esta se reforce no cenário internacional como potência mundial influente, capaz de dar um contributo decisivo para a segurança global e o desenvolvimento pacífico dos países. Isto abre grandes oportunidades para as atividades bem sucedidas da Federação da Rússia no cenário internacional.
III. Interesses nacionais da Federação da Rússia em matéria de política externa, objetivos estratégicos e principais tarefas da política externa da Federação da Rússia
15. Atendendo às tendências a longo prazo da evolução da situação no mundo, a Federação da Rússia tem os seguintes interesses nacionais em matéria de política externa:
1) proteger o sistema constitucional, soberania, independência e integridade do sistema estatal e territorial da Federação da Rússia contra a influência estrangeira destrutiva;
2) manter a estabilidade estratégica e reforçar a paz e segurança internacionais;
3) reforçar os fundamentos jurídicos das relações internacionais;
4) proteger os direitos, liberdades e interesses legítimos dos cidadãos russos e defender as organizações russas contra as intromissões ilegais estrangeiras;
5) desenvolver um espaço de informação seguro, e proteger a sociedade russa contra a informação estrangeira e o impacto psicológico destrutivos;
6) preservar o povo russo, desenvolver o potencial humano, e melhorar a qualidade de vida e bem-estar dos cidadãos do país;
7) contribuir para o desenvolvimento sustentável da economia russa numa nova base tecnológica;
8) reforçar os valores espirituais e morais tradicionais russos, e preservar o património cultural e histórico do povo multinacional da Federação da Rússia;
9) proteger o meio ambiente, preservar e utilizar eficiente os recursos naturais e adaptá-los às alterações climáticas.
16. Regendo-se pelos interesses nacionais e prioridades nacionais estratégicas, a política externa da Federação da Rússia visa alcançar os seguintes objetivos estratégicos:
1) garantir a segurança e a soberania da Federação da Rússia em todas as esferas e a sua integridade territorial;
2) criar condições externas favoráveis ao desenvolvimento da Rússia
3) reforçar a posição da Federação da Rússia como um dos centros responsáveis, influentes e independentes do mundo moderno.
17. Os objetivos estratégicos da política externa da Federação da Rússia devem ser alcançados através da execução das seguintes tarefas principais:
1) criar uma ordem mundial mais justa e mais sustentável;
2) manter a paz e a segurança internacionais, a estabilidade estratégica, garantir a coexistência pacífica e desenvolvimento progressivo dos países e povos;
3) promover a elaboração de respostas multidisciplinares eficazes da comunidade internacional aos desafios e ameaças comuns, entre os quais conflitos e crises regionais;
4) desenvolver uma cooperação mutuamente vantajosa em pé de igualdade com países e associações internacionais construtivos, garantir o respeito pelos interesses russos por meio de mecanismos da diplomacia multilateral;
5) fazer frente às atividades antirrussas dos países estrangeiros e das suas associações, criar condições para o fim de tais atividades;
6) criar relações de boa vizinhança com os países vizinhos, contribuir para a prevenção e a eliminação dos focos de tensão e conflito nos seus territórios;
7) apoiar os aliados e parceiros da Rússia na promoção de interesses comuns, garantir a sua segurança e desenvolvimento sustentável, independentemente de terem sido ou não reconhecidos internacionalmente e de fazerem ou não parte de organismos internacionais;
8) despoletar e reforçar o potencial das associações regionais multilaterais e estruturas de integração das quais a Rússia faz parte;
9) reforçar a posição da Rússia na economia global, alcançar os objetivos de desenvolvimento nacional da Federação da Rússia, garantir a segurança económica, e realizar o potencial económico do Estado;
10) garantir os interesses da Rússia nos oceanos e mares, no espaço exterior e no espaço aéreo internacional;
11) criar uma percepção objetiva da Rússia no estrangeiro, reforçar a sua posição no espaço global de informação
12) aumentar a importância da Rússia no espaço humanitário global, reforçar a posição da língua russa no mundo, contribuir para a preservação no estrangeiro da verdade histórica e da memória do papel da Rússia na história mundial;
13) proteger de forma abrangente e eficaz os direitos, liberdades e interesses legítimos dos cidadãos e organizações russos no estrangeiro;
14) desenvolver relações com os compatriotas residentes no estrangeiro e prestar-lhes um apoio abrangente no exercício dos seus direitos e na proteção dos seus interesses, bem como na preservação da identidade cultural russa.
IV. Áreas prioritárias da política externa da Federação da Rússia
Criação de uma ordem mundial mais justa e mais sustentável
18. A Rússia aspira à criação de um sistema de relações internacionais que forneça segurança eficiente, preserve a identidade cultural e civilizacional e garanta igualdade de oportunidades de desenvolvimento para todos os países, independentemente da sua posição geográfica, da dimensão do seu território, do seu potencial demográfico, de recursos e militar, e do sistema político, económico e social. A fim de cumprir estes critérios, o sistema de relações internacionais deve ser multipolar e basear-se nos seguintes princípios:
1) igualdade soberana dos países, respeito pelo seu direito de escolher modelos de desenvolvimento, sistemas sociais, políticos e económicos;
2) rejeição da hegemonia nos assuntos internacionais;
3) cooperação baseada num equilíbrio de interesses e benefícios mútuos;
4) não-interferência em assuntos internos;
5) primado do direito internacional na regulação das relações internacionais, renúncia de todos os países a uma política de padrões duplos;
6) indivisibilidade da segurança global e regional;
7) diversidade de culturas, civilizações e modelos de organização social, recusa de todos os países em impor os seus modelos de desenvolvimento, sistemas ideológicos e de valores a outros países, apoio num ponto de referência moral e ética, comum a todas as religiões tradicionais e sistemas éticos seculares;
8) liderança responsável dos países líderes para assegurar condições estáveis e favoráveis de desenvolvimento tanto para si próprios como para outros países e povos;
9) papel primordial dos países soberanos na tomada de decisões referentes à manutenção da paz e segurança internacionais.
19. A fim de ajudar a adaptar a ordem mundial às realidades de um mundo multipolar, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) acabar com os rudimentos de domínio dos EUA e de outros países hostis nos assuntos mundiais, criar condições para que qualquer Estado renuncie às ambições neocoloniais e hegemónicas;
2) melhorar os mecanismos internacionais de segurança e desenvolvimento a nível global e regional;
3) restabelecer o papel da ONU como mecanismo central de coordenação para alinhar os interesses dos países membros da ONU e as suas ações no sentido de alcançar os objetivos da Carta da ONU;
4) reforçar o potencial e o papel internacional dos BRICS, da Organização de Cooperação de Xangai (OCX), da Comunidade de Estados Independentes (CEI), da União Económica Eurasiática (UEE), da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC), do RIC (Rússia, Índia, China) e de outras associações interestatais e organizações internacionais, bem como de mecanismos em que a Rússia tem participação significativa;
5) apoiar a integração regional e sub-regional através de instituições multilaterais amigáveis, plataformas de diálogo e associações regionais na Região Ásia-Pacífico, América Latina, África e Médio Oriente;
6) reforçar a sustentabilidade e desenvolvimento progressivo do sistema jurídico internacional;
7) garantir o acesso equitativo de todos os países aos benefícios da economia global e da divisão internacional do trabalho, bem como à tecnologia moderna com vista a um desenvolvimento igual e justo (e à solução dos problemas da segurança energética e alimentar global);
8) intensificar a cooperação em todas as áreas com os aliados e parceiros da Rússia, e coibição das tentativas dos países hostis de a obstruir;
9) consolidar os esforços internacionais destinados a assegurar o respeito e a proteção dos valores espirituais e morais universais e tradicionais (incluindo normas éticas comuns a todas as religiões mundiais), a neutralizar as tentativas de impor atitudes ideológicas pseudo-humanistas e outras neoliberais que fazem com que a humanidade abandone os princípios espirituais e morais tradicionais;
10) desenvolver um diálogo construtivo, parceria e enriquecimento mútuo de diferentes culturas, religiões e civilizações.
Primado do direito nas relações internacionais
20. Assegurar o primado do direito nas relações internacionais é um dos fundamentos de uma ordem mundial mais justa e mais sustentável e da manutenção da estabilidade global e da cooperação pacífica e frutuosa entre os países e as suas associações e um fator de diminuição da tensão internacional e de aumento da previsibilidade do desenvolvimento global.
21. A Rússia defende consistentemente o reforço das bases jurídicas das relações internacionais e cumpre conscienciosamente as suas obrigações jurídicas internacionais. Ao mesmo tempo, as resoluções dos organismos interestatais baseadas nas disposições dos tratados internacionais da Federação da Rússia, interpretadas de forma contrária à Constituição da Federação da Rússia, não se cumprem na Federação da Rússia.
