Um pequeno manifesto
Vou repetir aqui o que venho dizendo. Só a oposição popular pôde, até agora, garantir o processo do impeachment. E só a oposição popular poderá assegurar que o processo político brasileiro não degenere num jogo de compadres, em que velhos caciques que até ontem estavam no governo Dilma, não se rearranjem para continuar mamando no Estado.
Por isso, a resistência democrática não pode acabar com a votação do próximo dia 11 de Maio no Senado. Por isso, a oposição popular não pode pendurar as chuteiras ou passar o bastão para os atores institucionais e ficar assistindo tudo do sofá.
A oposição popular não surgiu e se mobilizou tão intensamente – mais do que em qualquer outra época na nossa história – para servir de linha auxiliar de um velho sistema político que apodreceu e para que os mesmos agentes políticos de sempre se reacomodem sem realmente mudar em nada seu deplorável comportamento.
As pessoas – aos milhões – não se relacionaram politicamente, com um grau de interatividade jamais visto por nós, para agora voltarem a ser meras expectadoras e apenas eleitoras (condenadas a escolher o menos pior de dois em dois anos e para serem continuamente enganadas).
As multidões não enxamearam nas ruas de todo país no 15 de março, no 12 de abril, no 16 de agosto de 2015 e no 13 de março de 2016 – nas maiores manifestações políticas de que se tem notícia no mundo (com exceção do 30 de abril de 2013 no Egito) – para alimentar, com a imensa energia que despertaram, o funcionamento de instituições em grande parte degeneradas.
A oposição popular não é contra as instituições do Estado democrático de direito. Pelo contrário, exige que elas funcionem, que não sejam aparelhadas por grupos autocráticos privados e não sejam usadas para beneficiar aqueles que as pilotam.
Mas a oposição popular não pode servir de muleta da velha institucionalidade. Não pode se retirar de cena – e muito menos das ruas – apostando todas as fichas em maiorias eventuais, formadas, aliás, por agentes políticos que não tiveram o menor pejo de se associar, em passado recentíssimo, ao maior esquema de privatização partidária da esfera pública já visto no planeta.
Portanto, não há louros sobre os quais deitar. Não há tranquilidade para descansar. Não há vitória antecipada para celebrar. Ou as ruas continuam falando, ou nada do que foi feito terá valido a pena e nem mesmo estaremos minimamente seguros de que o processo de enfreamento da democracia brasileira promovido pelo lulopetismo foi estancado.
Às ruas, pois.
P. S. 1 – A citação é teologal, não confessional: “Que parte temos nós em Davi? Não temos herança com o filho de Jessé. Às tuas tendas, ó Israel!” 1 Reis 12.
P. S. 2 – Para quem não conhece o contexto em que esta frase foi dita, vale a pena investigar. Em termos muito imprecisos, trata-se do seguinte: da resistência profética à migrar de uma vida nômade, segundo padrões de organização mais horizontais, para uma sedentarização hierarquizante, com a instalação de um Estado (um complexo Templo-Palácio) no Sul de Canaã (Palestina) pretendida por Davi (e ele foi admoestado por Natan várias vezes, de que não deveria fazer isso: erigir um Templo). Não sei se a metáfora está muito clara…
Deixe seu comentário