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Sobre a universidade do populismo de Steve Bannon

Ao que tudo indica, Steve Bannon não vai mais poder instalar, não, pelo menos, na Cartuxa de Trisulti, a 100 Km de Roma, sua universidade do populismo que pretendia criar líderes políticos para destruir o atual sistema globalista e construir uma União Europeia nacionalista e de direita. Isso, mas não só.

Não quer dizer que a ideia vai morrer. Não é uma má ideia, do ponto de vista conspiracionista dos antiglobalistas: ter um centro de iniciação de novos agentes da extrema-direita populista-autoritária e i-liberal. De um ponto de vista democrático, é claro, tudo isso é um horror.

Abaixo alguns artigos sobre o projeto de Bannon e as dificuldades que ele vem encontrando para concretizá-lo. É bom ficar de olho. Oportunamente virão alguns comentários.

Steve Bannon vai abrir uma universidade populista perto de Roma

Um mosteiro a 130 quilómetros de Roma será lugar para a nova universidade populista idealizada por Steve Bannon e que será também o quartel-general para o apoio ideológico aos partidos anti-establishment europeus

Steve Bannon, ex-assessor de Donald Trump e principal estratega da campanha do agora Presidente dos Estados Unidos, continua a dar passos para a formação do seu movimento populista que pretende coordenar e apoiar os partidos anti-establishment em ascensão na Europa. E o próximo será a formação de uma universidade populista, que terá sede em Itália, país escolhido por Bannon como epicentro da sua ofensiva política.

A Certosa di Trisulti é o local escolhido para esta universidade. Este mosteiro, datado de 1211, está localizado em Collepardo, na província de Frosinone, nos montes Ernici, a 130 quilómetros de Roma. A universidade será financiada através de doações privadas. O edifício necessita ainda de reformas, pois o monumento há muito que não é utilizado, pelo que a nova instituição arrancará no próximo ano.

El País visitou o local e falou com Benjamin Harnwell, braço direito de Bannon em Itália e membro do círculo conservador do Vaticano que se opõe ao Papa Francisco. “Faremos retiros, cursos de formação, cursos educativos com professores de elevada reputação”, explica ao jornal espanhol, acrescentando que as principais decisões sobre a organização da universidade – tais como a escolha dos professores ou matérias – ficarão a cabo de Bannon.

Mas vai ser mais do que isso. Servirá como quartel-general para a avançada populista pela Europa, fornecendo todo o apoio ideológico, mas também religioso, nesta estratégia que pretende espalhar pelo continente o método que levou Donald Trump à Casa Branca.

Nos últimos tempos, Bannon, que foi despedido da Casa Branca em Agosto do ano passado, foi levantando o véu sobre esta estratégia. Em Julho anunciou a criação de uma fundação – chamada O Movimento – com sede em Bruxelas, para financiar e prestar apoio a partidos populistas, tendo, para já, as eleições europeias de 2019 na mira. O antigo estratega de Trump explicou também que esta fundação é uma resposta a George Soros, o liberal multimilionário norte-americano de origem húngara, e à sua Open Society.

No início de Setembro, Bannon contou com um novo membro de peso para o seu O Movimento. Matteo Salvini, ministro do Interior italiano (mas o verdadeiro homem forte do Governo de Roma) e líder do partido de extrema-direita Liga, juntou-se à fundação.

Salvini é visto por Bannon como um modelo a seguir e o exemplo daquilo que o antigo director do site de notícias conservador Breitbart quer para todo o continente europeu. Alguém que desafiou o establishment, tendo por base uma política anti-imigração e ultraconservadora, e que foi capaz de formar Governo numa das principais economias europeias juntamente com o Movimento 5 Estrelas, partido radical. “A Itália é o coração pulsante da política moderna. Se funcionou lá, pode funcionar em qualquer lado”, afirmava Bannon em entrevista ao site norte-americano The Daily Beastem Julho.

É por isso que, desde as eleições de Março que deram a vitória à Liga e ao 5 Estrelas, Bannon tem passado grande parte do seu tempo em Itália e tornou este país como sede a partir da qual lançará a sua ofensiva populista – foi em Roma que, por exemplo, abriu uma das primeiras redacções internacionais do Breitbart, quando ainda o dirigia. Além disso já revelou que passará 80% ou 90% do seu tempo em solo europeu a partir de agora.