22. O mecanismo de criação de normas jurídicas internacionais universais deve basear-se na livre vontade dos países soberanos, devendo ONU continuar a ser o principal fórum para o desenvolvimento progressivo e a codificação do direito internacional. A promoção do conceito de ordem mundial baseada em regras pode destruir o sistema jurídico internacional e ter outras consequências perigosas para a humanidade.
23. A fim de reforçar a estabilidade do sistema jurídico internacional, evitar a sua fragmentação e enfraquecimento e impedir a aplicação seletiva dos princípios e normas de direito internacional universalmente aceites, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) combater as tentativas de deturpar, rever e interpretar arbitrariamente os princípios do direito internacional consagrados na Carta das Nações Unidas, na Declaração, de 24 de outubro de 1970, sobre Princípios de Direito Internacional relativos às Relações Amistosas e à Cooperação entre países, em conformidade com a Carta das Nações Unidas;
2) desenvolver progressivamente, inclusive com base nas realidades de um mundo multipolar, e codificar o direito internacional, em particular através de esforços sob os auspícios da ONU, bem como assegurar a participação do maior número possível de países nos tratados internacionais da ONU e a sua interpretação e aplicação uniformes;
3) consolidar os esforços dos países que defendem a restauração do respeito universal pelo direito internacional e o reforço do seu papel como base das relações internacionais;
4) acabar com a prática de medidas coercivas unilaterais ilegais nas relações internacionais, ao arrepio da Carta das Nações Unidas;
5) melhorar o mecanismo de sanções internacionais, entendendo que é da competência exclusiva do Conselho de Segurança das Nações Unidas impor tais medidas e que é necessário garantir a sua eficácia em termos de manutenção da paz e segurança internacionais e evitar a deterioração da situação humanitária;
6) intensificar o processo de registo legal internacional da fronteira nacional da Federação da Rússia e das fronteiras das suas zonas marítimas em que a Rússia exerce direitos de soberania e jurisdição, regendo-se pela necessidade de salvaguardar incondicionalmente os seus interesses nacionais, a importância de reforçar as relações de boa vizinhança, confiança e cooperação com os países vizinhos.
Reforço da paz e segurança internacionais
24. A Federação da Rússia considera que a segurança internacional (em termos globais e regionais) é indivisível e esforça-se por torná-la igual para todos os países com base no princípio da reciprocidade. Neste contexto, a Rússia está aberta a uma ação conjunta para formar uma arquitetura de segurança internacional atualizad e mais estável com todos os países e organizações interestatais interessadas. A fim de manter e reforçar a paz e a segurança internacionais, a Federação da Rússia pretende dar uma atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) utilizar meios pacíficos, principalmente a diplomacia, negociações, consultas, mediação e bons ofícios, para resolver disputas e conflitos internacionais com base no respeito mútuo, compromisso e equilíbrio de interesses legítimos;
2) promover uma ampla cooperação para neutralizar as tentativas de quaisquer países e associações interestatais de alcançar o domínio militar global, projetar o seu poder para além da sua área de responsabilidade, usurpar a responsabilidade primária pela manutenção da paz e segurança internacionais, traçar linhas divisórias e fornecer a segurança a alguns países em detrimento dos interesses legítimos de outros países. Estas tentativas não são conformes com o espírito, objetivos e princípios da Carta das Nações Unidas e ameaçam as gerações presentes e futuras de conflitos regionais e uma guerra mundial;
3) intensificar os esforços políticos e diplomáticos para impedir o uso da força militar em violação da Carta da ONU, especialmente as tentativas de contornar as prerrogativas do Conselho de Segurança da ONU e violaras condições do uso do direito inalienável à autodefesa garantido pelo Artigo 51º da Carta da ONU;
4) tomar medidas políticas e diplomáticas para impedir as interferências nos assuntos internos dos países soberanos, com o objetivo de exacerbar a situação política interna, as mudanças inconstitucionais de governo ou a violação da integridade territorial dos países;
5) manter a estabilidade estratégica, eliminar pressupostos para uma guerra global, riscos de utilização de armas nucleares e outras armas de destruição em massa, estabelecer uma arquitetura de segurança internacional atualizad e prevenir e resolver conflitos armados internacionais e internos, fazer frente aos desafios e ameaças transnacionais em áreas específicas da segurança internacional;
25. A Federação da Rússia parte da premissa de que as suas Forças Armadas podem ser utilizadas de acordo com princípios e normas do direito internacional universalmente aceites, tratados internacionais da Federação da Rússia e a sua legislação. A Rússia considera o Artigo 51º da Carta das Nações Unidas como base jurídica adequada e não passível de revisão para o uso da força em autodefesa. A utilização das Forças Armadas da Federação da Rússia pode ter como objetivo, entre outros, a resolução de tarefas de repelir e prevenir um ataque armado à Rússia e/ou aos seus aliados, resolver crises, manter (restabelecer) a paz de acordo com uma resolução do Conselho de Segurança da ONU, outras estruturas de segurança coletiva com a participação russa na sua área de responsabilidade, proteger os seus cidadãos no estrangeiro, e combater o terrorismo internacional e a pirataria.
26. Em caso de ações hostis de países estrangeiros ou das suas associações que constituam uma ameaça à soberania e integridade territorial da Federação da Rússia, incluindo as que envolvam a aplicação de medidas restritivas (sanções) de natureza política ou económica ou que envolvam a utilização de tecnologias de informação e comunicação modernas, a Federação da Rússia considera lícito tomar medidas simétricas e assimétricas necessárias para coibir estas ações hostis e impedir a sua recorrência no futuro.
27. A fim de manter a estabilidade estratégica, eliminar os pressupostos para o desencadeamento de uma guerra global e os riscos de utilização de armas nucleares e outras armas de destruição em massa, e criar uma arquitetura de segurança internacional atualizada, a Federação da Rússia pretende dar atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) promover a dissuasão estratégica, impedir que as relações entre os países se agravem ao ponto de poderem provocar conflitos militares, inclusive com a utilização de armas nucleares e de outras armas de extermínio em massa;
2) reforçar e desenvolver tratados internacionais nos domínios da estabilidade estratégica, controlo de armas, prevenção da proliferação de armas de destruição em massa, dos seus vetores e dos bens e tecnologia conexos (tomando-se igualmente em consideração o risco de componentes destas armas poderem ficar em poder de estruturas não estatais);
3) consolidar e desenvolver pilares políticos internacionais (acordos) para a manutenção da estabilidade estratégica, regimes de controlo de armas e de não proliferação de todas as armas de destruição em massa e dos seus vectores, tendo em devida conta todos os tipos de armas e fatores que impactam a estabilidade estratégica na sua interligação;
4) prevenir uma corrida aos armamentos e excluir a sua extensão a novos ambientes, criar condições para uma maior redução gradual dos arsenais nucleares, tendo em conta todos os fatores capazes de impactar a estabilidade estratégica;
5) aumentar a previsibilidade nas relações internacionais, implementar e, quando necessário, melhorar as medidas de confiança nos assuntos militares e internacionais, prevenir incidentes armados não intencionais;
6) cumprir as garantias de segurança em relação aos países partes nos tratados regionais de zona livre de armas nucleares;
7) promover o controlo das armas convencionais, combater o tráfico ilícito de armas portáteis e armamento ligeiro;
8) reforçar a segurança e salvaguardas nucleares a nível mundial e prevenir atos de terrorismo nuclear;
9) promover a cooperação nas utilizações pacíficas da energia nuclear para satisfazer as necessidades todos os países interessados em combustível e energia, respeitando o direito de cada Estado de determinar livremente as suas políticas nacionais neste domínio;
10) reforçar o papel dos mecanismos multilaterais de controlo das exportações nos domínios da segurança internacional e da não proliferação de armas de destruição em massa e dos seus vectores, e impedir que estes mecanismos se tornem num instrumento de restrições unilaterais para dificultar a cooperação internacional legítima;
28. A fim de reforçar a segurança regional, prevenir guerras locais e regionais e resolver conflitos armados internos (principalmente em territórios de países vizinhos), a Federação da Rússia pretende dar atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) tomar medidas políticas e diplomáticas para prevenir ameaças ou para reduzir o nível de ameaças à segurança da Rússia a partir dos territórios e países vizinhos;
2) apoiar os aliados e parceiros a assegurar na defesa e segurança, e neutralizar as tentativas de interferência externa nos seus assuntos internos;
3) desenvolver a cooperação militar, político-militar e técnico-militar com os aliados e parceiros;
4) facilitar a criação e melhoria de mecanismos de segurança regional e resolução de crises em regiões importantes para os interesses russos;
5) aumentar o papel da Rússia na manutenção da paz (inclusive como parte da interação com a ONU, organizações internacionais regionais e partes em conflitos), reforçar as capacidades de manutenção da paz e de gestão de crises da ONU e da OTSC.
