Esta é uma nova edição, revista e aumentada, de algumas regras não escritas que evitam que a democracia se desconsolide.
Atualmente a democracia começa a ser derruída pela violação dessas regras não escritas – sejam de civilidade democrática interpessoal, sejam de comportamento político coletivo.
Essa normas, em geral, não são leis, mas sua corrosão sistemática acaba erodindo o regime democrático.
Eis uma lista, não-exaustiva, mas relativamente completa, de algumas dessas regras:
01 – Aceitar a derrota
02 – Parabenizar o vencedor
03 – Não tripudiar sobre o derrotado
04 – Não mentir (ou não usar a mentira sistemática como método político)
05 – Não acusar as regras (que foram aceitas antes da contenda) pela derrota
06 – Não tentar mudar as regras do jogo durante o jogo
07 – Não alegar falsamente que perdeu (ou perderá) porque houve (ou haverá) fraude
08 – Não deslegitimar o adversário
09 – Não encorajar a polarização (“nós” contra “eles” como “o bem” contra “o mal”)
10 – Não transformar o adversário em inimigo (da pátria, da família, do povo, da nação, do Estado, de Deus)
11 – Não empreender nem apoiar, instrumentalizando-as politicamente, cruzadas de limpeza (étnica, ética, religiosa ou nacional), mesmo que legais ou legalistas
12 – Não levantar falso testemunho perante a justiça (nem praticar litigância de má-fé) contra um adversário
13 – Tratar as divergências por meio de um debate aberto e tolerante, valorizando a moderação e a busca do consenso
14 – Fazer oposição leal
15 – Não ameaçar que vai dar um golpe
16 – Não deslegitimar, por palavras ou atos, a Constituição, as leis e as instituições democráticas (os parlamentos, os tribunais, os governos legitimamente eleitos e, inclusive, a imprensa), sobretudo não usar o discurso de defesa da liberdade irrestrita para restringir liberdades civis e direitos políticos já estabelecidos (nem defender a tolerância com os intolerantes a tal ponto que coloque em risco a própria tolerância)
17 – Não transformar as instituições em palcos de disputa de hegemonia, tentando sistematicamente fazer maioria partidária ou faccional em seu interior para extinguir na prática sua autonomia, esvaziá-las ou transformá-las em correias de transmissão de diretivas partidárias ou faccionais
18 – Não aparelhar o Estado com militantes partidários ou membros de uma facção tratando os órgãos públicos como espólio de guerra (butim)
19 – Não montar redes de difusão de fake news, sobretudo via sites, blogs, militâncias ou milícias digitais em mídias sociais ou programas de mensagens, usando bots ou pessoas-bot que promovam ataques de enxame (swarm attacks) contra os quais não se conhece defesa
20 – Não apoiar regimes autocráticos (alegando interesses nacionais, razões geopolíticas de realpolitik ou comerciais).
Cabe agora justificá-las tendo em conta que a democracia não pode ser protegida apenas pelas leis (escritas). Por isso todo legalismo é insuficientemente democrático. Ou seja, não basta não violar as leis para proteger a democracia. Sem um pacto social, mesmo que tácito, de respeito aos bons costumes políticos (as normas não escritas), a democracia fica indefesa quando se elege um tirano cujo programa é de destruição da democracia ou um populista cujo propósito é estacionar a democracia no seu aspecto apenas eleitoral impedindo-a de ascender à condição de democracia liberal.
Scholium
Em breve.