Outro dos actores políticos contactado por Bannon e que se aproximou ao seu movimento é Giorgia Meloni, líder do partido conservador e eurocéptico Irmãos de Itália.

Para este fim-de-semana está marcado um encontro do O Movimento que contará com a presença de Salvini e, espera-se, de Meloni. Segundo o El País, a conferência terá a duração de três dias, tem como título “Europa Contra Europa” e vai ter lugar na Ilha Tiberina, no coração de Roma.

Bannon vai responder a perguntas de um jornalista italiano num segmento chamado “A culpa é toda dos populismos”. “Salvini é um génio, tem uma intuição fora do comum. E Steve [Bannon] é um visionário, vê as coisas mais depressa do que toda a gente”, diz Harnwell ao jornal espanhol. “[Bannon] fez Trump ganhar sem nunca ter dirigido um campanha na sua vida. Por isso, tem uma opinião que conta”.

ANÁLISE

Steve Bannon e a Cartuxa europeia

A Cartuxa de Trisulti foi entregue pelo Governo de Itália ao Dignitatis Humanae Institute, o “braço” italiano de Steve Bannon e o “braço” político do cardeal Raymond Leo Burke. A Santa Sé não toma posição oficial sobre o assunto

Paola Rolleta, Público, 20 de Maio de 2019

Steve Bannon já não poderá, tranquilamente, fazer da Cartuxa de Trisulti a sede da sua academia para ensinar o populismo, criar líderes políticos para destruir o actual sistema globalista e construir uma União Europeia nacionalista e de direita.

O caso tem vindo a ser denunciado ao longo dos meses por vários jornais, muitas pessoas até têm saído à rua “abraçando” a Cartuxa de Trisulti, um mosteiro beneditino na vila de Collepardo — a cerca 100 quilómetros de Roma —, consagrado em 1211 e monumento nacional desde 1879, para a proteger dos desígnios subversivos do ex-estratego de Donald Trump.

Hoje, são o Tribunal de Contas, o advogado do Estado e a Procuradoria da República a investigar sobre este caso desmazelado, que chegou à atenção mundial feito de enredos e conivências entre sectores da política e da igreja a altos níveis: o escândalo da concessão do antigo mosteiro a personagens dúbias, mas de clara matriz fundamentalista católica e de extrema-direita.

Duas interpelações parlamentares do partido Sinistra Italiana (de esquerda), duas marchas e duas mil assinaturas — já entregues ao Ministério da Cultura italiano — foram as armas da sociedade civil para despertar a opinião pública nacional e internacional sobre um abuso que se vinha perpetrando há largos meses.

Três homens na Cartuxa

Desde Fevereiro do ano passado, a Cartuxa de Trisulti tinha sido entregue pelo Ministério da Cultura da República italiana ao Dignitatis Humanae Institute (DHI), uma emanação dos teocons americanos, sendo, na prática, o “braço” italiano de Steve Bannon, e o “braço” político do cardeal Raymond Leo Burke.

Steve Bannon, artífice reconhecido da campanha eleitoral de Donald Trump, era também presidente executivo do influente site noticioso americano, de extrema-direita, Breitbart News. Mesmo tendo sido afastado dos dois cargos, Bannon tem continuado a apresentar o pensamento de Trump como o seu principal ponto de referência, exaltando-o como “um dos poucos líderes políticos que defendem a sobrevivência do Ocidente cristão contra a esquerda niilista”. Levou pela Europa o seu pensamento político, criou o The Movement, movimento transnacional que, segundo as suas intenções, deve reunir todas as direitas europeias populistas, entre as quais a Liga de Matteo Salvini, considerado por Bannon como uma das “duas figuras políticas mais importantes do mundo”, juntamente com o Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro.