29. A fim de prevenir ameaças biológicas e de garantir a segurança biológica, a Federação da Rússia tenciona dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) investigar casos de presumíveldesenvolvimento, implantação e utilização de armas biológicas e toxínicas, principalmente nos territórios de países vizinhos;
2) prevenir atos terroristas e (ou) de sabotagem que são cometidos com a utilização de agentes patogénicos perigosos, e eliminar as suas consequências;
3) ampliar a cooperação com aliados e parceiros na área da segurança biológica, principalmente com os países membros da OTSC e da CEI.
30. A fim de garantir a segurança da informação internacional, contrariar as ameaças à mesma e reforçar a soberania russa no espaço global da informação, a Federação da Rússia pretende dar atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) reforçar e aperfeiçoar o regime jurídico internacional de prevenção e resolução de conflitos entre países e regulamentação de atividades no espaço global de informação;
2) estabelecer e aperfeiçoar o quadro jurídico internacional para combater a utilização das tecnologias da informação e comunicação para fins criminosos;
3) garantir o funcionamento seguro e estável e o desenvolvimento da Internet através da participação igual dos países na gestão da rede e impedir o estabelecimento de um controlo estrangeiro sobre os seus segmentos nacionais;
4) tomar medidas políticas, diplomáticas e outras para contrariar as políticas dos países hostis voltadas para a militarização do espaço de informação global, utilização das tecnologias da informação e comunicação para a interferência nos assuntos internos dos países e para fins militares e restrição do acesso de outros países às tecnologias de informação e comunicação avançadas e aumento da sua dependência tecnológica.
31. A fim de erradicar o terrorismo internacional e proteger o Estado e os cidadãos russos de atos terroristas, a Federação da Rússia pretende dar atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) aumentar a eficácia e a coordenação da cooperação multilateral no combate ao terrorismo, incluindo no seio da ONU;
2) reforçar o papel determinante dos países e das suas autoridades competentes na luta contra o terrorismo e o extremismo;
3) tomar medidas políticas, diplomáticas e outras para evitar que os países utilizem organizações terroristas e extremistas (e neonazis) como instrumentos de política externa e interna;
4) combater a difusão, incluindo na Internet, de ideologias terroristas e extremistas (assim como o neonazismo e o nacionalismo radical);
5) identificar indivíduos e organizações envolvidos em atividades terroristas e bloquear os canais de financiamento do terrorismo;
6) identificar e preencher as lacunas no quadro jurídico internacional em matéria de cooperação antiterrorista, tendo em conta os riscos de atos terroristas envolvendo substâncias químicas e biológicas;
7) reforçar a cooperação multidisciplinar com aliados e parceiros no combate ao terrorismo, prestar-lhes assistência prática em operações contra terrorismo e na defesa, inclusive, dos cristãos no Médio Oriente.
32. A fim de combater o tráfico e consumo ilícito de estupefacientes e substâncias psicotrópicas que constituem uma séria ameaça à segurança internacional e nacional, à saúde dos cidadãos e aos fundamentos espirituais e morais da sociedade russa, a Federação da Rússia tenciona dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) ampliar a cooperação internacional com vista a evitar qualquer enfraquecimento ou revisão do atual regime global de controlo da droga (incluindo a inadmissibilidade de legalizar a sua utilização para fins não médicos) e contrariar outras iniciativas que possam provocar um aumento do tráfico e consumo ilícitos de droga;
2) prestar assistência prática aos aliados e parceiros na implementação de atividades antidroga.
33. A fim de combater o crime organizado transnacional e a corrupção que constituem uma ameaça crescente à segurança e ao desenvolvimento sustentável da Rússia e dos seus aliados e parceiros, a Federação da Rússia tenciona dar prioridade à expansão da cooperação internacional com vista a eliminar “portos seguros” para os criminosos e ao reforço dos mecanismos multilaterais especializados que são dos interesses nacionais da Rússia.
34. A fim de reduzir os riscos associados a catástrofes e acidentes de origem natural e tecnológica fora das fronteiras da Federação da Rússia e de aumentar a resistência dos países estrangeiros aos mesmos, a Federação da Rússia tenciona dar atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) reforçar o quadro organizacional e jurídico e aperfeiçoar os mecanismos de cooperação bilateral e multilateral em matéria de proteção da população contra emergências de origem natural e tecnológica, aumentar capacidades de alerta precoce e previsão de emergências e eliminação das suas consequências;
2) prestar assistência prática a países estrangeiros na proteção contra emergências de origem natural e tecnológica e partilhar tecnologias e experiência russas únicas de resposta a emergências.
35. A fim de combater a migração ilegal e melhorar a gestão dos processos de migração internacional, a Federação da Rússia tenciona dar prioridade ao reforço da cooperação nesta área com os países membros da CEI que seguem uma política construtiva para a Federação da Rússia.
Atividades para garantir os interesses da Federação da Rússia nos oceanos e mares, no espaço exterior e no espaço aéreo internacional
36. A fim de estudar, desenvolver e utilizar os oceanos e os mares no interesse da segurança e do desenvolvimento da Rússia, e para contrariar as medidas restritivas unilaterais dos países hostis e das suas alianças contra as atividades marítimas russas, a Federação da Rússia dará atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) garantir o acesso livre, seguro e completo da Rússia a espaços vitais, importantes e outros, vias de transporte e recursos dos oceanos e mares;
2) explorar de forma responsável e racional recursos biológicos, minerais, energéticos e outros dos oceanos e mares, desenvolver sistemas dutoviários marítimos, realizar investigações científicas, proteger e preservar o ambiente marinho;
3) consagrar, em conformidade com o direito internacional, os limites exteriores da plataforma continental da Federação da Rússia e proteger os seus direitos soberanos na mesma.
37. Empenhada em utilizar o espaço para fins pacíficos e em consolidar a sua posição de liderança no mercado de bens, obras e serviços espaciais e o seu estatuto de uma das maiores potência espaciais, a Federação da Rússia pretende dar atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) promover a cooperação internacional para prevenir uma corrida aos armamentos no espaço, principalmente através da elaboração e celebração de um tratado internacional correspondente e, como medida intermédia, através da adoção, por todos os países, de uma obrigação de não serem os primeiros a colocar armas no espaço;
2) diversificar geograficamente a cooperação internacional na área das atividades espaciais.
38. A fim de utilizar o espaço aéreo internacional no interesse da segurança e do desenvolvimento da Rússia e para contrariar as medidas restritivas unilaterais dos países hostis e das suas alianças contra aeronaves russas, a Federação da Rússia tenciona priorizar os segui9ntes aspectos:
1) assegurar o acesso garantido da Rússia ao espaço aéreo internacional (aberto), com base no princípio da liberdade de voo;
2) diversificar geograficamente as rotas de voo internacionais das aeronaves russas e desenvolver a cooperação na área do transporte aéreo, bem como proteger e utilizar o espaço aéreo juntamente com os países com políticas construtivas para a Rússia.
