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O que fazer caso o lulopetismo volte ao poder

Os democratas devem continuar resistindo aos populismos, sejam de direita ou de esquerda

Segundo o Datafolha (16/12/2021), Bolsonaro perde 4 em cada 10 votos que teve no 2º turno de 2018. A pesquisa mostra debandada de apoiadores, com muitos mudando para Lula. É curioso como os populismos atraem o mesmo tipo de eleitorado arrebanhável. Muitos que votaram em Bolsonaro em 2018 haviam sido eleitores de Lula em 2002 e 2006 (e, alguns, também de Dilma em 2010 e 2014).

Muitos eleitores de Bolsonaro em 2018 estão mudando agora para Lula porque ainda não há – a 10 meses das eleições – outro nome tão conhecido como ele. O fato é que uma grande galera, que quer tirar Bolsonaro, votará em qualquer um com mais chances de derrotá-lo.

Os democratas liberais e os democratas eleitorais (não-populistas) não podem fazer milagres se a configuração das forças em disputa, em 2022, apontar para uma vitória Lula. Mas devem saber que, caso o lulopetismo volte ao poder, teremos um governo democrático, sim, muito mais do que o de Bolsonaro, mas democrático-eleitoral, não-democrático liberal, posto que será um governo populista de esquerda.

Então, se Lula for o novo presidente, teremos que continuar resistindo ao populismo (que, ainda que democrático-eleitoral, é i-liberal, majoristarista e, no caso particular do PT, hegemonista). Por isso é importante que essa resistência democrático-liberal comece a se articular agora, tendo em vista o governo (necessariamente de transição pós-Lula) que será eleito em 2026 (o qual também não pode ser a volta do bolsonarismo) e a instalação de um governo normal, democrático (não-populista, não-i-liberal, não-majoritarista, não-hegemonista), nas eleições de 2030.

Nada disso está certo. Mas é o mais provável hoje (em dezembro de 2021).

Em momentos assim, como este que estamos vivendo, é normal que surjam trânsfugas de todo tipo. Não apenas bolsonaristas arrependidos. Mas inclusive inteligentes analistas, que ajudaram a desvendar a natureza do PT nos anos passados, e que passaram-se de armas e bagagens para o lulopetismo. A política tem mesmo dessas coisas. Entram em jogo muitas variáveis, inclusive avaliações de qual seria a melhor posição profissional no mercado futuro… Mas isso significa que a candidatura Lula tende a atrair o apoio da maioria dos intelectuais, dos artistas e desportistas, dos jornalistas e escritores e dos que antes se chamavam formadores de opinião e, nos minutos finais do segundo tempo da partida, até mesmo dos empresários que, em sua maioria, ainda apostam em Bolsonaro.

Uma vez no governo, um líder neopopulista de esquerda não sai facilmente. São raríssimos na história os casos de neopopulistas de esquerda que saíram do poder apenas pelo voto. Atenção! No Brasil, não aconteceu. O PT só saiu do governo porque Dilma sofreu impeachment em 2016. O mesmo aconteceu na Bolívia, onde o neopopulismo evoista foi expurgado por algum tipo de golpe em 2019, mas o aliado de Evo Morales, Luís Arce, logo voltou ao governo pelo voto em 2020. O caso de Cristina Kirchner e seu candidato Daniel Sciolli, que foram derrotados por Maurício Macri em 2015, é uma exceção – e mesmo assim abriu apenas um breve interregno, pois o populismo de esquerda voltou ao poder com Alberto Fernández em 2019.

A tendência é que os populismos se prorroguem por uma ou duas décadas. E o diabo é que, mesmo respeitando a Constituição, o Estado de direito e as regras da democracia formal, um governo neopopulista de esquerda paralisa o processo de democratização no seu “estágio” de democracia eleitoral, impedindo que se chegue a uma democracia liberal. Como se sabe os populismos são modos de degenerar a democracia como guerra eleitoral e isso significa colocar um dreno no regime pelo qual vai se esvaindo, conquanto às vezes muito lentamente, o seu conteúdo liberal.

O fato é que a possibilidade de termos um governo democratico liberal a partir de 2031 depende da nossa capacidade de multiplicar o número de agentes democráticos, não apenas no Estado, mas também na sociedade. Pois o problema é que não existe democracia sem democratas. E que há um deficit acentuado de agentes democráticos no Brasil atual. Ou seja, não propriamente de pessoas que concordem passivamente com a democracia e que digam, quando perguntadas, que preferem a democracia a outros regimes. O que está em falta são agentes democráticos, com habilidades e competências que permitam, em primeiro lugar, conectar os democratas existentes e multiplicar o seu número. Em segundo lugar, fermentar a formação de uma opinião pública democrática. Em terceiro lugar, resistir ao autoritarismo e a qualquer populismo. Em quarto lugar, ensaiar processos democráticos (em todos os lugares onde for possível experimentar a democracia como modo-de-vida).

Não, não é necessário ser maioria. Mas sem uma massa crítica (ou melhor, uma quantidade suficiente de fermento), não será possível ter um governo democrático liberal nem mesmo a partir de 2031. Se Lula (ou um seu preposto neopopulista de esquerda), por ventura ou desgraça, eleito em 2022, for reeleito em 2026, nada feito. Se Bolsonaro (ou um seu preposto populista-autoritário) for eleito em 2026, nada feito.

O imperativo do período em que estamos vivendo é multiplicar o número de agentes democráticos. Isso leva tempo. Não adianta agora querer plantar nabos e rabanetes esperando colhê-los em duas semanas. A hora é de plantar tamareiras.

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