As posições supremacistas de Bannon são partilhadas pelos dois políticos italianos que constam no topo do DHI: Luca Volonté e Rocco Buttiglione. Partilhando das mesmas posições teocons extremistas, também o presidente honorário do DHI, o cardeal Renato Raffaele Martino, convidou Bannon a falar no Vaticano e, em 2014, escreveu uma carta (publicada no website do DHI) em que pedia ao Papa Francisco para pressionar o então ministro da cultura italiano, Dario Franceschini (do Partido Democrático), a entregar a Cartuxa de Trisulti ao DHI.

Em Janeiro deste ano, o cardeal Martino pediu demissão e a presidência honorária passou para o cardeal Raymond Leo Burke, e o seu lugar no conselho de administração do DHI passou para Steve Bannon, o principal financiador da associação.

O estratego americano é mentor ideológico do segundo homem-chave desta história, o britânico Benjamin Harnwell que, como fundador, director, representante legal e presidente do Board of Trustees do Dignitatis Humanae Institute, se tornou o inquilino oficial da Cartuxa de Trisulti, partilhando a casa com o único monge que ainda aqui vive: Dom Ignazio, de seu nome Mario Rossi, com 83 anos, que nestes últimos anos tem sido refém, malgré lui, desta história. Foge dos jornalistas, mas lança farpas contra o abade de Casamari que “entregou” a Cartuxa “a essa gente…” Não quer ser “despejado” do sítio onde viveu a vida inteira e quer morrer na “sua Cartuxa”.

O terceiro homem é o cardeal Raymond Leo Burke, amigo de Bannon e confidente de Harnwell. Defensor e praticante do rito tridentino, ex-arcebispo de St. Louis, já presidente do Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica, onde ficou confirmado apenas como membro; já foi elemento da Congregação da Causa dos Santos, hoje é apenas patrono do Soberano Militar Ordem de Malta, um cargo meramente simbólico. Os comentadores do Vaticano dizem que as sucessivas quedas hierárquicas dos cargos se devem às suas posições ultraconservadoras.

Burke, além de ser um dos principais expoentes da ala ultraconservadora da Igreja, é também um dos principais opositores do Papa Francisco. Em 2016, foi um dos quatro cardeais que assinaram os Dubia, o documento em que se contesta a decisão do Papa Francisco sobre a legitimidade da comunhão aos divorciados recasados, e que, em conjunto com o cardeal alemão Walter Brandmüller, por ocasião da conferência sobre a pedofilia, escreveu uma carta aberta aos presidentes dos episcopados, criticando a escolha do Papa Francisco em focar o debate apenas na pedofilia e não sobre a homossexualidade presente na Igreja.

Centro de espiritualidade

A Cartuxa de Trisulti tinha sido entregue aos cistercienses de Casamari em 1947 e aqui se firmou um centro de espiritualidade e de difusão da ervanária de tradição monástica. No início do processo que agora decorre, ficaram apenas quatro monges, idosos e doentes, cujo destino seria regressar ao convento de origem e a Cartuxa voltaria à protecção do Estado. O definhamento das grandes ordens religiosas medievais vai deixando um vazio muito difícil de preencher no património monumental sagrado e tornado propriedade pública.

Para evitar a decadência e não tendo capacidade económica para assegurar a manutenção deste património (na sua maior parte entregue às ordens religiosas), a concessão dos bens foi a estratégia possível encontrada pelo Estado.

Em Outubro de 2016, o Ministério da Cultura italiano, chefiado pelo ministro Dario Franceschini (Partido Democrático), lança um edital sobre 13 bens do Património Cultural do Estado. Entre eles, a Cartuxa de Trisulti.

Apenas duas organizações participaram no concurso, o DHI e a Academia Nacional das Artes do Castelo Petroro de Todi, comunidade de monges e laicos vegetarianos, das Igrejas ortodoxas. Esta última foi excluída por falta de documentação, dizem no ministério. “Na realidade, a decisão já está tomada”, comentou, em Janeiro de 2018, o padre Massimiliano, na altura chefe da Abadia di San Martino, sede da Academia.