Cooperação económica internacional e promoção do desenvolvimento internacional
39. Para garantir a segurança económica, a soberania económica, o crescimento económico sustentável, a atualização estrutural e tecnológica, a melhoria da competitividade da economia nacional nos mercados internacionais, a preservação da posição cimeira da Rússia na economia mundial, a redução dos riscos e o aproveitamento das oportunidades decorrentes das mudanças em curso na economia global e nas relações internacionais e das ações hostis dos países estrangeiros e das suas alianças, a Federação da Rússia dará atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) adaptar o comércio e os sistemas monetários globais às realidades de um mundo multipolar e às consequências da crise da globalização económica para, antes de mais nada, reduzir a capacidade dos países hostis de abusar do seu monopólio ou da sua posição dominante nalguns sectores da economia mundial e aumentar a participação dos países em desenvolvimento na gestão económica global;
2) diminuir a dependência da economia russa de atos hostis dos países estrangeiros, desenvolvendo, em primeiro lugar, uma infraestrutura de pagamentos internacionais despolitizada e segura, independente dos países hostis e da expansão da prática de desembolsos em moedas nacionais nas relações com os aliados e parceiros;
3) reforçar a presença da Rússia nos mercados globais, aumentar as exportações não primárias e não energéticas, diversificar geograficamente os laços económicos e reorientá-los para países com políticas construtivas e neutras para a Federação da Rússia, mantendo-se ao mesmo tempo abertos à cooperação pragmática com os círculos empresariais dos países hostis;
4) melhorar as condições de acesso da Rússia aos mercados mundiais, proteger as organizações, investimentos, bens e serviços russos no estrangeiro contra a discriminação, concorrência desleal, tentativas de outros países de regular unilateralmente os mercados mundiais importantes para as exportações russas;
5) proteger a economia russa e as suas relações comerciais e económicas internacionais contra ações hostis dos países estrangeiros, aplicando medidas económicas especiais a título de retaliação;
6) facilitar a atração de investimentos estrangeiros, conhecimentos e tecnologias avançadas, especialistas altamente qualificados para a Rússia;
7) promover os processos de integração económica regional e inter-regional que são do interesse da Rússia, em primeiro lugar no âmbito do Estado-União Rússia-Bielorrússia, da UEE, da CEI, da OCX, dos BRICS, bem como para os fins da Grande Parceria Eurasiática;
8) aproveitar a posição geográfica única da Rússia e o seu potencial de trânsito para o desenvolvimento da economia nacional, reforço da interconectividade dos transportes e das infraestruturas na Eurásia.
40. A fim de melhorar a resiliência do sistema de relações internacionais às crises, melhorar a situação socioeconómica e humanitária no mundo, eliminar as consequências dos conflitos armados, implementar a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, reforçar a percepção positiva da Rússia no mundo, a Federação da Rússia pretende contribuir para o desenvolvimento internacional, dando prioridade ao desenvolvimento socioeconómico da República da Abcásia, da República da Ossétia do Sul, dos países membros da UEE, dos países membros da CEI que mantêm relações de boa vizinhança com a Rússia e dos países em desenvolvimento com políticas construtivas para a Federação da Rússia.
Proteção do ambiente e saúde global
41. A fim de preservar um ambiente favorável, melhorar a sua qualidade e adaptar-se racionalmente às alterações climáticas no interesse das gerações presentes e futuras, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) ajudar os esforços internacionais não politizados e cientificamente fundamentadas para reduzir os impactos negativos no meio ambiente (incluindo as emissões de gases estufa) e para conservar e aumentar a capacidade de absorção dos ecossistemas;
2) ampliar a cooperação com aliados e parceiros para contrariar a politização das atividades internacionais em matéria de ambiente e clima, particularmente para efeitos de concorrência desleal, interferência nos assuntos internos dos países e limitação da soberania dos países sobre os seus recursos naturais;
3) apoiar o direito de cada Estado de escolher independentemente os melhores mecanismos e métodos de proteção ambiental e adaptação às alterações climáticas;
4) promover a elaboração de regulamentos ambientais e climáticos globais comuns, compreensíveis e justos, tendo em conta o Acordo de Paris, de 12 de dezembro de 2015, adotado com base na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, de 9 de maio de 1992;
5) melhorar a eficácia da cooperação internacional no desenvolvimento e implementação de tecnologias avançadas, capazes de contribuir para a preservação e melhoria da qualidade do ambiente favorável e para a adaptação dos países às alterações climáticas;
6) prevenir danos transfronteiras ao meio ambiente da Federação da Rússia, principalmente a infiltração no seu território nacional de poluentes (inclusive radioativos), de pragas vegetais perigosas e especialmente perigosas, de quarentena, de agentes patogénicos vegetais, plantas infestantes e microrganismos.
42. A fim de contribuir para a proteção da saúde e bem-estar social dos povos da Rússia e de outros países, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) melhorar a eficácia da cooperação internacional no domínio da saúde e envidar esforços, inclusive em organizações internacionais, para contrariar a sua politização;
2) consolidar os esforços internacionais para prevenir a propagação de doenças infecciosas perigosas, responder de forma atempada e eficaz a emergências sanitárias e epidemiológicas, combater doenças crónicas não transmissíveis, e superar as consequências sociais e económicas de pandemias e epidemias;
3) melhorar a eficácia da investigação científica internacional em matéria de saúde, visando principalmente o desenvolvimento e implementação de novos instrumentos de prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças.
Cooperação humanitária internacional
43. A fim de reforçar o papel da Rússia no espaço humanitário global, formar a sua percepção positiva no estrangeiro, reforçar a posição da língua russa no mundo, contrariar a campanha da russofobia desencadeada por países hostis e suas associações, e aumentar a compreensão mútua e a confiança entre países, a Federação da Rússia dará prioridade aos seguintes aspectos:
1) divulgar e proteger contra a discriminação no estrangeiro das realizações nacionais nos domínios da cultura, ciência, educação e arte, bem como reforçar a imagem da Rússia como Estado atrativo para viver, trabalhar, estudar e fazer turismo;
2) apoiar a difusão da língua russa e reforçar a sua posição como língua de comunicação internacional, uma das línguas oficiais da ONU e de várias outras organizações internacionais, facilitar o estudo e a utilização da língua russa em países estrangeiros (principalmente nos países membros da CEI), preservar e reforçar o papel da língua russa na comunicação internacional e interestatal, inclusive nos contactos mantidos nas organizações internacionais, proteger a língua russa contra a discriminação no estrangeiro;
3) desenvolver mecanismos de diplomacia pública com a participação de representantes e instituições da sociedade civil com atitudes construtivas para com a Rússia, de cientistas políticos, peritos e cientistas, jovens, voluntários, associações de busca e recuperação da memória dos soldados tombados nas guerras e outros movimentos sociais;
4) contribuir para o desenvolvimento de relações internacionais de organizações religiosas pertencentes a confissões tradicionais da Rússia, proteger a Igreja Ortodoxa Russa contra a discriminação no estrangeiro, incluindo no interesse de assegurar a unidade da religião ortodoxia;
5) contribuir para a formação de um espaço humanitário comum da Federação da Rússia e dos países membros da CEI, a preservação dos laços civilizacionais e espirituais centenários dos povos da Rússia com os povos destes países;
6) garantir o livre acesso dos atletas e organizações desportivas russas às atividades desportivas internacionais, promover a sua despolitização, melhorar as atividades das organizações desportivas internacionais intergovernamentais e sociais, bem como desenvolver novas modalidades de cooperação desportiva internacional com países com políticas construtivas para a Rússia.
44. A fim de combater a falsificação da história, o incitamento ao ódio contra a Rússia, a difusão da ideologia do neonazismo, a exclusividade racial e étnica e o nacionalismo agressivo, e de reforçar os fundamentos morais, legais e institucionais das relações internacionais contemporâneas, baseadas principalmente no resultado geralmente reconhecido da Segunda Guerra Mundial, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) divulgar no estrangeiro informações verazes sobre o papel e o lugar da Rússia na história mundial e na formação de uma ordem mundial mais justa e sobre a contribuição decisiva da União Soviética para a vitória sobre a Alemanha nazi, a criação das Nações Unidas e a descolonização e criação de Estados africanos, asiáticos e latino-americanos;
2) tomar, tanto em fóruns internacionais especializados como a nível de relacionamento bilateral com os parceiros estrangeiros, medidas necessárias para impedir as tentativas de deturpar os acontecimentos significativos da história mundial que atingem os interesses russos, de silenciar os crimes dos nazis alemães, dos militaristas japoneses e dos seus cúmplices e de reabilitá-los e de glorificá-los;
3) tomar medidas de reação contra países estrangeiros e as suas associações, responsáveis governamentais, organizações e cidadãos estrangeiros envolvidos em atos hostis contra sítios russos de importância histórica e memorial localizados no estrangeiro;
4) promover a cooperação internacional construtiva para a preservação do património histórico e cultural.
Proteção dos cidadãos e organizações russos contra perseguições ilegais no estrangeiro, apoio aos compatriotas residentes no estrangeiro, cooperação internacional em matéria de direitos humanos
45. A fim de defender os direitos, liberdades e interesses legítimos dos cidadãos russos (incluindo os menores), proteger as organizações russas contra perseguições ilegais no estrangeiro e contrariar a campanha da russofobia desencadeada por países hostis, a Federação da Rússia tenciona dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) monitorizar ações hostis contra cidadãos e organizações russas, como a aplicação de medidas restritivas (sanções) de natureza política ou económica, processos judiciais injustificados, a prática de crimes, discriminação, incitação ao ódio;
2) tomar medidas de ação e medidas económicas especiais contra países estrangeiros e as suas associações, responsáveis governamentais, organizações e cidadãos estrangeiros envolvidos na prática de atos hostis contra cidadãos e organizações russos e na violação dos direitos e liberdades fundamentais dos compatriotas residentes no estrangeiro;
3) melhorar a eficácia dos mecanismos globais, regionais e bilaterais de proteção internacional dos direitos, liberdades e interesses legítimos dos cidadãos russos e das organizações russas, e criar novos mecanismos nesta área, se necessário.