Durante os meses que se seguiram, o Ministério da Cultura pediu mais documentação a asseverar a gestão de um bem público ou privado no quinquénio anterior à data do edital. O padre Massimiliano não pôde participar porque ficara detido em Maio de 2018 por fraude fiscal… e o DHI apresentou a carta de Eugenio Romagnuolo, abade de Casamari (a casa-mãe dos cistercienses), datada de 2015, em que se garantia a entrega do Museu de São Nicola, em Trisulti, para a gestão do DHI. Só que o museu nunca existira e, além disso, a carta foi apresentada só em 2017. E ainda mais curiosa é a presença do abade Eugenio Romagnuolo no conselho de administração do DHI.

Por outro lado, a DHI apresentou uma declaração de “coerência do plano financeiro”, por parte de um instituto com sede em Gibraltar do Jyrske Bank, banco dinamarquês envolvido numa série de escândalos financeiros no mercado relativamente às normas antibranqueamento e evasão fiscal. Será por causa do grande eco internacional, mas o próprio banco declarou como falsa a carta de garantia apresentada pela DHI.

Apesar disso, o Ministério declara o DHI vencedor do concurso, e em Fevereiro de 2018, é assinada a concessão por 19 anos, com uma renda de 100 mil euros por ano, que o DHI poderá deduzir dos custos de reestruturação. A oferta económica deve ter pesado, mas as relações políticas têm pesado ainda mais… Em simultâneo, a paisagem de uma degradação acentuada continua muito visível nos telhados destruídos ou em muros em risco de colapso, onde o património convive com a fixação por fita-cola.

A escola do populismo

A partir da vitória eleitoral da Liga e do Movimento 5 Estrelas, a 4 de Março do ano passado, Steve Bannon declarou-se mentor da ideia de um Governo concertado entre os dois partidos populistas que governam a Itália desde Junho. Inúmeras entrevistas aos principais meios de comunicação social, dão conta do seu projecto de criar na Cartuxa de Trisulti “uma escola para guerreiros da cultura”, para formar uma geração de populistas. Em suma, criar “pequenos Salvinis” e “pequenos Orbáns”.

Benjamin Harnwell, testa-de-ferro de Steve Bannon e já exibindo no seu curriculum o estatuto de homem de mão de um deputado conservador em Bruxelas, conta que o projecto inicial passava por uma academia para a Breitbart News, e finalmente “chegou este maravilhoso Governo” que representa perfeitamente a missão do DHI. Segundo ele, os partidos nacionalistas e populistas são hoje quem defende a dignidade humana baseada no reconhecimento de que o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus. “Há uma sinergia natural entre o que estamos a fazer e estes partidos”, diz Harnwell.

Numa mistura quente entre política e religião, à academia populista de implante político, juntar-se-á outra academia chefiada pelo cardeal Raymond Leo Burke para levar a cabo o conservadorismo católico.

A Santa Sé não toma posição oficial sobre o assunto: a Cartuxa é património do Estado italiano. Mas, entretanto, Lorenzo Loppa, bispo da diocese de Anagni-Alatri, a que pertence pastoralmente a Cartuxa, fez mea culpa através dos meios de comunicação social, por duas vezes: “Quando os monges estavam prestes a sair, fiz várias diligências junto de outras ordens religiosas. Mas em vão. Hoje estou triste e preocupado porque vejo a Cartuxa entregue aos inimigos do Papa Francisco.” No momento das negociações para a concessão, foi ele que escreveu também uma carta recomendando ao DHI no Vaticano para fazer pressão junto do Governo italiano.

Talvez o bispo tivesse ficado preocupado porque os habitantes de Collepardo manifestaram o seu desagrado para com ele e para com o abade de Casamari, porque “entregaram” a “nossa” Cartuxa aos “estrangeiros”. Além disso, os habitantes da pequena vila estão muito aborrecidos porque estão a ser apelidados de “extrema-direita”. “Não queremos ser apelidados de fascistas. A política deixou que a nossa Cartuxa ficasse entregue a essas pessoas. Nenhum político, nem o bispo nem o abade pediram a nossa opinião sobre o seu destino”.

A marcha sobre Trisulti

Foi nos finais de Dezembro que ocorreu a primeira marcha de protesto organizada pela Comunità Solidali, uma rede de cidadãos e associações locais, contra a criação de uma escola nacionalista e populista na Cartuxa.

Os habitantes de Collepardo assistiram de olhos atentos, mas desconfiados. “Só queremos que a Cartuxa volte a ser o que era, mas já não há monges… E quando entra a política nas coisas da Igreja, já não há nada a fazer”, comentavam, enquanto algumas centenas de pessoas, vindas de toda a Itália, marchavam até à Cartuxa, seis quilómetros de subida, entre árvores milenárias, no caminho de São Bento.

O presidente da Câmara de Collepardo, Mauro Bussiglieri, entretanto, pensa apenas no retorno económico que uma eventual escola nacionalista poderia dar ao território — com alto nível de desemprego -— mas não consegue nem cobrar os impostos camarários à DHI. Até hoje, “os tios americanos” não pagaram nem um tostão…

Depois da marcha, o caso chegou ao Parlamento,com a interpelação feita por Nicola Fratoianni, da Sinistra Italiana, pedindo esclarecimento sobre a concessão ao DHI. Com extremo embaraço, o subsecretário da Cultura, Gianluca Vacca, do Movimento 5 Estrelas, remeteu a responsabilidade para o Governo anterior, afirmando, porém, que em nenhuma alínea do edital havia a possibilidade da criação de uma escola política, mas apenas a valorização e a manutenção do monumento nacional.

Estranhamente, o contrato de concessão foi registado, com pagamento de impostos à Autoridade Tributária, apenas alguns dias depois da interpelação parlamentar, a 28 de Janeiro de 2019.

Uma segunda marcha foi organizada a 16 de Março, para pedir a revogação da concessão. O caso voltou ao Parlamento, onde o próprio ministro Alberto Bonisoli, do Movimento 5 Estrelas, afirmando a sua distância face ao “obscurantismo” declarado pelos expoentes do DHI, garantiu que nenhuma escola política podia ser feita na Cartuxa, mas, como infelizmente o contrato de concessão tinha sido assinado pelo Governo anterior, só cabia ao actual a vigilância sobre o respeito do mesmo.

“Foi pena que o próprio ministério tivesse dado em concessão um monumento do Estado a uma fundação com um curriculum ‘incoerente’, sem um projecto pormenorizado, com um edital que impede, de facto, ao próprio ministério exercer qualquer verificação e controlo periódico”, afirma o advogado Felice Maria Spirito.

É mais do que evidente que a alienação (material e moral) do património cultural italiano nega, na raiz, a própria Constituição da República. Mas era impossível imaginar-se que até mesmo um monumento preciosíssimo daquele património se tornasse a base italiana da propaganda do pensamento intolerante e inquietante de Steve Bannon e Donald Trump.

O acto mais recente desta saga, cujos resultados estão ainda longe de estar concluídos, foi a 4 de Abril, quando a Comunità Solidali entregou cerca de duas mil assinaturas ao ministro da Cultura pedindo a revogação da concessão ao DHI, devido às graves ilegalidades do próprio concurso.

E se um silêncio endurecedor das forças políticas locais e nacionais reinou até agora, as denúncias dos media e as marchas de cidadania fizeram despertar a atenção da opinião pública italiana e internacional sobre este abuso, antes administrativo, mas que adquiriu um grande valor simbólico e político, a poucos dias das eleições europeias.

Steve Bannon já não vai abrir a sua universidade de populismo na Cartuxa de Trisulti

Ministério italiano dos Bens Culturais revogou concessão de mosteiro beneditino à associação conservadora ligada ao ex-conselheiro de Trump, após terem sido detectadas várias irregularidades

Steve Bannon, o ex-estratega da Casa Branca de Donald Trump e que agora se esforça por fomentar um movimento de extrema-direita que tenha sucesso eleitoral a nível europeu, já não poderá abrir uma academia de populismo na Cartuxa de Trisulti, mosteiro beneditino na vila de Collepardo — a cerca 100 quilómetros de Roma. O ministro italiano dos Bens e Actividades Culturais, Alberto Bonisoli, deliberou que a concessão do uso do mosteiro consagrado em 1211 seja travado, por se ter constatado que houve irregularidades no processo.