46. A fim de desenvolver as relações com os compatriotas residentes no estrangeiro e prestar-lhes um apoio abrangente (tendo em conta a sua contribuição significativa para a preservação e divulgação da língua e cultura russas) devido à discriminação sistemática de que são alvo em vários países, a Federação da Rússia, enquanto núcleo da comunidade civilizacional do Mundo Russo, tenciona dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) contribuir para a consolidação dos compatriotas residentes no estrangeiro e que têm uma atitude construtiva para com a Rússia e apoiá-los na proteção dos seus direitos e interesses legítimos nos países de residência, principalmente em países hostis, na preservação da sua identidade cultural e linguística e dos valores espirituais e morais russos e das suas ligações com a sua pátria histórica;
2) encorajar os compatriotas com atitudes construtivos para com a Rússia, especialmente aqueles que são discriminados nos países de residência, a repatriarem-se para a Federação da Rússia.
47. A Rússia reconhece e garante os direitos humanos e civis e as liberdades em conformidade com os princípios e normas do direito internacional universalmente aceites e considera a renúncia à hipocrisia e a aplicação de boa fé pelos países das suas obrigações nesta área como uma das condições para o desenvolvimento progressista e harmonioso da humanidade. A fim de promover o respeito e a observância dos direitos humanos e das liberdades no mundo, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) fazer com que os interesses da Rússia, as suas particularidades nacionais, socioculturais, espirituais, morais e históricas sejam tidos em conta ao melhorar a regulamentação jurídica internacional e os mecanismos internacionais na área dos direitos humanos;
2) monitorizar e divulgar a situação real no que respeita à observância dos direitos humanos e das liberdades no mundo, principalmente nos países que reivindicam o excepcionalismo em termos de observância dos direitos humanos e de definição de normas internacionais nesta área;
3) erradicar a política de padrões duplos na cooperação internacional no domínio dos direitos humanos, conferindo-lhe um carácter não politizado, igual e mutuamente respeitoso;
4) combater a utilização da temática dos direitos humanos como instrumento de pressão externa, interferência nos assuntos internos dos países e exercício de influência destrutiva sobre as atividades das organizações internacionais;
5) tomar medidas contra países estrangeiros e as suas associações, responsáveis governamentais, organizações e cidadãos estrangeiros envolvidos nas violações dos direitos humanos e liberdades fundamentais.
Apoio mediático à política externa da Federação da Rússia
48. A fim de formar uma percepção objetiva da Rússia no estrangeiro, reforçar a sua posição no espaço de informação global, contrariar a campanha de propaganda antirrussa coordenada levada a cabo sistematicamente por países hostis e que envolve desinformação, calúnia e incitamento ao ódio, e de conceder à população de países estrangeiros o livre acesso à informação veraz, a Federação da Rússia pretende priorizar os seguintes aspectos:
1) levar ao conhecimento do mais vasto público estrangeiro possível informações verídicas sobre a política externa e interna da Federação da Rússia, a sua história e realizações nas mais diversas áreas e outras informações verazes sobre a Rússia;
2) contribuir para a divulgação no estrangeiro de informação que contribua para a paz e compreensão internacionais, o desenvolvimento e estabelecimento de relações de amizade entre países, o reforço dos valores espirituais e morais tradicionais como fator unificador de toda a humanidade, e o reforço do papel da Rússia no espaço humanitário global;
3) proteger contra a discriminação no estrangeiro e ajudar a reforçar a posição dos meios de comunicação social, entre os quais as plataformas de informação digital nacionais, e dos meios de comunicação em massa das comunidades russas no estrangeiro com atitudes construtivas para com a Rússia no espaço da informação global;
4) melhorar os instrumentos e métodos de apoio mediático às atividades de política externa da Federação da Rússia e a utilização das tecnologias da informação e comunicação modernas, entre as quais as redes sociais;
5) melhorar os mecanismos e normas internacionais de regulação e proteção das atividades dos meios de comunicação social, garantir o livre acesso aos mesmos e produzir e divulgar informação;
6) criar condições favoráveis às atividades dos meios de comunicação social estrangeiros na Rússia, com base no princípio da reciprocidade;
7) promover a formação de um espaço de informação comum entre a Federação da Rússia e os países membros da CEI, intensificar a a cooperação no domínio da informação com os países com políticas construtivas para a Rússia.
V. Vertentes regionais da política externa da Federação da Rússia
Países pós-soviéticos
49. O mais importante para a segurança, estabilidade, integridade territorial e desenvolvimento socioeconómico da Rússia, reforço da sua posição como um dos centros soberanos influentes do desenvolvimento e civilização global é manter relações de boa vizinhança sustentáveis a longo prazo e unir potenciais, nas mais diversas áreas, dos países membros da CEI e outros países vizinhos ligados à Rússia por tradições centenárias de viver num Estado comum, profunda interdependência nos mais diversos domínios, língua comum e culturas próximas. A fim de dar continuidade à transformação do espaço pós-soviético numa zona de paz, boa vizinhança, desenvolvimento sustentável e prosperidade, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) prevenir e resolver conflitos armados, melhorar as relações interestatais e manter a estabilidade no espaço dos países ex-repúblicas soviéticas, coibir as tentativas de inspirar “revoluções coloridas” e de interferir nos assuntos internos dos aliados e parceiros da Rússia;
2) assegurar a proteção garantida da Rússia e dos seus aliados e parceiros em qualquer desenvolvimento da situação militar e política no mundo, reforçar o sistema de segurança regional, com base no princípio da indivisibilidade da segurança e no papel-chave da Rússia na manutenção e reforço da segurança regional, da complementaridade do Estado-União, da OTSC e de outros formatos de cooperação entre a Rússia e os seus aliados e parceiros no domínio da defesa e da segurança;
3) combater a instalação ou o reforço das infraestruturas militares dos países hostis e outras ameaças à segurança russa no espaço pós-soviético;
4) aprofundar os processos de integração em benefício da Rússia, intensificar a interação estratégica com a República da Bielorrússia, reforçar o sistema de cooperação multilateral abrangente mútua baseado na combinação dos potenciais da CEI e da UEE e desenvolver formatos multilaterais adicionais, entre os quais o mecanismo de interação entre a Rússia e os países da Ásia Central;
5) criar, numa perspectiva de longo prazo, um espaço económico e político integrado na Eurásia;
6) prevenir e suprimir as ações hostis dos países estrangeiros e das suas alianças, capazes de provocar processos de desintegração no espaço pós-soviético e criar obstáculos ao exercício do direito soberano dos aliados e parceiros da Rússia de aprofundar a cooperação abrangente com a Rússia;
7) aproveitar o potencial económico das relações de boa vizinhança, particularmente com os países membros da UEE e os interessados em desenvolver relações económicas com a Rússia, a fim de formar um contorno de integração mais amplo na Eurásia;
8) dar apoio abrangente à República da Abcásia e à República da Ossétia do Sul e ajudá-las a levar à prática a sua escolha voluntária, baseada no direito internacional, dos povos destes países a favor de uma integração mais profunda com a Rússia;
9) reforçar a cooperação na região do Mar Cáspio, com base na competência exclusiva dos cinco países à beira do Mar Cáspio de solucionar todas as questões relacionadas com a região.
O Ártico
50. A Rússia procura preservar a paz e a estabilidade, melhorar a sustentabilidade ambiental, reduzir as ameaças à segurança nacional no Ártico, criar condições internacionais favoráveis ao desenvolvimento socioeconómico da zona ártica da Federação da Rússia (assim como proteger o habitat original e o modo de vida tradicional das minorias indígenas que vivem nessa zona), e desenvolver a Rota do Mar do Norte como via de transporte nacional competitiva, visando a possibilidade da sua utilização internacional com vista à realização do transporte entre a Europa e Ásia. Para o efeito, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) resolver de forma pacífica as questões internacionais do Ártico, entendendo que os países do Ártico arcam com uma responsabilidade especial pelo desenvolvimento sustentável da região e que a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, de 10 de dezembro de 1982, é suficiente para regular as relações interestatais no Oceano Ártico (e as questões da proteção do ambiente marinho e da delimitação dos espaços marítimos);
2) neutralizar a política dos países hostis para militarizar a região e restringir as possibilidades da Rússia de exercer os seus direitos soberanos na sua zona ártica;
3) manter inalterado o regime jurídico internacional historicamente estabelecido para as águas marítimas interiores da Federação da Rússia;
4) estabelecer uma cooperação mutuamente vantajosa com países extra-Ártico com políticas construtivas para a Rússia, interessados em realizar atividades internacionais no Ártico, incluindo o desenvolvimento infraestrutural da Rota do Mar do Norte.