Após interpelações parlamentares, abaixo-assinados de cidadãos e manifestações, o processo de concessão da cartuxa à associação Dignitatis Humanae Institute – na prática, o “braço italiano” de Steve Bannon, e do muito conservador cardeal norte-americano Raymond Leo Burke, que se tem destacado como oposição católica integrista ao Papa Francisco.

O Ministério anuncia, em comunicado, ter iniciado os procedimentos para revogar a concessão da gestão do mosteiro pela associação, por terem sido descobertas inúmeras irregularidades. O projecto da universidade do populismo de Bannon sofre, assim, um revés.

Entre outros problemas, descobriu-se que a associação não tinha feito o reconhecimento da personalidade jurídica, nem tinha provas de experiência na valorização do património cultural, relata o La Repubblica.

A associação Dignitatis Humanae Institute tinha garantido a concessão do mosteiro, que é monumento nacional desde 1879, num concurso público lançado em 2016, com o qual o Estado italiano abriu alguns monumentos à gestão privada, tentando garantir a sua sobrevivência, explica o jornal La Stampa.

Bannon sob despejo. Os soberanistas deixam a abadia de Trisulti

REVISTA IHU ON-LINE, 03/06/2019

No vale e entre os montes Ernici, festeja-se quando chega a notícia de que Steve Bannon deve desalojar. Alberto Bonisoli, cujo coração bate pelo partido 5Stelle, decidiu revogar a concessão ao ex-estrategista de Donald Trump, que na esplêndida Cartuxa de Trisulti decidiu criar a “escola dos novos gladiadores” em defesa do Ocidente. Além disso, o projeto consistia em coordenar todos os partidos soberanistas da UE e de uma universidade para formar futuros líderes populistas. Bem no coração do caminho de San Benedetto, percorrido por milhares de peregrinos todos os anos, na abadia cisterciense de 1204 que abriga uma farmácia e uma biblioteca entre as mais belas da Itália.

A reportagem é de Giovanna Casadio, publicada por La Repubblica, 01-06-2019. A tradução é de Luisa Rabolini.

“O que não teve sucesso para Hillary Clinton, está funcionando conosco: parar Bannon“, brinca Daniela Bianchi, porta-voz da rede comunitária de solidariedade e ex-conselheira regional. Houve marchas de protesto, a pressão de Nicola Fratoianni, líder da esquerda italiana, a carta aberta ao Ministério de Nicola Zingaretti, mas também a convicção do subsecretário Gianluca Vacca e, finalmente, o empenho de Bonisoli. O Mibac pretende anular a concessão que, no final de 2017, foi dada pelo governo para a fundação de Benjamin Harnwell, o “thoug gay”, o sujeito durão em que Bannon confia totalmente. O think tank de Harnwell chama-se Dignitatis Humanae e tem um conselho de garantia onde tem assento Raymond Burke, o cardeal conservador norte-americano que é um grande adversário da mudança aportada à Igreja Católica pelo Papa Francisco.

Apenas um trabalho meticuloso e rigoroso conseguiu analisar o castelo de credenciais apresentado pela fundação, revelando sua inconsistência e às vezes até sua falsidade. Principalmente, no plano financeiro: o Banco dinamarquês apresentado como garantia, desmentiu tê-la fornecido. Não houve durante os últimos anos trabalhos de manutenção e recuperação. A concessão da parte previa um aluguel de 100 mil euros por ano por 19 anos a ser pago na forma de restruturação da abadia e outros 80 mil em impostos municipais. O subsecretário Vacca explica que, tendo enviado a documentação ao Procurador Geral, a resposta chegou há alguns dias: os requisitos são inadequados, não existem. O comitê de cidadãos espera o relançamento. Harnwell, que se mudou para Trisulti na abadia regional, levantou o alarme contra “os perigos que ameaçam o Ocidente e suas raízes judaico-cristãs”.

Para Fratoianni, ganhou Davi contra Golias: “Agora precisamos de um projeto para a recuperação da Cartuxa. Mas algumas questões permanecem em aberto: por que a abadia foi dada a Bannon um ano e meio atrás?”

COMENTÁRIOS

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