Continente euroasiático
República Popular da China, República da Índia
51. O aprofundamento abrangente das relações e da coordenação com os centros mundiais de poder e desenvolvimento soberanos e amigos localizados no continente euroasiático, com as posições que coincidem, no essencial, com as posições russas sobre a futura ordem mundial e os principais problemas da política mundial é de especial importância para que a Federação da Rússia atinja os seus objetivos estratégicos e resolva as principais tarefas da sua política externa.
52. A Rússia visa reforçar ainda mais as relações de parceria global e interação estratégica com a República Popular da China e dá atenção prioritária ao desenvolvimento de cooperação mutuamente vantajosa em todos os domínios, à prestação de assistência mútua e ao reforço da coordenação na cenário internacional no interesse da segurança, estabilidade, desenvolvimento sustentável a nível global e regional na Eurásia e noutras regiões do mundo.
53. A Rússia continuará a estreitar a parceria estratégica privilegiada com a República da Índia para aprofundar e alargar a interação em todas as áreas, regendo-se pelo princípio da vantagem mútua, e a dispensar especial atenção à intensificação das relações bilaterais na área do comércio, investimento e tecnologia, tornando-as mais resistentes às ações destrutivas dos países hostis e das suas alianças.
54. A Rússia procura transformar a Eurásia num espaço único de paz, estabilidade, confiança mútua, desenvolvimento e prosperidade. A realização deste objetivo implica:
1) reforçar, de todos os modos possíveis, o potencial e o papel da OCX para garantir a segurança na Eurásia e promover o seu desenvolvimento sustentável, melhorando as atividades da Organização de modo a atender às atuais realidades geopolíticas;
2) formar um amplo contorno de integração, a Grande Parceria Eurasiática, conjugando os potenciais de todos os países, organizações e alianças regionais na Eurásia, com base na UEE, na OCX e na Associação das Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), alinhando os planos de desenvolvimento da UEE com a iniciativa chinesa “Uma Faixa, Uma Rota”, mantendo simultaneamente a possibilidade de participação nesta parceria de todos os países e associações multilaterais do continente euroasiático interessados e, como resultado, criando uma rede de organizações parceiras na Eurásia;
3) reforçar a interconexão económica e de transportes da Eurásia, modernizando e aumentando a capacidade das linhas ferroviárias de Baikal-Amur e Transiberiana, abrindo, o mais rapidamente possível, o corredor de transporte internacional Norte-Sul, melhorando as infraestruturas do corredor de transporte internacional Europa-China Ocidental, entre as regiões do Mar Cáspio e do Mar Negro e da Rota do Mar do Norte, criando zonas de desenvolvimento e corredores económicos na Eurásia, incluindo o corredor económico Rússia-Mongólia-China, bem como intensificando a cooperação regional no desenvolvimento digital e construindo parcerias na área de energia;
4) resolver a situação no Afeganistão, promover a sua afirmação como Estado soberano, pacífico, neutro, com uma economia e um sistema político sustentáveis que vão ao encontro dos interesses de todos os seus grupos étnicos, o que abrirá perspectivas para a integração do Afeganistão no espaço euroasiático de cooperação.
Ásia-Pacífico
55. Dado o crescimento dinâmico do potencial multidimensional da região Ásia-Pacífico, a Federação da Rússia pretende dar atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) intensificar a cooperação nos domínios económico, de segurança, humanitário e outros com os países da região e a ASEAN;
2) promover na região uma arquitetura de segurança abrangente, aberta, indivisível, transparente, multilateral e igual e uma cooperação mutuamente vantajosa com base nos princípios da coletividade e não alinhamento, bem como aproveitar o potencial da região para formar uma Grande Parceria Euroasiática;
3) encorajar o diálogo construtivo não politizado e a cooperação interestatal em diversos domínios, utilizando, entre outras coisas, as possibilidades do fórum “Cooperação Económica Ásia-Pacífico”;
4) contrariar as tentativas de enfraquecer o sistema regional de alianças multilaterais em matéria de segurança e desenvolvimento nucleado na ASEAN e baseado nos princípios do consenso e da igualdade dos participantes;
5) desenvolver uma ampla cooperação internacional para contrariar as políticas que procuram traçar linhas divisórias na região.
Mundo islâmico
56. Os países de civilização islâmica amiga, que, nas realidades do mundo multipolar, têm boas perspectivas de emergir como centro independente de desenvolvimento mundial, são cada vez mais importantes e parceiros confiáveis da Rússia nas questões da segurança e estabilidade e na resolução dos problemas económicos a nível global e regional. A Rússia pretende reforçar a cooperação abrangente e mutuamente vantajosa com os países Membros da Organização de Cooperação Islâmica, respeitando os seus modos de vida sociopolíticos e os seus valores espirituais e morais tradicionais. Para o efeito, a Federação da Rússia pretende dar prioridade aos seguintes aspectos:
1) desenvolver uma interação abrangente e de confiança com a República Islâmica do Irão, apoiar, por todos os meios, a República Árabe Síria, aprofundar parcerias multifacetadas mutuamente vantajosas com a República da Turquia, o Reino da Arábia Saudita, a República Árabe do Egito e outros países membros da Organização de Cooperação Islâmica, em função do quão soberana e construtiva é a sua política para a Federação da Rússia;
2) criar, no Médio Oriente e no Norte de África, uma arquitetura de segurança e cooperação regional sustentável e abrangente baseada na congregação dos potenciais de todos os países e associações interestatais regionais, entre as quais a Liga de Estados Árabes e o Conselho de Cooperação para os Países Árabes do Golfo. A Rússia pretende cooperar ativamente com todos os países e associações interestatais interessadas, a fim de levar à prática o conceito russo de segurança coletiva no Golfo Pérsico, encarando a implementação desta iniciativa como passo importante para uma normalização abrangente e duradoura da situação no Médio Oriente;
3) promover o diálogo e a compreensão entre as religiões e culturas, consolidar os esforços para proteger os valores espirituais e morais tradicionais e combater a islamofobia, inclusive através da Organização de Cooperação Islâmica;
4) diminuir as contradições e normalizar as relações entre os países membros da Organização de Cooperação Islâmica e entre estes países e os seus vizinhos (principalmente entre a República Islâmica do Irão e os países árabes, entre a República Árabe Síria e os seus vizinhos, entre os países árabes e o Estado de Israel), nomeadamente através de esforços com vista a uma solução abrangente e duradoura da questão palestiniana;
5) facilitar a resolução dos conflitos armados e a superação das suas consequências no Médio Oriente, Norte de África, Sul, Sudeste Asiático e outras regiões onde se encontram os países membros da Organização de Cooperação Islâmica;
6) aproveitar o potencial económico dos países membros da Organização de Cooperação Islâmica para os efeitos de criação de uma Grande Parceria Eurasiática.
África
57. A Rússia está solidária com os países africanos na sua busca de um mundo multipolar mais justo e nas suas tentativas de acabar com as desigualdades socioeconómicas, que são exacerbadas pelas sofisticadas políticas neocoloniais de alguns países desenvolvidos para a África. A Federação da Rússia pretende contribuir para a afirmação de África como centro singular e influente do desenvolvimento mundial, dando atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) apoiar a soberania e independência dos países africanos interessados, prestando-lhes assistência nas áreas da segurança, segurança alimentar e energética, cooperação militar e técnico-militar;
2) contribuir para a resolução dos conflitos armados e superação das suas consequências em África, em particular os interétnicos, defendendo o papel primordial dos países africanos nestes esforços e respeitando o princípio por eles formulado: ” soluções africanas para os problemas africanos”;
3) reforçar e aprofundar a interação russo-africana bilateral e multilateral em diversos domínios, particularmente no quadro da União Africana e do Fórum de Parceria Rússia-África;
4) aumentar o volume das trocas comerciais e investimento com países africanos e estruturas de integração africanas (principalmente a Área de Livre Comércio Continental Africana, o Banco Africano de Exportação-Importação e outras organizações sub-regionais importantes), inclusive no âmbito da UEE;
5) promover e desenvolver laços humanitários, a cooperação científica e formação de pessoal, reforçar os sistemas de saúde, prestar outras assistências, promover o diálogo intercultural, proteger os valores espirituais e morais tradicionais e o direito à liberdade religiosa.
América Latina e Caraíbas
58. Tendo em vista o reforço progressivo da soberania e do potencial multifacetado dos países da América Latina e Caraíbas, a Federação da Rússia pretende desenvolver relações com eles de uma forma pragmática, desideologizada e mutuamente vantajosa, dando atenção prioritária aos seguintes aspectos:
1) ajudar os países latino-americanos interessados, que estão sob a pressão dos EUA e dos seus aliados, a manter a sua soberania e independência, estabelecendo e ampliando, em particular, a cooperação nas áreas da segurança, cooperação militar e técnico-militar;
2) reforçar a amizade e compreensão mútua e aprofundar a parceria multifacetada e mutuamente vantajosa com a República Federativa do Brasil, República de Cuba, República da Nicarágua, República Bolivariana da Venezuela, desenvolver as relações com outros países latino-americanos, em função do quão independente e construtiva é a sua política para a Federação da Rússia;
3) aumentar o comércio e o investimento mútuos com os países da América Latina e das Caraíbas, nomeadamente através da cooperação com a Comunidade de Estados da América Latina e das Caraíbas, o Mercado Comum do Sul, o Sistema de Integração Centro-Americana, a Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América, a Aliança do Pacífico e a Comunidade das Caraíbas;
4) ampliar os laços culturais, científicos, educativos, desportivos, turísticos e outros laços humanitários com os países da região.
Região europeia
59. A maioria dos países europeus segue uma política agressiva para a Rússia com vista a criar ameaças à segurança e à soberania da Federação da Rússia, a obter vantagens económicas unilaterais, a minar a estabilidade política interna, a corroer os valores espirituais e morais tradicionais russos e a criar obstáculos à cooperação da Rússia com aliados e parceiros. Neste contexto, a Federação da Rússia pretende defender consistentemente os seus interesses nacionais, dando prioridade aos seguintes aspectos:
1) reduzir e neutralizar as ameaças à segurança, integridade territorial, soberania, valores espirituais e morais tradicionais e ao desenvolvimento socioeconómico da Rússia, dos seus aliados e parceiros por parte de países europeus hostis, da Organização do Tratado do Atlântico Norte, da União Europeia e do Conselho da Europa;
2) criar condições para acabar com as ações hostis dos países europeus e das suas alianças, para que estes países e as suas alianças abandonem completamente a sua política antirrussa (e a sua interferência nos assuntos internos da Rússia), e para que adotem uma política de boa vizinhança a longo prazo e cooperação mutuamente vantajosa com a Rússia;
3) cunhar um novo modelo de coexistência com os países europeus que permita garantir o desenvolvimento seguro, soberano e progressivo da Rússia, dos seus aliados e parceiros, assim como uma paz duradoura na parte europeia da Eurásia, levando em conta o potencial dos formatos multilaterais, entre os quais a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa.
60. Os pressupostos objetivos para a criação de um novo modelo de coexistência com os países europeus são a proximidade geográfica e os profundos laços culturais, humanitários e económicos históricos dos povos e países da parte europeia da Eurásia. O principal fator que complica a normalização das relações entre a Rússia e os países da Europa é a política estratégica dos EUA e de alguns dos seus aliados cujo objetivo é traçar e aprofundar as linhas divisórias na região europeia, enfraquecer e minar a competitividade das economias da Rússia e dos países da Europa e limitar a soberania dos países europeus com vista a possibilitar o domínio dos EUA à escala global.
61. Se os países europeus perceberem que não existe alternativa à coexistência pacífica e à cooperação mutuamente vantajosa em pé de igualdade com a Rússia, aumentarem a sua independência no cenário internacional e a adotarem uma política de boa vizinhança com a Federação da Rússia, isso terá um impacto benéfico na segurança e bem-estar da região europeia e ajudará os países europeus a ocupar um lugar condigno na Grande Parceria Eurasiática e no mundo multipolar.
Os EUA e outros países anglo-saxónicos
62. A política da Rússia para os EUA tem um carácter combinado, tendo em conta o papel deste país como um dos mais influentes centros soberanos de desenvolvimento global e, ao mesmo tempo, o principal inspirador, organizador e implementador da agressiva política antirrussa do Ocidente coletivo, fonte de principais riscos para a segurança da Federação da Rússia, a paz internacional e o desenvolvimento equilibrado, justo e progressivo da humanidade.
63. A Federação da Rússia está interessada em manter a paridade estratégica, coexistir pacificamente com os EUA e em estabelecer um equilíbrio de interesses entre a Rússia e os EUA, tendo em conta o seu estatuto de grandes potências nucleares e responsabilidade especial pela estabilidade estratégica e pelo estado da segurança internacional em geral. As perspectivas deste modelo de relações Rússia-EUA dependem da medida em que os EUA estejam dispostos a abdicar da sua política de domínio de força e a rever a sua política antirrussa a favor da interação com a Rússia com base nos princípios da igualdade soberana, vantagem mútua e respeito pelos interesses uns dos outros.
64. A Federação da Rússia pretende construir relações com os outros países anglo-saxónicos em função do quanto estes estiverem dispostos a abandonar a sua política hostil para a Rússia e a respeitar os seus interesses legítimos.
O Antártico
65. A Rússia está interessada em preservar o Antártico como espaço desmilitarizado, de paz, estabilidade e cooperação em pé de igualdade, em manter a sua estabilidade ambiental e em expandir a sua presença na região. Para estes fins, a Federação da Rússia pretende dar atenção prioritária à preservação, implementação efetiva e ao desenvolvimento progressivo do sistema do Tratado Antártico, de 1 de dezembro de 1959.
VI. Formação e implementação da política externa da Federação da Rússia
66. Em conformidade com a Constituição da Federação da Rússia e as leis federais, cabe ao Presidente da Federação da Rússia, definir principais opções da política externa do país, dirigi-la e, como Chefe de Estado, representar a Federação da Rússia nas relações internacionais.
67. O Conselho da Federação da Assembleia Federal da Federação da Rússia e a Duma de Estado da Assembleia Federal da Federação da Rússia trabalharão, dentro dos limites das suas competências, para assegurar a implementação da política externa da Federação da Rússia e o cumprimento das suas obrigações internacionais, contribuindo igualmente para a realização dos objetivos da diplomacia parlamentar.
68. O Governo da Federação da Rússia tomará medidas para implementar a política externa da Federação da Rússia e realizar a cooperação internacional.
69. O Conselho de Estado da Federação da Rússia participará, dentro dos limites das suas competências, na elaboração dos objetivos estratégicos e da política externa da Federação da Rússia e prestará assistência ao Presidente da Federação da Rússia na definição de principais opções da política externa da Federação da Rússia.
70. O Conselho de Segurança da Federação da Rússia formará as principais opções da política externa da Federação da Rússia, preverá, identificará, analisará e avaliará as ameaças à segurança nacional e elaborará medidas para as neutralizar, assim como preparará propostas ao Presidente da Federação da Rússia sobre a aplicação de medidas económicas especiais para garantir a segurança nacional, considerará questões relacionadas com a cooperação internacional na área da segurança, coordenará as atividades dos órgãos do poder executivo federais e regionais com vista à implementação das decisões tomadas pelo Presidente da Federação Russa e destinadas a garantir os interesses nacionais e a segurança nacional, a proteger a soberania da Federação Russa, a sua independência e integridade da sua condição de Estado e a prevenir ameaças externas.
71. O Ministério dos Negócios Estrangeiros da Federação da Rússia elaborará uma estratégia geral para a política externa da Federação da Rússia e apresentará as respectivas propostas ao Presidente da Federação da Rússia, implementará a política externa, coordenará as atividades dos órgãos do poder executivo federais na área das relações internacionais e da cooperação internacional, e coordenará as relações internacionais das unidades da Federação.
72. A Agência Federal para a Comunidade de Estados Independentes, Compatriotas Residentes no Estrangeiro e Cooperação Humanitária Internacional ajudará o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Federação da Rússia a seguir uma política externa unificada com vista à coordenação de programas na área da cooperação humanitária internacional e a implementar a política de Estado com vista ao apoio ao desenvolvimento internacional a nível bilateral.
73. Os outros órgãos do poder executivo federais exercerão atividades internacionais dentro dos limites das suas competências, de acordo com o princípio da unidade da política externa da Federação da Rússia, com um papel de coordenação do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Federação da Rússia.
74. As unidades da Federação manterão, dentro dos limites das suas competências, relações económicas internacionais, tendo em conta a grande importância da cooperação inter-regional e transfronteiriça para o desenvolvimento das relações da Federação da Rússia com os países estrangeiros.
75. Aquando da preparação e implementação de decisões referentes à política externa, os órgãos do poder executivo federais cooperam com ambas as câmaras da Assembleia Federal da Federação da Rússia, os partidos políticos russos, a Câmara Pública da Federação da Rússia, organizações sem fins lucrativos, associações culturais e humanitárias, a Igreja Ortodoxa Russa e outras organizações religiosas de religiões tradicionais, representantes da comunidade pericial e científica, círculos empresariais e os meios de comunicação social, facilitando a sua participação na cooperação internacional. O amplo envolvimento de forças sociais construtivas no processo de política externa contribuirá para um consenso nacional sobre a política externa da Federação da Rússia, facilitará a sua implementação e terá grande importância para uma resolução mais eficaz de questões da agenda internacional.
76. Fundos extra-orçamentais podem ser aplicados, numa base voluntária, no financiamento de atividades de política externa no âmbito da parceria público-privada.
Fonte: https://mid.ru/en/foreign_policy/fundamental_documents/1860586/?lang=pt
(1) Um comentário do especialista Kirill Rogov, em 05/05/20023, no site https://re-russia.net/en/review/258/
Os Beneficiários do Não-Alinhamento: O Ocidente, a Rússia e a China estão competindo pelo favor das potências neutras mais proeminentes, Brasil e Índia, das quais este último não hesitará em tirar vantagem
Tradução automática Google
A Rússia busca consolidar sua influência na América do Sul enfraquecendo a posição dos EUA no continente e globalmente. A inclinação do novo presidente brasileiro para Moscou foi bem recebida pelo Kremlin: Putin quebrou o protocolo para se encontrar com o assessor do presidente da SilvOs Beneficiários do Não-Alinhamento: O Ocidente, a Rússia e a China estão competindo pelo favor das potências neutras mais proeminentes, Brasil e Índia, das quais este último não hesitará em tirar vantagema, enquanto Sergei Lavrov fez uma turnê pela América Latina. O presidente brasileiro, por sua vez, discutiu ideias para uma solução pacífica da guerra russo-ucraniana em Pequim. O primeiro-ministro indiano, por sua vez, defendeu as negociações de paz entre Moscou e Kiev e a consolidação de seu novo status de ‘países não alinhados’ nas instituições internacionais. A perspectiva de uma ‘coalizão negociadora’ dos quatro grandes BRICs só pode ser preocupante para os EUA e seus aliados ocidentais. Como resultado, as posições internacionais do Brasil e da Índia estão sendo fortalecidas. O Ocidente, a Rússia e a China lançaram uma campanha ativa para conquistá-los, que o Brasil e a Índia não hesitarão em explorar.
Durante uma recente viagem à América Latina, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, insistiu que Moscou não tinha intenção de forçar os países da região a escolher se estavam “conosco ou contra nós” ao tomar uma posição sobre a guerra russo-ucraniana. Essa retórica estava de acordo com a narrativa anticolonial familiar a muitos dos interlocutores de Lavrov. Essa narrativa sugere que o Ocidente, liderado pelos Estados Unidos, está ‘torcendo os braços’ do Sul Global e forçando esses países a jogar ‘seu jogo’, pressionando-os a apoiar a Ucrânia e cumprir as sanções contra a Rússia. No entanto, de acordo com Kirk Randolph do Instituto de Paz dos Estados Unidos (USIP), na prática, o objetivo do vetor latino-americano da política externa russa é reduzir a influência dos EUA na região enquanto mina a ordem mundial liberal liderada pelos EUA. Em sua opinião, a posição do Brasil, a principal economia do continente, está alinhada com a visão do Kremlin sobre a situação geopolítica, conforme delineada na nova doutrina de política externa da Rússia . Isso afirma que a ordem mundial está passando por uma revolução que resultará no ‘enfraquecimento do Ocidente’ e no surgimento de um mundo multipolar.
Sergei Lavrov visitou quatro países durante a viagem – Brasil, Venezuela, Nicarágua e Cuba – mas, segundo Randolph, o Brasil é o mais importante para Moscou. Comentando sobre a vitória de Lula da Silva, um dos fundadores do BRICS, nas eleições presidenciais brasileiras de 2022, o especialista do Carnegie Endowment escreveu que Moscou tem grandes esperanças neste novo presidente socialista, que acredita ‘trabalhará com Putin para criar um mundo multipolar e fortalecer o papel do Brasil como principal parceiro econômico da Rússia no Hemisfério Ocidental.’ De fato, o ativismo de Moscou na ‘pista brasileira’ é óbvio a olho nu.
Na véspera da visita de Lavrov, Celso Amorim, chefe de gabinete do presidente brasileiro, visitou Moscou para discutir uma possível mediação brasileira em eventuais negociações de paz entre a Rússia e a Ucrânia. A importância atribuída a esta visita do Kremlin é indicada pelo facto de ter quebrado o protocolo diplomático: é costume que políticos de nível comparável compareçam a tais reuniões, mas Amorim foi recebido pessoalmente por Putin.
Moscou saudou a tendência da nova liderança brasileira em direção ao Kremlin. Sob o presidente anterior, Bolsonaro, o Brasil apoiou uma resolução da ONU para condenar a agressão da Rússia contra a Ucrânia. Mas desde que venceu a eleição, Lula da Silva colocou a culpa em ambos os lados, recusou-se a fornecer armas a Kiev, pediu a Zelensky que abandonasse os planos de devolver a Crimeia à Ucrânia e acusou os EUA e a UE de ‘encorajar’ hostilidades. O Brasil também lançou a ideia de criar um fórum internacional para negociar o fim da guerra, envolvendo todos os países do BRICS.
O próprio Lula da Silva visitou a China em abril e, após seu encontro com o presidente Xi, os dois lados emitiram uma declaração conjunta enfatizando a necessidade de negociações como a única saída realista para a crise na Ucrânia. As propostas de paz da China e do Brasil atraíram críticas dos países ocidentais. Ao permitir que Da Silva atue como um apoiador público das negociações, Pequim consegue manter o papel de marionetista nos bastidores que tentará usar essas iniciativas a seu favor, observa Randolph. Alguns observadores ocidentais, no entanto, acreditam que o Brasil, com sua postura ‘não-alinhada’, está em melhor posição para desempenhar o papel de mediador entre a Rússia e a Ucrânia.
Na realidade, os contornos da “multipolaridade” de hoje são definidos por dois campos antagônicos emergentes – uma coalizão ocidental, de um lado, e uma coalizão autoritária composta por China e Rússia, por outro. Ambos estão interessados em trazer o Sul Global e, em particular, os maiores países da região para seu acampamento. Sem surpresa, esses países estão ansiosos para aproveitar ao máximo a situação. O primeiro-ministro indiano Narendra Modi, após reuniões recentes com o chanceler alemão Olaf Scholz, também falou sobre a necessidade de negociações mediadas internacionalmente entre a Rússia e a Ucrânia e pediu para repensar o papel das organizações internacionais, incluindo o Conselho de Segurança da ONU. Os ‘países não alinhados’ gostariam de ter representação permanente no Conselho.
Nesse contexto, a inclinação da liderança brasileira em direção a Moscou também pode parecer um movimento amplamente pragmático, fortalecendo a posição de Da Silva no cenário internacional. Na realidade, a Rússia não tem recursos econômicos nem poder político para se tornar um grande fator de influência na América Latina, capaz de competir com os investimentos dos Estados Unidos. Além disso, a opinião pública em todo o continente não é de forma alguma pró-Rússia. Como Re: a Rússia relatou recentemente, uma pesquisa Gallup sugere que a insatisfação média com as ações da liderança russa na América Latina aumentou de 31% em 2021 para 61% em 2022. No Brasil, 68% desaprovam as políticas da Rússia. No entanto, o índice de liderança dos EUA no Brasil também caiu em 2022 e agora é negativo, com 35% de aprovação e 42% de reprovação às ações dos EUA. No entanto, esse saldo é dividido de maneira mais uniforme. Na Índia, 46% desaprovam a Rússia e 38% desaprovam os EUA.
Ao mesmo tempo, a retórica da Rússia em relação à ‘multipolaridade’ parece estar ressoando na região, e a perspectiva de uma coalizão dos ‘quatro grandes’ BRICS é uma séria preocupação para os EUA e seus aliados. Assim, serve para fortalecer a posição dos países ‘não-alinhados’ no cenário mundial.